Thursday, October 25, 2012

Desde que conheci meus verdadeiros pais pessoalmente, no jantar mais desconfortável da história dos jantares de família, Emma e eu havíamos combinado de trocar de casas por um fim de semana. Enquanto eu ia para Londres passar dois dias com os Blanchard, ela viria para Sofia passar o mesmo tempo com meus pais. O problema é que os alunos de Hogwarts não têm permissão de sair nos finais de semana e quando chegou o dia combinado, ela ficou presa na escola por conta de atividades do curso de auror. A diretora de lá foi solidária a nossa causa, mas infelizmente só poderia liberá-la quando não tivesse aula.

No fim das contas, essa foi a salvação de Emma. Ela conseguiu sair na semana seguinte e como eu tinha ficado sozinha com os Blanchard, achei melhor ficar em Durmstrang para dar aos meus pais mais liberdade de conhecê-la melhor. Ozzy tinha ido para casa com os gêmeos para alguma coisa que não entendi sobre um ritual que eu não me importava e estava sozinha com Robbie e Leo jogando baralho quando meu espelho de duas vias tremeu. O rosto de Mason apareceu no vidro.

- Ei Mason, tudo bem ai? – perguntei animada, mas ele parecia agitado.
- Parv, você tem que vir pra casa – disse sussurrando e olhou para o lado assustado.
- O que houve? Está tudo bem? – larguei as cartas que tinha na mão já começando a me preocupar.
- É a Emma. Ela precisa de ajuda – ele olhou para o outro lado, como se estivesse vigiando para ninguém encontra-lo – Está todo mundo aqui. Eles... Eles olham para ela como se fosse a Alexis.
- Já entendi. Estou indo, volte para a sala e fique com ela – ele assentiu e sua imagem desapareceu. Virei para Leo e Robbie e eles já haviam encerrado a partida – Quem quer dar uma volta em Sofia?

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A casa estava um pandemônio quando abri a porta da sala. Não estava toda a família, mas sem dúvida metade dela estava ali. Não sei como souberam que Emma estaria em Sofia, talvez papai ou mamãe tenham deixado escapar sem querer, mas nenhum deles deveria estar ali. Era para ser um fim de semana só com eles três, e Mason é claro, mas mais ninguém. Emma estava sentada no sofá com uma expressão de pânico no rosto, visivelmente encurralada, enquanto meia dúzia de tias a enchiam de perguntas. Todas, sem exceção, só conseguiam pensar em Alexis quando olhavam para ela. Não precisava nem ter recorrido a minha habilidade para saber disso. Ainda não tinham reparado nas três novas adições da casa, então bati a porta com o máximo de força que consegui. Imediatamente todos pararam a conversa e olharam para nós três.

- Parvati, pensei que tinha dito que ia ficar na escola – papai falou em um tom confuso, mas sua expressão era de alivio.
- Soube que estava tendo uma festa... Ok pessoal, é o seguinte: se você não deu a luz à Emma ou foi responsável pelo espermatozóide, por favor, fora!
- Parvati! – mamãe, uma dama, ficou horrorizada.
- Nenhum de vocês é bem vindo aqui hoje! – continuei, ignorando o choque no rosto dela e meu pai reprimindo uma gargalhada – Não sei como souberam, mas quero que vão embora agora mesmo. Emma não vai a lugar nenhum, ela está presa a vocês para o resto da vida, vocês terão tempo o suficiente para conhecê-la.
- Parvati, essa não foi a educação que sua mãe lhe deu! – tia Helena, que eu detestava, me repreendeu – Não pode chegar aqui e expulsar as pessoas dessa maneira!
- Essa ainda é a minha casa, então posso sim. E adivinha só, você não é realmente minha tia, então não me importo com a sua opinião. Sei que nunca gostou de mim mesmo, então deve estar aliviada – ela tentou parecer afetada, mas já a conhecia bem demais – Não se sinta mal, titia. O sentimento é recíproco.

Papai já estava roxo de tanto esforço que fazia para não rir. Mamãe estava vermelha, não sei se de raiva ou vergonha, mas não me impediu. Rafe, o tio de quem mais gostava, começou a tossir descontrolado quando tentou reprimir a gargalhada e sua esposa, tia Annie, que eu também gostava muito, acertou sua costela com o cotovelo. Tia Helena parecia que tinha chupado limão, mas não falou mais nada e liderou a debandada. Robbie e Leo iam indicando a porta com os braços, como aquelas pessoas que ficam na pista do aeroporto sinalizando para o avião, se certificando que alguém tentasse desviar do caminho.

- Você sabe que sempre vai ser minha sobrinha favorita, não é? – tio Rafe beijou minha testa quando passou, ainda rindo.
- Parvati sempre causando impacto... – tia Annie riu também.
- Faço o que posso – sorri de volta e eles saíram fechando a porta.
- Parvati, pelo amor de Deus... – mamãe ainda parecia chocada, mas me abraçou e deu um longo suspiro – Como você fala assim com as pessoas? Sua própria família!
- Mãe, olha a cara de desespero da Emma! – apontei para a garota ainda acuada no sofá e ela tentou sorrir, mas o sorriso saiu meio psicótico – Ela parece prestes a cometer um suicídio!
- Não pretendia me sufocar com a almofada, mas confesso que o pensamento me ocorreu – ela respondeu tentando relaxar e todo mundo riu.
- Viu? Fiz um favor a vocês. E agora farei outro – estendi a mão para Mason e ele correu para o meu lado – Robbie, Leo e eu vamos levar Mason para tomar um sorvete e depois vamos ao jogo do Levski. Vamos almoçar na rua e voltaremos antes de anoitecer. Aproveitem o tempo!

Foi uma tarde agradável, embora tenhamos passado a maior parte dela em um estádio de futebol. Obviamente eu não era uma entusiasta do esporte, tampouco Leo e Robbie, mas sempre ia aos jogos com papai quando criança e Mason é um fã incondicional do time da cidade, então valia o sacrifício de assistir a 90 minutos de jogo da tribuna de honra. O Levski venceu a partida por 3 x 1 e Mason estava eufórico quando deixamos o estádio, pouco depois das 17h. Nem mesmo a ignorância de Robbie quanto ao nome dos jogadores e as estatísticas dos jogos, algo que ele achava um absurdo um garoto de 17 anos não saber, o incomodavam mais. A alegria dele me lembrava um pouco Adam, meu irmãozinho que havia conhecido na semana passada, e fiquei surpresa por perceber que já sentia falta dele.

Encontramos Emma sozinha na cozinha em uma animada conversa com uma das empregadas quando chegamos. Papai tinha sido chamado para uma emergência no hospital e mamãe já havia saído para seus compromissos políticos, é claro. Maria estava tirando um bolo de cenoura do forno bem na hora e nos acomodamos em volta do balcão para comer.

- Emma, esses são Leo e Robbie, meus melhores amigos de Durmstrang – disse apontando para os dois e Robbie estendeu a mão, entusiasmado.
- Prazer em conhecê-la! Então era você quem seria nossa melhor amiga se não tivesse sido trocada por essa aqui?
- Provavelmente – Emma respondeu rindo e Leo revirou os olhos.
- Não dê ouvidos ao Robbie, seus miolos ainda estão fervendo por conta das estatísticas de jogos que Mason tentou enfiar na cabeça dele – Leo estendeu a mão também, animada.
- É futebol! – Mason falou de boca cheia, mas voltando a ficar indignado – Garotos deveriam entender de futebol!
- Eu não sou um garoto como os outros, Mason – Robbie replicou e apertei seu braço para que não terminasse o que queria dizer.
- Mamãe e papai saírem a muito tempo? – perguntei interrompendo o assunto.
- Não, só uma meia hora.
- Então isso significa que não vão voltar antes das 21h.
- O que fazemos então para passar o tempo?
- Vídeo game! – Mason ergueu os braços animado e rimos.
- Ok então, vídeo game!

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- Robbie, pare de me acertar com esses cascos de tartaruga! – Leo gritou quando seu kart capotou pela 3ª vez na mesma corrida e todos os outros passaram sua frente – AAARGH!
- Eles não são teleguiados, se você está na minha frente, não tenho como mandar que eles desviem! – Robbie se defendeu, mas já estava lançando outro casco na direção de Mason.

Estávamos jogando Wii há quase três horas e o clima estava longe de ser amistoso. Qualquer coisa se transformava em uma disputa acirrada e até um simples jogo de canoagem colocou todo mundo em pé de guerra. Maria chegou a correr até o quarto para saber o motivo de estarmos gritando e pulando desesperados na frente da televisão, o que acabou aliviando um pouco a tensão. Mas a trégua acabou quando trocamos o jogo para Mario Kart. Ninguém é amigo de ninguém quando se é explodido na pista.

- Ok, chega! – Emma largou o controle quando cruzou a linha de chegada em 8º lugar e levantou do chão – Parvati, você tem wi-fi aqui?
- Tem sim, precisa do laptop? O meu está em Durmstrang, mas papai deixa o dele no escritório.
- Não precisa, trouxe meu iPad. São 20h, Adam já está me esperando para conversarmos.

Ela saiu do quarto e imagino que tenha ido até o quarto de hospedes onde estavam suas coisas, porque voltou segundos depois com um iPad na mão. Ainda estávamos jogando, então ela sentou no chão no canto do quarto e começou a mexer na tela. Não demorou muito e ouvi a voz de Adam saindo do aparelho. Ele havia me contado que todo sábado eles conversavam pontualmente às 20h, que era uma hora antes dele ter que ir para a cama. Meu kart caiu na cachoeira pela 4ª vez e abandonei o jogo.

- Oi bubba! – Emma o cumprimentou e aquele devia ser o apelido dele – Estava com saudades!
- Oi mana! Também estava com saudades, quando você volta pra casa?
- Logo, logo, bubba. Ainda tenho algumas semanas em Hogwarts, mas vamos nos ver no fim do mês na minha formatura, lembra?
- Eu vou conhecer Hogwarts! – ele falou animado e ri. A partida tinha encerrado e agora todo mundo prestava atenção na conversa.
- Isso mesmo, você vai conhecer sua futura escola. 
- Você está em Hogwarts, mana?
- Não, lembra que eu falei que ia passar o fim de semana com os Karev quando nos falamos semana passada?
- Quando a Parvati veio aqui! Ela é legal, eu gosto dela. Você está com ela? Quando ela vai voltar aqui? Ela também é minha irmã! – Adam era um tagarela, conseguia fazer mais perguntas que Mason.
- Eu sei que ela também é sua irmã – Emma estava rindo sem parar – Ela está aqui sim, dá oi pra ela – e virou o iPad na minha direção.
- Oi Adam! – acenei para ele e tinha um sorriso imenso estampado no rosto dele quando acenou de volta.
- Oi outra mana! Quando você vem aqui de novo? Estou com saudades!
- Também estou com saudade de você, baixinho, mas não sei quando vou poder ir até ai. Acho que só nas férias.
- Falta muito pras férias? – ele perguntou confuso e Emma revirou os olhos.
- Três semanas, bubba. Olhe o calendário atrás da sua porta.
- Ah é mesmo! – ele bateu na testa e ri – Tem mais gente ai?
- Tem sim – Emma virou o iPad para o outro lado do quarto e Robbie, Leo e Mason se espremeram na frente da tela, acenando – Esses são Robbie e Leo, amigos da Parvati, e Mason, nosso primo.
- Oi todo mundo! – Adam acenou de volta mais animado que antes – Mason, você joga fruit ninja?
- Sim, quer jogar? – Mason levantou empolgado – Nunca tenho ninguém pra disputar!
- Mana, você empresta seu iPad pra ele jogar comigo?
- Poxa, já está me dispensando? – Emma fingiu estar desapontada, mas não conseguia ficar séria – Tudo bem... Podem jogar, mas só meia hora. Sabe mexer, Mason?
- Sei sim, papai me deixa jogar no dele – ele respondeu pegando o iPad com ela e sentando no canto do quarto.

Em questão de segundos Mason estava completamente abduzido pelo jogo e não ouvia nem via mais nada que acontecia fora da tela do iPad. Robbie desligou o vídeo game, já havíamos brigado o suficiente para uma tarde, e passamos o resto do tempo conversando. Emma ainda tinha muitas perguntas sobre a família e ia explicando um pouco sobre cada um através de um álbum de fotos que tinha no quarto. Quando passei pela página onde só tinham fotos minhas de Alexis, Jack e Julie, a expressão no rosto dela mudou.

- Foi ele que...? – perguntou com a mão em cima de uma foto de Jack fazendo um boneco de neve.
- É. Ele era irmão gêmeo dela, Julie – respondi apontando para a foto ao lado, onde Julie e Alexis decoravam o boneco de neve dele com um uniforme de Durmstrang.
- Não a conheci ainda. Eu acho.
- Não, Julie não estava aqui hoje. Vai conhecê-la nas férias, não se preocupe.
- Ela assusta, mas não morde – Robbie acrescentou e rimos.
- Preciso me preocupar? – ela perguntou receosa
- Não tem motivo para se preocupar, Julie é uma ótima pessoa – Leo respondeu depressa – Ela só é esquentada, mais séria, mas é muito legal.
- Ela parece bem feliz na foto.
- Ela era menos durona antes do Jack morrer, passamos alguns meses sem nos falarmos, mas já está tudo bem – respondi olhando para a foto outra vez – Sempre tivemos um relacionamento meio conturbado, mas ela é uma das pessoas em quem mais confio. Você vai gostar dela.
- Ela também vai me olhar como se eu fosse ela? – perguntou apontando para uma foto de Alexis e notei que seu tom de voz era triste.
- Não, ela já viu sua foto, já sabe que são parecidas, não vai olhar espantada.
- Nós não somos parecidas, somos iguais. Não me entenda mal, eu sinto muito não ter podido conhecê-la, mas queria que não fosse um clone dela.
- Tem um jeito... – Robbie deu um sorriso que dizia claramente que tinha uma idéia genial – Quer mesmo que ninguém mais pense que é igual a Alexis?
- Sim, quero.
- Então deixa comigo.

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- Então? – Emma levantou da cadeira um pouco receosa e Robbie estendeu a mão a ela, fazendo-a dar uma volta – Como ficou?

Levantei do sofá e meu queixo devia estar caído, porque não conseguia me expressar direito. Depois que Robbie disse que tinha um plano, pedi ao meu motorista que nos levasse até o centro da cidade. O destino? Um salão de beleza. Robbie deu a ideia de Emma radicalizar e mudar totalmente o visual. Achei que ela não ia topar, ela parecia o tipo tímido, que não arriscava demais, mas não poderia estar mais enganada. Ela topou o desafio e deu liberdade a Pierre para fazer o que quisesse. O resultado foi seus cabelos reduzidos a quase nada – estavam acima do ombro – uma nova coloração que os deixou castanho escuro e mechas vermelhas para todo lado. Era uma pessoa completamente diferente.

- Você está linda, Emma! – Mason foi quem falou primeiro e ela abriu um sorriso aliviado.
- Obrigada, Mason. Ficou bom mesmo?
- Ficou ótimo – consegui dizer finalmente – Emilia e Nikolaj vão levar um susto quando falar com Adam pelo Skype semana que vem!
- É, vai ser um choque, mas eu adorei – ela riu – Nunca tive coragem de fazer nada desse tipo.
- Você só precisava do incentivo certo – Leo falou e concordamos.
- Você sentou naquela cadeira como um clone da Alexis, mas levantou como Emma Blanchard – Robbie completou.
- Nesse caso, prazer em conhecê-la, Emma! – disse animada e ela se olhou no espelho mais uma vez.

É, ela definitivamente não parecia mais Alexis.