Friday, January 27, 2012

- Que horas são? – Parvati puxou o braço de Robbie e consultou seu relógio – Droga.
- O que foi? – ele puxou o braço de volta – O que tem de errado com 17h?
- Nada. Vejo vocês depois.

Parvati levantou da mesa sem dizer mais nada e saiu do salão principal sem sequer ter tocado no jantar. Por mais que tentasse disfarçar, estava ansiosa com a sessão de terapia sem a companhia de Ozzy. Não que ela pretendesse contar alguma coisa mais relevante ao psicólogo, mas a perspectiva de ficar uma hora sozinha com ele, sem um apoio, era preocupante.

Ozzy a alcançou antes que chegasse aos degraus da escada. Ele também estava preocupado. “Não vá contar nada que se arrependa depois”, ele lhe advertiu. Ela riu, nervosa, “Quem sabe ler mentes sou eu, me dê um pouco de crédito”. No entanto, nenhum dos dois estava convencido de que aquele dia ia terminar de maneira positiva. A caminhada até o escritório no quarto andar foi longa e silenciosa. Quando bateu a porta, ouviu a já familiar voz do Dr. Pace a mandando entrar. Recebeu-a com um sorriso alegre no rosto. “Claro, não é ele quem vai ser encurralado aqui dentro”, ela pensou ao sentar-se no sofá em sua frente, forçando um sorriso.

- Tudo bem, Parvati? Como está sendo a semana?
- As aulas estão um pouco puxadas, mas é o último ano, nada que não esperássemos.
- Ótimo. Antes de começarmos a sessão, preciso pedir que parasse de tentar penetrar minha mente – Martin Pace fitou Parvati, mas sua expressão não era zangada. Parecia estar se divertindo – Embora fique feliz em saber que é uma boa oclumente, devo alertá-la que sou um excelente legilimente. Não conseguirá ler nada.
- Desculpe. – ela disse sem graça.
- Sem problemas. Assunto esclarecido, vamos começar a sessão.

Ela o observou pegar uma pasta roxa da mesa e abrir, folheando suas páginas com atenção. Aquela pasta roxa não era um bom sinal. Além de conter anotações detalhadas sobre a vida acadêmica dos alunos, trazia péssimas recordações à Parvati. Fora por causa dela que uma cadeia de eventos catastróficos se sucedeu, terminando no acidente no último verão. Quando ele pareceu encontrar o que queria, voltou a encará-la.

- Estou com a sua ficha acadêmica nas mãos e devo dizer, estou impressionado. Já havia lido algumas coisas quando comecei a trabalhar com a turma do curso, mas dessa vez pedi a ficha completa e você tem um histórico e tanto.
- Obrigada? – ela deu de ombros e ele riu.
- Um extenso histórico de detenções, frequentemente causadas por implicar com outros alunos, mas muitas por insubordinação e desrespeito às regras, inúmeros relatos de brigas envolvendo você e Oscar... Devo acrescentar que fico até aliviado em ler que as brigas nunca chegaram ao nível físico, estava esperando pelo pior enquanto lia esse material.
- Nós não nos dávamos muito bem.
- E então tudo parou. O último relato de mau comportamento foi em junho do ano passado, pouco antes das férias. Nada depois disso, nem mesmo uma reclamação simples vinda de qualquer professor. O que mudou?
- Eu só... Sei lá, acho que percebi que era imatura e decidi mudar.
- Aqui também diz que você sofreu um acidente de carro no final de julho, onde as duas pessoas que estavam com você no carro faleceram.
- Não quero falar sobre isso, desculpe – disse na defensiva, recuando.
- Precisamos falar sobre isso, Parvati. Sabe por quê? Porque eu acho que foi isso que fez você mudar, e eu quero entender o motivo.
- Minha irmã e meu primo morreram. Isso não é motivo o suficiente pra você querer deixar de ser uma imbecil com as pessoas?
- Não, não é. Isso normalmente revolta ainda mais as pessoas, não as faz recuar. Gostaria que você me contasse o que aconteceu no dia do acidente. O que estava fazendo antes dele? Para onde estava indo quando o carro bateu?

Parvati abaixou a cabeça por um momento, incapaz de impedir que uma lágrima escorresse por seu rosto. Nunca havia conversado com ninguém sobre aquele dia, mas sabia que um dia teria que fazer isso e talvez aquela fosse a hora certa. Dr. Pace era um pessoa em quem ela sabia que podia confiar, mas se era para contar a história, precisaria começar com a confissão do roubo da pasta roxa.

Ele ouviu pacientemente ela contar tudo. Desde o dia em que roubou a pasta com a ajuda de Leonora, destruiu os documentos e foi quase expulsa, levando-a a conclusão de que Ozzy, o único a tê-las visto com a pasta, havia contado ao diretor. Contou também o que fez para vingar-se dele, mesmo sem provas de que havia sido ele o autor da denuncia, e o que aconteceu quando ele descobriu. Falar do dia do acidente, da discussão que a levou a sair de casa atordoada, foi mais difícil.

- Leve o tempo que precisar – disse lhe estendendo um copo com água – A discussão entre vocês ficou séria? – e ela assentiu, bebendo a água.
- Insultos foram ditos de ambos os lados. Ele estava fora de si, eu acabei me exaltando também e dissemos coisas que não devíamos.
- Como você se sentiu ouvindo as coisas que Oscar disse?
- Magoada. Ele estava com razão em ficar furioso e me ofender pra liberar a raiva, mas as palavras que ele disse me machucaram.
- Você se sentiria melhor se ele pedisse desculpas? – e ela assentiu novamente.
- Se nada disso tivesse acontecido, eu não teria saído de casa naquele estado e não teria batido com o carro. Se eu nunca tivesse interferido na entrevista dele com o time de Hóquei, minha irmã e meu primo ainda estariam aqui.
- Você se culpa pelo acidente? – mais uma vez ela assentiu, outra lágrima escorrendo antes que ela pudesse impedir – Tenho algo que gostaria que lesse.

Martin consultou a pasta roxa mais uma vez, mas demorou um pouco mais de tempo para encontrar o que procurava. Encontrou uma cópia de um relatório policial sobre o acidente e estendeu a ela, mas antes que pudesse ler o que ele dizia, ele se adiantou.

- Fique com essa cópia, mas quando a ler vai descobrir que o acidente não poderia ter sido evitado. Não importa quem estivesse ao volante, o carro ia se chocar.
- Como? – perguntou com a voz embargada pelo choro.
- A posição do carro na estrada e a maneira como o caminhão veio ao encontro dele só lhe dava duas opções para tentar desviar. Se jogasse o carro para a esquerda, ia capotar ao subir o barranco. Se jogasse ele pra direita, estaria o arremessando de um penhasco. Nenhuma das opções evitaria o choque, não importa se não estava atenta e não conseguiu evitar a colisão frontal. Não se culpe por algo que não poderia evitar.

Ela assentiu, ainda chorando, e levantou do sofá com a cópia do relatório na mão. Sua hora já havia acabado, mas a conversa, embora séria, fluiu tão bem que parecia ter passado apenas alguns minutos. Parvati se pegou desejando que tivesse mais um tempo com o psicólogo, mas precisava sair para dar a vez a Ozzy. Ele já estava esperando do lado de fora quando saiu e se assustou quando viu que a garota estava chorando.

- O que aconteceu? – perguntou preocupado
- Nada, está tudo bem. Ele está esperando você – ela respondeu sem estender o assunto, apertando o passo para sumir da vista dele.

Ozzy não teve tempo de dizer nada, pois a voz do psicólogo o convidou a entrar. Ele também reparou na pasta roxa em sua mão, mas diferente de Parvati, não se sentia intimidado por ela. Acomodou-se no sofá como de costume, um pouco mais desconfortável do que das outras vezes.

- Oscar Lusth... – Martin olhou da ficha para ele e sorriu – Seu histórico é muito bom. Salvo uma detenção ou outra por brigas nos jogos de Hóquei ou uma brincadeira de mau gosto, seu saldo é positivo. Aluno exemplar, notas excelentes, atleta dedicado. O único saldo negativo no histórico são os extensivos relatos de brigas entre você e Parvati.
- É, a gente não se dava muito bem até o ano passado.
- Aqui diz que as brigas começaram de uma hora pra outra a dois anos atrás, e da mesma forma acabaram – Ozzy deu de ombros, rindo – Pode me dizer o motivo?
- Nós passamos por muitas coisas nas férias, perdemos pessoas que amávamos e isso faz a gente repensar nossas escolhas.
- Então o acidente foi o motivo? Conte-me o que aconteceu naquele dia. Você e Parvati discutiram, não é?
- Você perguntou isso a ela? Por isso ela saiu chorando?
- Não estamos aqui pra falar dela. Quero ouvir o seu lado da história.
- Não gosto de lembrar daquele dia. Foi minha culpa o que aconteceu.
- Você fala da discussão? Parvati saiu de casa nervosa porque discutiram?
- Não... Olha doutor, é complicado. Não posso falar sobre isso.
- Tente descomplicar então. Não estou aqui para julgar ninguém.
- Não é questão de julgar. Você tem o poder de me colocar em uma camisa de força, não vou lhe dar material pra isso.
- O que está acontecendo, Oscar? – Martin percebeu que, o que quer que estivesse acontecendo, era mais sério do que ele julgava – Estou aqui para ajudar, mas se você não começar a ser honesto comigo, não vou poder fazer isso.

Ozzy considerou por um momento. Era loucura contar a verdade, gente demais já sabia dela e mais um poderia fazer tudo sair do controle, mas por outro lado ele sabia que podia confiar no Dr. Pace.

- Tudo que for dito aqui...
- Não sairá dessa sala. Não posso discutir o que é dito aqui com outras pessoas, é antiético.
- Certo. A história vai parecer maluca, mas não é.
- Estou ouvindo.

E ele lhe contou toda a história. Começou com a acusação falsa de Parvati sobre tê-la denunciado ao diretor e de como isso o fez perder a vaga que sempre sonhou no time de Hóquei que é fã. Contou da discussão e de como, minutos depois de Parvati ter saído de casa, encontrou o carro capotado na estrada. E então Ozzy o encarou, e começou a contar a história da sua família. Achava que ele não acreditaria, mas logo percebeu que não estava se passando por louco. Martin ouvia atentamente, assentindo sem dizer nada, como se aquela história não fosse tão surpreendente assim. Ozzy interrompeu a narração quando voltou à parte onde encontraram os corpos no local do acidente.

- Já havia ouvido falar das famílias de Imortais, mas nunca havia conhecido um.
- Não acha que sou louco?
- Não, claro que não. Não esperava que fosse ouvir isso, mas sei que está dizendo a verdade.
- Que bom, porque a história não acabou. Quando nós chegamos lá, estavam todos mortos. Todos, inclusive a Parvati. O processo de imortalizarão só funciona porque conseguimos trazer a alma de volta, mas se ela já tiver feito a travessia não funciona. Jack e Alexis não estavam mais lá, mas Parvati não foi embora.
- E vocês a trouxeram de volta? – Ozzy assentiu – Isso significa que ela também é como você? – ele assentiu novamente e Martin encostou no sofá – Uau.
- Oleg sabia como fazer, mas eu dei a idéia. Entrei em desespero, estava me sentindo culpado e precisava fazer alguma coisa.
- Por que você estava se sentindo culpado?
- Porque eu disse a ela pra bater com o carro. Quando Parvati estava saindo, disse a ela que estaria fazendo um favor se batesse com ele.
- Oscar, não é só porque desejou que algo acontecesse que a culpa é sua.
- Você não entende. Todo Imortal tem uma espécie de habilidade. A minha é ler mentes, mas posso fazer muito mais que isso. Eu consigo manipulá-las. Eu não tinha a intenção de manipulá-la, mas estava tão nervoso que posso ter feito sem querer.

Martin entregou a ele outra cópia do relatório policial, o mesmo que havia dado a Parvati. Ozzy leu com atenção, mas ele sabia pela sua expressão que ainda não estava convencido. Não importa o que digam, ele sempre carregará consigo aquela duvida. E infelizmente aquilo era algo que ninguém poderia ajudar. Para se livrar da culpa, ele teria que encontrar o caminho sozinho.

- Vamos falar sobre o motivo da briga antes do acidente. Você disse que Parvati interferiu em uma entrevista que estava esperando.
- Ela destruiu meu sonho. Jogar pelo Vancouver Cannucks era algo que eu sonhava desde criança e aquela oportunidade era única.
- Vocês já conversaram sobre isso? – ele assentiu, sem encarar o psicólogo – E você a perdoou por isso?
- Sim... Não, na verdade não. Disse a ela que estava tudo bem, que já tinha esquecido, mas era mentira.
- E por que mentiu pra ela?
- Porque não queria falar sobre isso. Foi mais fácil dizer que já estava esquecido.
- Você sabe que vão precisar conversar sobre isso, não sabe?
- Sim, eu sei, mas ainda não estou pronto para perdoá-la. Não estou com raiva nem quero me vingar, estamos nos dando bem agora, só não consigo perdoar ainda. Isso me magoou muito.
- Um passo para você encontrar uma maneira de perdoá-la é ser honesto com ela. Parvati precisa entender as conseqüências de seus atos e saber como você se sente é importante – ele abaixou a cabeça sem responder, mas acabou assentindo – Façamos assim: se você quiser conversar com ela por conta própria sobre isso, faça. Se não quiser, na próxima sessão nós três faremos isso, juntos. Vou ajudá-los se quiserem, mas fica a seu critério.

Ozzy concordou e prometeu pensar se ia conversar com ela sozinho ou esperar pela próxima sessão, mas no fundo ele sabia que não teria coragem de puxar o assunto. Tudo era mais fácil de ser dito nas sessões, então Dr. Pace teria que fazer isso por ele. Pela primeira vez ele iria para a terapia sabendo exatamente o que esperar, mas a perspectiva era ainda menos animadora.

Wednesday, January 11, 2012

Uma boa noite de sono não foi exatamente o que eu tive depois que minha mãe deixou meu quarto. Estava me sentindo péssima por ter beijado Ozzy e demorei a cair no sono. Quando finalmente adormeci, sonhei com a cena e acordei outra vez. Daí em diante não voltei a dormir. Sempre que fechava os olhos via o beijo em minha mente e começava a chorar. Quando mamãe entrou no meu quarto na manhã seguinte minha aparência devia estar horrível, porque o sorriso sumiu de seu rosto e ela correu até a minha cama, espalmando a mão na minha testa com uma expressão preocupada.

- Ai querida, você está ardendo em febre. Conseguiu dormir essa noite? – ela passou a mão no meu rosto, estava suado. Eu neguei – Bom, você não vai a lugar algum assim, então tente dormir um pouco agora enquanto chamo seu pai e trago um remédio. Vou mandar um recado ao Igor pela Julie. Você vai ficar aqui até melhorar.

Mamãe saiu do quarto e voltou minutos depois com meu pai e um copo d’água, com um comprimido na mão. Ele confirmou que minha febre era alta e mamãe me empurrou o remédio. Quando eles saíram do quarto, fechei os olhos e apaguei no mesmo instante.

ºººººº

A febre não foi embora pelo resto do dia e os planos de voltar a Durmstrang no trem com meus amigos foram por água abaixo. E honestamente, eu estava um pouco aliviada. Não fazia idéia de como seria encarar Ozzy outra vez e teria muito pouco tempo para descobrir se voltasse pra escola com eles. Só acordei outra vez no final do domingo, e como ainda estava com febre, mamãe me deu outro remédio e voltei a dormir.

Segunda-feira não foi muito diferente. Ainda com febre alta quando acordei, a perspectiva de sair da cama não era muito animadora. Mason havia voltado pra escola e só estaria de volta em casa depois das 17h, então passei boa parte do dia sozinha. O que foi péssimo, porque me deu muito tempo para pensar. E tudo que eu conseguia pensar era no maldito beijo e aquilo estava me deixando louca. Estava com raiva de mim mesma por ter feito isso com Lukas, logo depois dele ter ido embora. Sei que fiz isso muitas vezes no passado, mas não queria mais ser aquela pessoa. Eu achava que tinha mudado, mas agora não estava mais tão certa disso.

Mamãe voltou de seus compromissos no final da tarde e foi direto ver como eu estava. A febre tinha diminuído, mas ainda não tinha ido embora por completo. Ainda sentia meu corpo mole e frio e calor ao mesmo tempo, mas se tinha diminuído, então talvez eu pudesse sair da cama no dia seguinte. Ela me fez beber uma poção que papai tinha deixado preparada e sentou do meu lado na cama, me acolhendo no colo. Era tão bom ficar assim que quase desejei que a febre não fosse mais embora.

- Acho que já vai estar boa pra voltar à escola amanhã – disse enquanto alisava meu cabelo. Se não tivesse passado boa parte do dia dormindo, já teria apagado.
- Espero que sim. Já perdi um monte de aula importante hoje, não posso perder mais um dia inteiro – era verdade, não queria nem ver a quantidade de matéria de Poções e Transfiguração eu tinha perdido – Essa febre sem sentido não veio em boa hora.
- Talvez não tenha sido tão sem sentido assim – olhei pra ela sem entender e ela fez aquela cara que as mães fazem que você se sente um ignorante – Acredito que sua febre tenha sido emocional.
- Como assim emocional?
- Eu reparei em como as coisas estão diferentes entre você e Lukas. Vejo o modo como ele olha pra você, mas não vejo o mesmo olhar em você pra ele. Alguma coisa mudou.
- Não tem nada diferente, mãe. Eu gosto do Lukas.
- Mas você não o ama, essa é a diferença no relacionamento de vocês. Você pode nunca tê-lo amado, mas nunca foi indiferente. Você está mais distante dele e não está conseguindo disfarçar. Seu olhar perdido lhe entrega.
- Aconteceram tantas coisas depois do acidente, minha cabeça não está mais focada no meu namoro com ele.
- Existe outra pessoa?
- O que? Não! – disse na defensiva e ela se assustou um pouco – Não estou traindo o Lukas.
- Não disse que estava o traindo, perguntei apenas se você se interessou por outra pessoa.
- Não tem ninguém.
- Sua febre é culpa. E negue o quanto quiser, mas alguém despertou sua atenção e não está sabendo lidar com isso. Se não ama o Lukas, não pode se sentir culpada por isso, mas precisa terminar com ele antes de se envolver com outra pessoa.
- Minha cabeça está pesada – não era mentira, estava mesmo começando a me sentir tonta.
- Vou deixá-la descansar e refletir um pouco – ela levantou da cama e beijou minha testa – Lembre-se, não tem nada com que se sentir culpada.

Mamãe saiu do quarto e fechou a porta, me deixando outra vez sozinha. Eram tantos pensamentos passando pela minha cabeça que em um instante ela já estava latejando. Sem vontade alguma de pensar no assunto, peguei o resto da poção do sono que meu pai havia deixado e tomei, adormecendo em seguida. Podia lidar com isso amanhã.

ºººººº

- Você já está ótima, pode voltar pra escola.

Papai “me deu alta” na manhã de terça-feira. Mamãe queria a todo custo me acompanhar de volta a Durmstrang, mas consegui convencê-la de que eu estava realmente bem e podia pegar a chave de portal sozinha. Cheguei à escola depois das 10h, o que significava que já tinha perdido metade da aula de DCAT e o professor não ia me deixar entrar, então fui direto pra república desfazer a mochila e aproveitar um raro momento de silêncio nela. Quando as aulas terminaram para o intervalo do almoço fui para o castelo procurar Robbie e Leo. Encontrei os dois a caminho do salão principal.

- Ah, quem é vivo sempre aparece! – Robbie me abraçou – Está melhor?
- Sim, a febre já passou. Estou de volta.
- Ótimo, porque estávamos aqui loucos pra saber das novidades! – Leo disse animada e ela e Robbie trocaram um olhar ansioso.
- Que novidades?
- Você não tem nada pra nos contar? – Robbie perguntou e neguei – Não acredito que não pretendia nos contar que beijou o Ozzy!
- Fala baixo! – tapei a boca dele desesperada e eles me arrastaram pra fora do transito de alunos – Como vocês sabem disso?
- Todo mundo sabe – Leo riu – Vocês estavam no meio da pista de dança, as pessoas tem olhos, sabe?
- Nem todos viram, mas isso meio que foi o assunto do resto do casamento depois que você foi embora – Robbie completou e devo ter feito uma cara de pânico, porque ele se apressou em explicar – Ozzy não estava na roda de fofoca, não vimos muito ele depois também.
- O que aconteceu?
- Não sei. Só... Aconteceu.
- Vocês já conversaram?
- Não, mas podem tirar esses sorrisos do rosto, isso não vai acontecer outra vez.
- Claro, porque pelo que lembro, não ia acontecer nunca, não é? – Robbie debochou.
- Estou falando sério, não vou mais fazer isso com o Lukas, ele não merece. E por favor, esse assunto morre aqui. Estou tentando esquecer que isso aconteceu e com vocês me lembrando o tempo todo vai ser difícil.
- Ok, não vamos mais falar disso, mas só uma última pergunta, pode? – Leo fez uma cara de pidona e revirei os olhos, mas concordei – Foi bom?
- Você só pode estar de brincadeira.
- Não, estou falando sério. O que foi? Nunca teve medo de responder essa pergunta. Ficou balançada? – ela perguntou debochada e os dois me encararam me desafiando a negar.
- Não, não fiquei balançada – respondi irritada – E foi bom sim, mas não vai acontecer outra vez.
- Quer aumentar a aposta? – Robbie estendeu a mão a Leo, que apertou na mesma hora.
- Manda ver. 20 galeões que não passa do mês que vem.

Deixei os dois rindo no meio do corredor e voltei pra república, sem a mínima vontade de comer. Minha fome tinha evaporado, assim como a vontade de assistir ao resto das aulas do dia.

ºººººº

Passei o resto do tempo de aula escondida na república, mas não podia ficar lá pra sempre. Na verdade, precisava sair naquela mesma tarde. O psicólogo havia remarcado a sessão da semana para aquele dia, às 17h, e se eu faltasse seria pior. Então às 16:40 sai do quarto e caminhei lentamente até a sala de duelos.

Ozzy já estava em pé do lado de fora esperando dar a hora de entrar. Quando me viu desencostou da parede e fez menção de ir ao meu encontro, mas desistiu e esperou que eu me aproximasse. Foram longos segundos em silêncio, que pareceram horas, até que ele quebrou o silêncio.

- Está melhor? Julie disse que estava doente.
- Sim, obrigada. Foi só uma febre.
- Está usando a pulseira – disse olhando para o meu pulso.
- Disse que ia usar, gostei do presente.
- Achei que não ia mais usar, sabe, depois que a gente...
- Ozzy, será que tem alguma chance de deixarmos isso pra lá? O que aconteceu foi um erro.
- Sim! – ele parecia aliviado – Não sabia como falar isso com você, mas, por favor, vamos esquecer isso. Aquilo não devia ter acontecido.
- Exatamente. Foi só um beijo, nada demais, não vamos fazer tempestade em um copo d’água. Não quero abrir essa porta outra vez.
- Nem eu. Vamos esquecer então?
- Já nem lembro mais.

A porta da sala se abriu em seguida e duas meninas do curso saíram. Elas nos cumprimentaram rápido e sumiram no corredor. A voz do Dr. Pace nos mandou entrar e nos acomodamos no sofá de sempre, de frente pra ele.

- Desculpem ter remarcado a sessão, mas preciso estar em outro lugar na quinta-feira.
- Não tem problema, não faz muita diferença o dia da semana – Ozzy respondeu e assenti.
- Então, como foram as festas de fim de ano?
- Foi legal, minha família estava toda na minha casa – ele começou a falar animado – Tenho uma família muito grande, então foram dias tumultuados, mas divertidos.
- E você, Parvati? Como foi a comemoração na sua casa?
- Normal, como todo ano. Nos reunimos na casa da minha avó pro Natal e o ano novo, só a família.
- Vocês se encontraram durante o recesso?
- Sim, ela foi até a minha casa pra trocarmos presentes. Ganhei uma camisa do Vancouver Cannucks autografada por todos os jogadores, o namorado dela é do time.
- Pela sua empolgação, foi um excelente presente – ele riu – E o que deu a ela?
- Isso – mostrei a pulseira a ele. Ele olhou com atenção, mas não fez nenhum comentário sobre o símbolo.
- Muito bonita. Alguma coisa de diferente que tenham feito e queiram compartilhar?
- Minha irmã casou no sábado, todos os nossos amigos foram – ele disse olhando pra mim e confirmei – Foi bem legal, fui padrinho dela.
- Adoro festas de casamento, sempre saio com muitas histórias pra contar. Alguma que queiram dividir?
- Não, nenhuma – só foi preciso um olhar pra concordarmos que ele não ia saber sobre o beijo – Só as coisas de sempre.
- Lenneth pegou o buquê, você já tinha ido embora – Ozzy falou me olhando – Foi um momento embaraçoso na mesa, todo mundo olhando pra ela e pro Lucian, mas depois todo mundo acabou rindo.
- Preciso me lembrar de mexer com ela – disse rindo, imaginando a cena.

A conversa seguiu morna até o fim da sessão. Ele puxava os assuntos e respondíamos apenas o que não ia nos comprometer. Isso acontecia desde o primeiro encontro e desconfiava que ele soubesse que não estávamos sendo sinceros, mas a confirmação só veio no final daquela sessão.

- Na semana que vem vamos experimentar algo diferente – ele falou antes de levantarmos, fazendo anotações – Vamos ter dois dias se sessão. Parvati, você virá na terça às 17h e Oscar às 18h. Quero conversar com vocês separados e depois, na quinta, teremos a sessão normal com os dois juntos.
- Por que isso? – perguntei desconfiada.
- Quero ouvi-los separado, quem sabe fazê-los falar algo que não querem estando juntos. Vai ser só dessa vez. Estão liberados, podem sair.

Saímos da sala preocupados. O que ele pretendia arrancar de nós, nos separando? O que quer que fosse, não ia conseguir. Íamos combinar histórias que ele possivelmente ia perguntar e evitar contradições. Tudo que eu não precisava era dar ao Dr. Pace mais motivos para estender as sessões.

Tuesday, January 10, 2012

Ivana Karev chamou todos os netos da varanda, carregando Alexis no colo enquanto fazia a contagem dos que iam passando por ela. Parvati, Jack e Julie foram os últimos a entrar, ainda pendurados nos braços do avô Georgi. A mesa da sala, enorme, estava toda ocupada com bolos, pães de todos os tipos, sucos, leite e café, para os netos mais velhos que sempre pediam para experimentar.

- Kurt não está aqui – Ivana observou recontando os netos sentados na mesa, atacando os bolos.
- Karl, onde está seu irmão? – Georgi perguntou ao neto mais velho. Karl era o líder dos primos, com seus poucos 13 anos.
- Disse que ia dar comida ao Rambo – Karl respondeu dando de ombros, com um pão doce inteiro na boca.
- Ah, ai está ele – Ivana apontou para a porta aliviada, mas seu semblante logo mudou quando viu que o neto de 7 anos estava chorando – Kurt, querido, o que houve?
- Rambo fugiu! – ele abraçou a avó aos prantos – Fui levar um pedaço de bolo pra ele e a coleira estava arrebentada.
- Fique calmo, baixinho, Rambo deve ter saído para um passeio na floresta, logo ele volta – seu avô tentou acalmá-lo, abaixando ao seu lado para ficarem no mesmo nível.
- Mas já está escurecendo, e se ele não achar o caminho de volta?

Como se tivesse sido planejado, um trovão fez o chão da casa tremer no instante que Kurt terminou de falar. Logo depois um relâmpago iluminou a sala e todos saltaram assustados na mesa. Kurt olhou para a avó com uma expressão que era de puro terror e Georgi ficou de pé.

- Não se preocupe, nós vamos encontra-lo. Karl, engula esse pão doce e me ajude a organizar grupos de busca. Vamos trazer seu cachorro de volta antes da chuva cair.

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- Parvati? – a voz de Lukas a trouxe de volta a realidade – Chegamos, não vai descer?

Parvati abriu os olhos e estava outra vez dentro do carro de seu pai, sentada ao lado de Lukas e Mason no banco de trás. Estavam parados do lado de fora do portão da mansão dos Lusth, o manobrista aguardando para levar o carro. Seus tios, com Julie, saíram do carro de trás. Seu pai lhe entregou as chaves e logo apareceu alguém do cerimonial para acompanha-los até a mesa. O casamento seria na própria casa, que era grande o bastante para a festa. Todo o jardim estava decorado com tulipas brancas, mas foi quando se aproximaram da parte dos fundos que viram a decoração completa.

Um espaço para a cerimonia havia sido montado em uma parte de destaque do jardim, com um altar improvisado e espaço suficiente apenas para os casais de padrinhos, o restante dos convidados deveriam assistir de suas mesas, que estavam montadas próximas à área. Cada mesa comportava dez pessoas e também tinham como arranjo um lindo buquê de tulipas. Parvati se acomodou com seus pais em uma das mesas mais próximas ao altar, junto de seus tios. Julie não sentou com eles, preferiu se juntar à mesa ao lado, que estava sendo ocupada por Lucian, seu irmão e seus pais, Finn e sua mãe e Lenneth e seus pais. Os gêmeos Karpov estavam sentados com a família, do outro lado do jardim. Apenas acenaram de longe ao verem os amigos, mas não podiam ir até eles antes da cerimônia.

- Você viu a Leo? – Parvati perguntou a Lukas, mas sua pergunta foi respondida antes que ele pudesse olhar em volta.

Leonora chegou acompanhada de Mitchell e sua família. Eles vinham de braços dados, como um casal, e sentaram na mesa atrás da dela. Leo piscou quando passou por Parvati, mas não podia sentar com eles naquele momento. Parvati já estava quase ligando para Robbie quando viu o amigo chegar ao lado dos pais, muito elegante em um terno de risca de giz. Sempre muito sério quando estava na presença do pai, Robbie ocupou uma cadeira vaga ao lado de Parvati e seus pais ocuparam as duas últimas duas vagas da mesa ao lado de seus tios, cumprimentando a todos com educação. A família de Leonora também estava presente, mas sentados em uma mesa afastada, um claro sinal de que não estavam junto da garota.

- Viu isso? - Parvati indicou a mesa de Leo para ele – Acho que era essa a novidade que ela só queria contar pessoalmente.
- Sim, Mitchell me procurou antes do Natal querendo saber o que a Leo tinha com o Damon – Robbie cochichou de modo que só a amiga podia ouvir – Estava se rasgando de ciúmes, mas obvio que não admitiu.
- Então parece que é sério – Parvati abriu um sorriso – Você me deve 5 galeões.
- Pago depois, já vai começar o casamento.

Ele apontou para o altar, onde o padre havia acabado de aparecer e uma música anunciou que a cerimônia estava prestes a começar. O noivo, Joffrey, entrou primeiro com sua mãe. Usava uma farda da Marinha muito bonita, exibindo com orgulho sua patente de Tenente-Coronel das Forças Armadas Búlgara. Quando eles chegaram ao altar, começou a entrada dos padrinhos. Eram quatro casais para cada e do lado da noiva, todos os seus irmãos estavam presentes. Ozzy foi o primeiro deles a entrar, acompanhado de uma garota morena que aparentava ter a sua idade. Katarina entrou por último, de braços dados com seu pai. Estava linda em um vestido branco tomara que caia, bem simples, mas lindíssimo, com tulipas bordadas em todo o comprimento da saia.

A cerimônia foi curta e bonita. Sem enrolação demais, o padre fez algumas brincadeiras para descontrair, passou pelas partes de praxe e em menos de vinte minutos os padrinhos escolhidos para servirem de testemunhas já estavam assinando o livro. Ozzy foi o escolhido por Katarina, enquanto Joffrey escolheu a madrinha devia ser sua irmã, pela semelhança. Os dois voltaram aos seus lugares e o padre autorizou o beijo, encerrando a cerimônia.

Todos continuaram em suas mesas enquanto o jantar era servido e os noivos passavam em uma de cada vez para falar com seus convidados. Quando tudo isso acabou, Parvati puxou Lukas e Robbie para fora da mesa, tirou Leo e Mitchell da mesa de seus pais e encontrou uma vazia para ocuparem. Não demorou muito e Lucian, Finn, Lenneth, Julie, Oleg e Alec se juntaram a eles. Seus pais, se vendo seus os filhos, rapidamente se juntaram também e engataram em um animado bate papo. Edgar tirou Lawfer da conversa de adultos e Mason logo encontrou alguns amigos da mesma idade, desaparecendo entre os convidados.

O clima na mesa estava estranho. Leo agora estava namorando Mitchell, oficialmente, e Finn não gostou da novidade. Lançava olhares rancorosos aos dois de tempo em tempo, parando sempre que Oleg lhe dava uma cotovelada. Lucian e Lenneth ainda estavam distantes. Sem se falar desde a apresentação no vilarejo, ele tentava agir como se tudo estivesse normal, mas não estava tendo muito sucesso. Robbie também não estava relaxado. Mesmo Alec lhe pedindo para não dar atenção às pessoas, não parava de olhar na direção da mesa dos pais para saber o que estavam fazendo. Ele nunca ficava a vontade com o pai por perto. As coisas já estavam estranhas na mesa, mas piorou quando Ozzy apareceu. Estava acompanhado da garota que entrou com ele no altar e puxou duas cadeiras da mesa ao lado, sentando com os amigos.

- Pessoal, aos que ainda não conhecem, essa é a Jane – disse apontando para a garota, que sorriu simpática e acenou para as pessoas na mesa – Bom, tirando Alec, Oleg, Lenneth e Lucian, que você já conhece, esses são Julie, Robbie, Parvati, Lukas, Leonora, Mitchell e Finn. Todos estudam comigo.

Ela cumprimentou a todos e de repente todas as atenções da mesa estavam voltadas para ela. Os que já a conheciam queriam saber como havia sido o ano, os que haviam acabado de conhecer queriam saber mais ao seu respeito. Em questão de minutos Parvati se viu sendo a única a não demonstrar um interesse fora do comum na garota. Ela não estava certa do que estava acontecendo, mas sem dúvida era estranho.

- Com licença, preciso atender isso – Lukas levantou da mesa quando seu celular tocou e Parvati aproveitou para puxar Robbie para perto dela.
- Quem é essa Jane, que eu nunca ouvi falar? – falou baixo para só o amigo ouvir, mas Leonora já estava atenta do outro lado – O que tem de tão interessante nela, que todo mundo está lhe enchendo de perguntas?
- Merlin mulher, seu namorado está logo ali, controle-se! – ele brincou e Parvati lhe lançou um olhar feio, procurando apoio em Leo.
- É Parv, qual é, está ficando evidente – o apoio não apareceu.
- Ah por Merlin, não comecem! Só perguntei quem ela é, estou curiosa com o interesse geral.
- Aham, sei. Quem não te conhece que te compre, querida – Robbie fez uma de suas caretas habituais e Leo riu.
- Ok, se não dá pra falar sério, deixa pra lá – ela levantou e saiu atrás de Lukas.
- Ela cai tão fácil na pilha ultimamente – Leo comentou ainda rindo quando a amiga se afastou – Mas sério, também não entendi todo mundo interrogando a pobre da garota.
- Nem eu, mas depois pergunto ao Alec quem ela é. Vamos deixar a Parv sofrer mais um pouco.

Os dois riram e voltaram à atenção aos seus namorados, quando uma musica mais lenta começou a tocar na pista de dança. Oleg levantou e convidou uma das damas de honra que estava passando para dançar. Mitchell prontamente ficou de pé, estendendo a mão a Leo. Os dois saíram juntos e foram seguidos por Ozzy e Jane e Alec e Robbie. Finn levantou também, estendendo a mão a Julie, que aceitou. Lucian ficou sem alternativa quando se viu sozinho na mesa com Lenneth e a tirou para dançar. O clima entre eles era o mais romântico possível, mas nenhum dos dois admitia e faziam o possível para não deixar transparecer mais do que já estava claro.

- Algum problema? – Parvati perguntou se aproximando de Lukas.
- Sinto muito, vou ter que ir embora – ele parecia realmente chateado – Era o meu agente, tenho que estar no centro de treinamento em uma hora para um confinamento. Tenho que ir para casa pegar minhas coisas e conseguir uma chave de portal pro Canadá. Você me perdoa por abandona-la no meio do casamento?
- Tudo bem, não tem problema. Nem ao menos esperava que fosse poder vir, já estou satisfeita que pode ao menos assistir a cerimonia.
- Você é a melhor – ele a beijou carinhoso – Vou me despedir dos seus pais antes de ir. Assim que tiver uma folga venho lhe visitar, prometo.

Lukas a beijou outra vez e se afastou, indo se despedir de seus pais. Parvati decidiu não acompanhá-lo, tampouco voltar para a mesa. Se fosse ficar sozinha, preferia que fosse em um dos bancos espalhados pelo jardim. Dele tinha uma boa visão da pista de dança, onde seus amigos ainda estavam. Viu Lucian e Lenneth dançarem com os rostos colados, ambos de olhos fechados, lutando para resistir à tentação de se entregar ao que sentiam um pelo outro. Viu Leo com um olhar apaixonado nos braços de Mitchell, sem perceber os olhares magoados vindos de Finn, que dançava a poucos passos de distancia com Julie. E Robbie, sempre tão reservado quando estava perto do pai, dançava abraçado a Alec sem se importar com os olhares de censura. Parvati notou que o Sr. von Hoult os observava, mas não exibia uma expressão zangada. Não estava feliz também, mas parecia conformado. Sem duvida o sorriso de sua esposa, que segurava sua mão com firmeza, estava ajudando naquela fase de aceitação.

Sua atenção de repente se voltou para Ozzy, que estava próximo a Oleg e sua dama de honra. Ele dançava com Jane e ambos tinham sorrisos radiantes no rosto. Não estavam de rosto colado, mantinham distancia e conversavam o tempo inteiro, mas sempre exibindo um sorriso. Estavam se divertindo, sem dúvida. Parvati sentiu um pouco de inveja, queria estar dançando também ao invés de estar sentada de fora, apenas assistindo. A dança dos dois foi interrompida pela chegada de um rapaz loiro um pouco mais alto que Ozzy, com um terno azul marinho. Depois de algumas palavras rápidas, mais sorrisos e um caloroso aperto de mão seguido de um abraço, Ozzy se afastou e Jane começou a dançar com o rapaz, agora com mais intimidade. Antes que Parvati pudesse ver para onde Ozzy tinha ido, os dois já estavam se beijando.

- Por que está aqui sozinha? – ela se assustou quando viu que Ozzy já estava sentando ao seu lado no banco – Perdeu o Lukas?
- Ele precisou ir embora, algo sobre um confinamento e estar no Canadá em uma hora. Perdeu a namorada para o bonitão?
- Quem, Jane? – ele riu com gosto – Ela não é minha namorada, é minha prima. O “bonitão” é Loki, seu namorado.
- Desculpa, mas vocês estavam tão íntimos, pareciam mais namorados.
- Isso é um pouco nojento. Jane e eu fomos criados juntos, temos a mesma idade. Passamos pelo ritual na mesma época, mas logo depois ela foi para o Japão passar um ano estudando na escola de lá, quase não tivemos oportunidade de conversar sobre as mudanças que aconteceram.
- Está acontecendo alguma coisa entre o Lucian e a Lenneth? - ela perguntou de repente, mudando de assunto.
- Não, mas é complicado – ele ficou de pé e estendeu a mão a ela – Não pode vir a um casamento e não dançar pelo menos uma música.

Parvati hesitou por um momento, mas ele tinha razão, não podia passar o casamento inteiro sem ir ao menos uma vez à pista de dança. Se Lukas não estava ali para dançar com ela, não ia se privar por causa disso. Segurou sua mão sorrindo e deixou que a conduzisse até a pista. Ela reconheceu a música assim que se aproximaram dos casais já dançando, era de um dos seus filmes favoritos. Ozzy deslizou a mão pela sua cintura, mas mantiveram uma distancia segura, seguindo o ritmo da melodia. A música era sobre o tempo que a pessoa esperou para estar com quem ela ama, o quanto ela sempre esteve tão perto e ao mesmo tão longe de conseguir o seu final feliz. E sem que percebessem o espaço entre eles foi aos poucos diminuindo.

A cada novo verso da música eles sentiam seus corpos mais próximos. Parvati fechou os olhos e deixou que a letra da música a invadisse. Quando os abriu novamente, seu rosto estava tão próximo do rosto de Ozzy que estavam se tocando, mas algo a impediu de se afastar. Alguma força inexplicável fez sua mão subir até seu pescoço e se entrelaçar em seus cabelos e ela sentiu a mão dele deslizar carinhosamente pelas suas costas. Estavam tão próximos que ela estava respirando em seu pescoço, sentindo seu cheiro. A boca dele tocou sua orelha e ela sentiu seu corpo reagir. Seus olhares se encontraram e Ozzy encostou sua testa na dela, acariciando seu rosto. O beijo foi inevitável. Começou tímido, guiado pela incerteza, mas logo se transformou em um beijo intenso. Era como se eles fossem os únicos na pista de dança e a música tivesse parado para dar lugar àquele momento. Tudo ao redor parou por alguns segundos, e então Parvati percebeu o que estava acontecendo. Ela interrompeu o beijo e pôs as mãos no peito dele, o afastando.

- Preciso ir – disse sem conseguir olhá-lo nos olhos – Desculpe.

Ela não esperou para ouvir o que ele tinha a dizer. Atravessou a pista de dança esbarrando nas pessoas sem pedir desculpa e parou diante da mesa dos pais, ainda ofegante por causa do beijo. Sua mãe a olhou preocupada, estava sempre alerta desde o acidente.

- Podemos ir embora? Não estou me sentindo bem. – era mentira e ela se sentia mal por fazer aquilo com sua mãe, mas sabia que era a única maneira de convencê-los a ir para casa sem questionamentos.
- Claro minha querida, o que você está sentindo? – ela levantou depressa e colocou a mão em sua testa.
- Estou um pouco tonta, preciso deitar um pouco.
- Vamos embora então, Mason já está dormindo na mesa – e apontou para seu primo, deitado em duas cadeiras desmaiado.
- Saia na frente com ela e peça ao manobrista para tirar o carro, Karen – seu pai levantou também – Vou me despedir de Katarina por todos nós e depois pego o Mason, encontro vocês lá fora.
- Tubo bem, vamos querida – Karen se despediu rapidamente dos amigos na mesa, Parvati fez o mesmo e seguiram em direção à saída.

Ela não olhou para trás enquanto caminhavam. Não queria correr o risco de ver Leo ou Robbie e tê-los correndo até ela para perguntar o que tinha acontecido. Pior, ver Ozzy a olhando. Não sabia qual seria sua reação e não estava preparada para descobrir. Seu pai apareceu cinco minutos depois com Mason dormindo no colo e menos de uma hora depois Parvati já estava de pijama, deitada em sua cama. Sua mãe ficou com ela até se certificar de que não estava passando mal e deixou-a sozinha. Assim que a mãe fechou a porta do quarto, Parvati afundou a cabeça no travesseiro e começou a chorar.


How could I face the faceless days
If I should lose you now?
We’re so close
To reaching that famous happy end
And almost believing this was not pretend
Let’s go on dreaming for we know we are
So close
So close
And still so far

Jon McLaughlin – So Close, Trilha Sonora de Encantada

Wednesday, January 04, 2012

17 de Dezembro de 2015

Hang a shining star upon the highest bow, oh yeah, oh
And have yourself a merry little Christmas now, oh, oh
Faithful friends who are dear to us
They gather near to us once more, oh, oh
Through the years we all will be together and
If the fates allow, oh yeah
But 'til then we'll have to muddle through somehow, oh yeah, oh, oh
And have yourself a merry little Christmas now, ooh yeah, oh, ooh


Após o show maravilhoso, a professor Yelchin brindou conosco e nos deu os parabéns, estavamos conversando na mesa, quando Mitchell se aproximou querendo conversar comigo. Troquei um olhar nervoso com Parv e o segui, e fomos ate uma área que as pessoas estavam usando para dançar, e começamos fazer o mesmo:
- Nossa apresentação foi incrivel não é? – comecei a puxar assunto e ele me olhava de forma intensa, perguntei:
-Tem sujeira no meu rosto?
- Não tem nada errado com seu rosto. Foi uma apresentação maravilhosa, como você.- sorri descrente:
- Claro, e você vai dizer que meus olhos brilhavam como estrelas ao luar, e eu vou responder que foi devido ao clima natalino.
- Mas seus olhos realmente brilhavam... Espera, eu achei que brilhassem por minha causa, fiquei frustrado agora. – e com isso ele me girou e eu ri.
- Aonde você vai passar o Natal? Robbie me disse que você não vai ficar com ele.- ele quis saber.
- Vou até a Italia, na casa de alguns amigos, tenho coisas a resolver por lá e...
- Meu irmão me contou sobre a aposta. Achei muito corajosos de sua parte. Sabe, eu gostaria que viesse co...
-Mitchell!- paramos de dançar e vimos o pai dele parado junto com uma mulher bonita, que nos encarava:
- Pai, mãe...Que bom que chegaram...- dizia Mitchell enquanto os abraçava, depois ele se virou para mim:
- Pai, mãe, esta é Leonora Carrara Ivashkov, minha parceira e amiga, nós fizemos um dueto no show. – o pai dele me estendeu a mão e sorriu, mas a mãe após me olhar criticamente de cima a baixo, estendeu a mão e mal nos tocamos ela se soltou e se virou para o filho:
- Sinto não termos conseguido chegar mais cedo, querido, tenho certeza de que você estava maravilhoso.Está pronto? Sua tia está nos esperando. Adeus, foi um prazer conhece-la.- e foi embora junto com o marido que trocou olhares significativos com o filho.
- Sua mãe é uma mulher muito bonita.- comentei e Mitchell me olhou um pouco sem graça:
- Sim, ela é, e normalmente é mais amável do que isso. Desculpa, não sei o que está havendo com a minha mãe...Então gostaria que você viesse...- não consegui ouvir o restante da sua frase, pois duas mãos calosas tamparam meus olhos e uma voz macia disse perto do meu ouvido:
- Sentiu saudades minhas, Leonora Marie?- acabei sorrindo depois de tirar as mãos do meu rosto:
- Damon, o que faz aqui?- e ele me abraçou apertado.
- Vim te buscar para irmos para a Itália, você ainda não fez o teste de aparatação e precisa de uma carona.Opa, acho que interrompi a sua conversa. Sou Damon Salvatori.- estendeu uma das mãos para Mitchell e pousou a outra em meu ombro. Mitchell o cumprimentou e eu quis saber esperançosa:
- O que você ia me dizer, Mitchell?- e ele respondeu:
- Quero que você tenha um ótimo feriado de fim de ano, Leonora, te desejo tudo de bom.- e foi embora para se encontrar com seus pais que o aguardavam perto da saída.
- Atrapalhei alguma coisa Leonora Marie? – quis saber Damon e eu respondi:
- Não havia nada para atrapalhar Damon. – nos despedimos de meus amigos e fomos para a Itália.


Início da noite de 25 de Dezembro de 2015


Cheguei da Itália exausta, pois não havia descansado direito nem mesmo durante as festas na casa de Damon. O avô dele, Vincenzo quandou soube da aposta com meu pai, se ofereceu para me ajudar e ele cumpriu a palavra. Foi comigo à casa de vários operários antigos da fábrica, que me deram idéias para melhorar a produção, e Damon não saía de meu lado, porém foi seu irmão, Stefan, quem deu a idéia mais maluca de todas, mas que poderia fazer a fábrica ganhar notoriedade e as pessoas lembrarem de nossa qualidade: criar um concurso de culinária, com o nosso azeite e o dinheiro das inscrições ser revertido para alguma instituição de caridade, e ele mesmo passou a ajudar, criando um novo layout para o rótulo das embalagens, que ficaram lindos.Liguei para Robbie e Parv e eles também me davam ótimas idéias para divulgação. Trabalhamos muito, ainda tive a idéia de fazer uma lista de todos os grandes chefs que conhecia e encaminhei a cada um deles uma cesta com os nossos produtos, convidando-os a serem juizes do concurso, e um que Damon, sugeriu entusiasticamente, foi um chef brasileiro famoso, que era aparentado com uma de suas ex- namoradas, e pela carta que recebi com sua resposta positiva e os livros autografados, achei o chef Foutley muito simpático.
Subi para meu quarto e tomei um banho demorado, e até pensei em ir até a casa de Parv ou de Robbie, porém acabei caindo no sono. Algumas horas depois, acordei com alguém batendo na porta da frente. Estranhei pois o segurança não deixaria nenhum estranho passar sem me avisar antes. Desci de pijama, e rosto amassado e com os cabelos desalinhados e quando abri a porta quase cai de costas, era Mitchell.
-Oi! – foi só o que consegui dizer enquanto ele me olhava de cima a baixo e abria um sorriso.
- Espero que tenha deixado leite e biscoitos para o bom velhinho, afinal ainda é dia de Natal.- ele disse quando abri a porta um pouco mais e ele entrou.
- Como soube que eu estava de volta?- quis saber e ele respondeu:
- Estou na casa da minha tia, saí para caminhar e vi as luzes acesas, e como o segurança me conhece, ele me deixou entrar. Achei que você deveria estar com fome.- e me esticou uma sacola de papel de onde saía um aroma incrivel.
- Obrigada, estou mesmo com fome.- ajeitei o cabelo e comecei a me virar para colocar a sacola na cozinha, quando ele segurou a minha mão, me impedindo de sair.Nossos dedos se entrelaçaram, e começamos a nos virar um para o outro, mal ouvi o barulho quando a sacola caiu no chão, enquanto era envolvida por seus braços e sua boca procurava a minha.

o-o-o-o-o-o-o

Estava dormindo quando senti que era observada. Abri os olhos devagar e deparei com Mitchell me encarando, olhei-o de forma aparvalhada por alguns segundos, mas abaixei os olhos, sentindo que ficava vermelha, comecei a me levantar mas ele me segurou:
- Você está bem?? Está arrependida? perguntou e notei que ele estava realmente preocupado, sorri e disse:
- Estou bem e não estou arrependida. E você está bem?- e ele após se esticar na cama, assentiu. Fu tomar banho e quando saí, o quarto estava vazio. Fiquei decepcionada, mas o que eu poderia fazer? Não haviamos conversado e nem dito nada. Desci para a cozinha e para minha surpresa, encontrei Mitchell com os cabelos molhados, abrindo uma caixa de suco de laranja e havia posto a mesa para um jantar.
- Tomei banho no quarto de hóspedes, e como estou faminto e não sou capaz de jogar fora a comida que meu primo faz, optei por esquenta-la para o café da manhã. Tudo bem para você?
Assenti e depois que me sentei, ele serviu duas porções generosas de uma comida muito saborosa e após umas boas garfadas, eu disse:
- O que vamos fazer agora?- Mitchell me olhou e respondeu após tomar um bom gole de suco de laranja.
- Vamos sair para comprar uma cama maior, me recuso a dormir na casa da minha namorada em uma cama de solteiro. Quase cai no chão, durante a noite umas duas vezes. Olhei-o divertida:
- Ah é? E depois de comprar a tal cama, vai fazer o quê? Esvaziar um lado do guarda roupa e ditar aos empregados as suas preferências? Ainda não ouvi nenhuma pergunta importante aqui...- e ele riu, se levantando da mesa e virou a minha cadeira de frente pra ele e me olhou sério:
- Estou totalmente apaixonado por você, e quero que seja a minha namorada, você quer, Leonora?- levantei de um pulo derrubando a cadeira, e o abracei rindo:
- Sim, é claro que sim.- começamos a nos beijar, e as coisas foram ficando animadas, até que parei de beijá-lo e sussurrei em seu ouvido:
- Mitchell...Somos bruxos, não precisamos sair para comprar uma cama maior...- e ele gargalhou, enquanto subíamos as escadas para o quarto correndo.
- Estão prontos? – Georgia se aproximou de Ozzy e Parvati nos bastidores – Robbie está terminando seu solo, vocês entram em seguida.

Ambos assentiram e ela sorriu animada, os deixando sozinhos outra vez. Quando Robbie encerrou sua apresentação e agradeceu ao público, caminhou para trás do piano e deu a introdução da música que eles iam cantar. Os dois entraram no palco e enquanto interpretavam a canção, era inegável a química que existia entre eles. Embora eles não conseguissem enxergar ou admitir, ela estava lá. Deixaram o palco sob muitos aplausos e deram a vez a Finn.

Todas as apresentações foram um sucesso. Apesar do nervosismo de se apresentar pela primeira vez para um público daquele tamanho, todos se saíram bem e houveram ainda alguns pedidos de bis. Depois de brindar o sucesso nos bastidores com seus alunos, Georgia os liberou para aproveitarem o resto da festa e depois irem para suas casas para as festas de fim de ano. O clima entre Lucian e Lenneth durante o dueto era o mais romântico possível, mas depois as coisas ficaram estranhas, então assim que foram liberados Alec puxou Lucian para longe da multidão, enquanto Julie levava Lenneth para o lado oposto.

- Tenho que confessar que não achei que fosse ser tão divertido – Ozzy admitiu encostando-se em uma mesa com Oleg, Leo e Parvati.
- Eu também não estava botando muita fé nisso, mas gostei bastante – Oleg concordou se servindo de um whisky de fogo que o garçom carregava.
- Desculpa interromper o papo - Mitchell parou ao lado deles e pegou a mão de Leo – Podemos conversar um instante? – e ela assentiu, lançando um olhar rápido na direção de Parvati antes de se afastar com o garoto. Oleg inventou uma desculpa qualquer e saiu na direção oposta logo depois.
- Você se saiu muito bem, parecia bem à vontade no palco – Parvati comentou quando os dois ficaram sozinhos.
- Estava um pouco nervoso quando entrei, mas aquilo parecia tão natural pra você que acabei relaxando.
- Que bom, porque ainda vamos fazer muito disso até o fim do ano.
- E eu vou estar em cada uma das apresentações – Parvati ouviu a voz familiar e se virou espantada.
- Lukas! – ela não esperava ver o namorado ali e ficou sem reação por alguns segundos antes de abraçá-lo – Por que não disse que viria?
- Quis fazer uma surpresa. Você estava ótima – disse orgulhoso e segurou seu rosto, lhe dando um beijo apaixonado – Merlin, como senti falta disso.
- Também senti sua falta.
- Lusth – ele se virou para Ozzy com a mão estendida, que ainda estava parado na mesa se sentindo desconfortável.
- Hölzenben – ele apertou sua mão, cordial – Como anda a vida de centro reserva profissional?
- Não tenho do que reclamar. Como disse a Parv da última vez que nos falamos, estou vivendo um sonho que não sabia que tinha.
- Que bom que está gostando. Sou um grande fã do Vancouver Canucks, assisti a seu último jogo pela TV no vilarejo. O gol que fez em cima do Blackhawks foi sensacional, o goleiro ainda deve estar sentindo o gosto do disco.
- Foi um jogo e tanto mesmo. Olha, sei que nunca tivemos um bom relacionamento, mas Parvati diz que você a ajudou muito depois de tudo que aconteceu e qualquer um que tenha feito algo de bom a garota que eu amo merece o meu respeito – ele estendeu a mão outra vez e Ozzy a apertou – Podemos apagar o passado?
- Já nem lembro mais dele.
- Ótimo. E se é mesmo fã do Canucks, quando tiver uma folga dos estudos, ligue e coloco você no melhor lugar do estádio para assistir ao jogo.
- Vou ligar, pode ter certeza. Preciso ir agora, Lucian não está muito bem e vou levá-lo para casa. Feliz Natal – e apertou a mão de Lukas outra vez – Aproveite sua nova vida, está vivendo o meu sonho – e Lukas sorriu, sem imaginar o quanto aquelas palavras eram verdadeiras.
– Feliz Natal – Parvati o abraçou, algo que nunca haviam feito antes. Foi um abraço estranho – Nos vemos no casamento da Kat.

Ele se afastou do casal e deu uma última olhada antes de descer para o primeiro andar da casa de shows. Lukas havia puxado-a para um abraço e beijava sua testa, mas seu olhar ainda estava em Ozzy. Era um olhar triste e ele sabia o motivo. Abaixou a cabeça e desceu as escadas, triste também.

ºººººº
25 de dezembro de 2015


- Pois não? – a voz no interfone ecoou na rua silenciosa.
- Oi, boa noite. Estou procurando Edgar e Oscar Lusth, eles estão? – Parvati respondeu, tentando equilibrar as duas caixas que segurava enquanto mantinha o casaco nos ombros – É Parvati Karev quem fala.
- Sim, reconheci-a pelo monitor – e o homem na pequena tela em sua frente sorriu – Eles estão em uma festa de Natal em família, muita gente lá dentro. Não posso sair daqui, mas se não se incomodar de procurá-los sozinha, pode entrar.
- Eu os encontro, obrigada. Feliz Natal.
- Feliz Natal – ele deu outro sorriso simpático e o portão automático abriu.

O portão por si só já era intimidador, alto, negro e com um enorme L dos Lusth desenhado no meio, mas a casa era ainda pior. Não, não era uma casa. Definitivamente era uma mansão, Parvati pensou. Uma mansão vitoriana do século 17 que lembrava muito as repúblicas de Durmstrang, mas era dez vezes maior. Suas paredes eram de tijolo em um tom de bege, com colunas de madeira por todo lado em verde, todas muito bem trabalhadas com o símbolo da família. O telhado era de telhas verde água e lilás e as janelas eram quase todas ovais, com entalhes tão lindos que ela demorou mais que o normal percorrendo o caminho de pedras admirando-as. Os quartos não tinham varanda, exceto o do último andar, que ela sabia ser o quarto de Ozzy pelo que Jack havia dito.

- Está perdida, senhorita? – um elfo doméstico apareceu do seu lado e a tirou do transe. Seus grandes olhos negros piscavam amigáveis e ela sorriu.
- Não, só estava admirando. É muito bonita.
- Sim, o mestre tem uma bela mansão. É preciso muitos elfos como Elvis para mantê-la limpa, mas é um prazer trabalhar para a família Lusth.
- Você é um elfo livre? – perguntou, mas imediatamente se arrependeu. Sabia que muitos elfos eram livres, mas o que não eram ainda se ofendiam com a hipótese.
- Ah sim, Elvis é um elfo livre. Todos os elfos que trabalham aqui são livres, mestre Ilana não gosta de trabalho escravo – disse orgulhoso, fazendo Parvati sorrir.
- Estou procurando Edgar e Oscar, sabe onde posso encontrá-los?
- Mestre Edgar está logo ali – ele apontou para um banco na varanda da casa – Mestre Oscar está com os primos, vou procurá-lo para a senhorita.
- Obrigada, Elvis.

O elfo entrou na casa apressado e Parvati se aproximou da varanda onde Edgar estava sentado sozinho. Estava todo enrolado em cachecóis e as grossas luvas que protegiam suas mãos estavam cobertas de neve. As crianças que corriam pelo jardim atirando bolas de neve uma nas outras indicavam que, minutos antes, ele fazia parte da brincadeira. Ela se aproximou e sentou ao seu lado, e só então ele levantou a cabeça para encarar quem o fazia companhia.

- Oi. Está perdida? – perguntou sem ânimo.
- Não, estava procurando você – ela esticou uma das caixas que tinha na mão, a de madeira, para ele – Vim lhe trazer isso.
- O que é? – ele pegou a caixa mesmo que desconfiado.
- Não sei. Alexis... – sua voz morreu ao dizer o nome da irmã – Alexis queria que ficasse com isso.
- Ela também falou com você no Halloween – não foi uma pergunta, mas ela assentiu assim mesmo – Sinto sua falta. Tudo que ela queria era que você e meu irmão entendessem que nunca fizemos parte dessa guerra e nos gostávamos de verdade. Ainda gosto, na verdade. É como se ela ainda estivesse aqui, não consigo esquecer o que sinto.
- Eu sei, e eu sinto muito que tenhamos envolvido vocês nisso tudo. Sei o quanto minha irmã gostava de você e queria poder consertar as coisas, mas é tarde demais.
- Meu avô diz que nunca é tarde demais para reconhecer seus erros.
- Então nesse caso, pode me perdoar pelos meus? – ele a encarou com um olhar triste e distante, mas assentiu.
- Era o que Alexis queria, que todos nos déssemos bem – ele olhou para a caixa no colo e abriu a tampa. Tinham muitas coisas dentro, mas a única que Parvati reconheceu foi um álbum de fotos. Edgar o abriu e um sorriso se espalhou em seu rosto. O primeiro desde o acidente – Nossas fotos de infância. Como o Lawyfer era baixinho quando criança.
- Está incompleto – ela observou à medida que ele virara as páginas – Acho que ela quer que você o termine.
- Obrigado – ele fechou o álbum e a abraçou antes de levantar e entrar na casa.
- Sabia que essa foi a primeira vez que Eddie sorriu, desde que sua irmã e Jack morreram? – ela ouviu a voz de Ozzy e virou para vê-lo parado ao lado da porta por onde o irmão tinha acabado de passar, com uma caneca soltando fumaça em uma das mãos – Não ouvi toda a conversa, mas obrigado.

Ele se aproximou do banco e ela ficou de pé, parada de frente para ele. Quando se despediram depois do show, Parvati sabia que ele estava chateado por causa da conversa com seu namorado. Lukas não sabia a verdade e estava sendo legal, a culpa era dela. E embora soubesse que nada que fizesse repararia o dado causado por aquela atitude que teve, não podia simplesmente fingir que nada aconteceu.

- Não vim só para falar com seu irmão, vim para lhe pedir desculpas.
- Desculpa pelo que?
- Pela vaga que era sua e dei a Lukas – ele abaixou a cabeça e soltou uma risada forçada – Vi que ficou chateado no sábado e tem todo o direito.
- Parvati, pare – ele a encarou sério – Não vamos fazer isso.
- Mas eu preciso me desculpar com você.
- Está bem, já se desculpou, não precisa dizer mais nada. Está tudo bem, é sério. Eu quero ser auror, não ia poder jogar profissionalmente. Estou feliz que alguém bom como Lukas está no meu lugar.
- Posso ao menos terminar de falar? Não vou me estender, mas ensaiei pra isso e não quero que tenha sido em vão. Prometo não tocar mais no assunto.
- Você não vai deixar pra lá se eu disser não, não é? – ela fez que não com a cabeça e ele riu – Está certo, fale.
- O que eu fiz foi errado, sei disso, mas não posso voltar atrás e desfazer. Acredite, se pudesse já teria feito isso e mudado muitas coisas, mas não é possível. Sei também que nada que eu faça vai compensar isso, mas ainda assim posso fazer o que está ao meu alcance para ao menos tentar – ela estendeu a outra caixa que havia trazido a ele – Feliz Natal.
- Você comprou um presente?
- Abra logo.

Ele largou o eggnogg que tinha na mão e desfez o laço na caixa, tirando a tampa. Seus olhos se arregalaram e a caixa foi ao chão quando ele pôs as mãos em seu conteúdo. Uma camisa do Vancouver Canucks estava esticada em suas mãos, com o autógrafo de todos os jogadores do time de Hóquei. Ozzy passou quase um minuto encarando a camisa em silêncio, então puxou Parvati para um abraço entusiasmado e em seguida segurou seu rosto, a beijando rápido. Só percebeu o que tinha feito quando a soltou e ela tinha a mesma expressão espantada que a dele quando viu o presente.

- Merlin, desculpa! – se apressou em dizer, sentindo o rosto esquentar. O dela já estava da cor de um tomate – Mil desculpas! Não estava pensando direito, foi a empolgação. Teria beijado até o diretor Ivanovich se ele me desse um presente desses.
- Agora você me ofendeu.
- Ok, um pouco exagerado, mas você entendeu. Desculpe.
- Tudo bem, sem problemas. Posso assumir então que gostou do presente?
- Se eu gostei? Digo até que isso compensa sim ter perdido a vaga.
- Fico feliz que tenha gostado. Pedi a Lukas que me ajudasse com isso e ele nem hesitou.
- Tenho uma coisa para você também – ele guardou a camisa na caixa – Vamos lá dentro, está na árvore.
- Se não se importa, prefiro esperar aqui. A casa está muito cheia e bebi um pouco em casa, não estou em condições de me concentrar.
- Certo, sem problemas. Volto logo.

Ele entrou outra vez e Parvati se viu sozinha na varanda. A bagunça no jardim continuava, a guerra de bolas de neve cada vez mais intensa. Não pode evitar pensar que, muito provavelmente, todas aquelas crianças nunca morreriam. Como devia ser saber que é imortal desde o dia em que nasceu? Não ter a opção de escolher e simplesmente aceitar aquele destino como se fosse a coisa mais normal do mundo? Uma delas subiu a varanda correndo e se escondeu atrás dela, não devia ter mais que seis anos. Quando uma bola de neve destinada ao menino a acertou em cheio, ele sorriu pedindo desculpas e pulou a grade, fugindo para os fundos do jardim.

- Foi pega pela guerra? – Ozzy estava de volta com uma caixa pequena na mão e riu, apontando para seu casaco sujo de neve.
- Servi de escudo para um deles, acabou de pular a grade e fugir.
- Tommem. Ele sempre faz isso – ele esticou a caixa a ela e sorriu – Feliz Natal.
- Uma caixa pequena assim... Devo ficar preocupada?
- Eu beijei você num impulso, mas não sou louco. Não é nada demais, na verdade.
- Ozzy... – ela abriu a caixa e tirou uma pulseira dourada com um pingente pendurado.
- Existe uma tradição, um pouco idiota até, que é fazermos uma tatuagem em homenagem a nossa imortalidade no dia do ritual. Não acho que vou conseguir convencê-la a fazer parte disso, então a pulseira é para que saiba que é uma de nós, é parte da família. Esse símbolo é um-
- Uróboro. O símbolo da Imortalidade.
- Exato.
- É lindo. Obrigada.

Ele a ajudou a prender a pulseira e Parvati a admirou em seu pulso, um sorriso sincero no rosto. Ficaram de frente um para o outro sorrindo, sem dizerem nada, por um longo tempo, até que o clima começou a ficar desconfortável e Parvati quebrou o silêncio.

- Preciso voltar, disse a meu pai que sairia só por meia hora. Não quero que fique preocupado.
- Quer que a leve pra casa? Sei que não fez seu teste de aparatação ainda.
- Não precisa, o motorista me trouxe aqui, está esperando lá fora – ela o abraçou outra vez, o mesmo abraço desconfortável de uma semana atrás – Obrigada pelo presente.
- Obrigado pelo meu também, foi o melhor que recebi acho que da vida inteira.

Eles quebraram o contato depressa e Ozzy ficou observando Parvati descer a estrada de pedras que levava aos portões da mansão. Só quando já não podia mais vê-la entrou em casa. Parou no meio da sala e tirou a camisa que havia ganhado da caixa, sacudindo para que seus primos a vissem. Uma roda se formou ao seu redor no mesmo instante, e enquanto se gabava do presente para eles, já pensava em acordar cedo na manhã seguinte para mandar colocá-la em uma moldura de vidro e pendurar na parede do quarto.


I really can't stay - Baby, it's cold outside
I've got to go away - Baby, it's cold out there
This evening has been - Been hoping that you'd drop in
So very nice - I'll hold your hands, they're just like ice

Baby It’s Cold Outside – Casey Abrams & Haley Reinhart version