Thursday, December 27, 2007

- Por aqui, Ninys! Feche os olhos...- disse Michael, apoiando gentilmente as mãos sobre os ombros de Nina para tapar seus olhos.
- Me obrigue – cortou Nina, empurrando os braços do garoto para longe – Para onde nós vamos?

Nina mexeu no cabelo, impaciente. Tentou evitar ao máximo que o encontro prometido realmente acontecesse. Porém, quando começou a se trancar em armários de vassoura toda vez que Michael passava pelo corredor, percebeu que havia chegado longe demais. Depois da data marcada, encarou uma semana de zoações de Evie, Milla e Vina e agora se sentia extremamente desconfortável. Michael parava diversas vezes no meio de uma frase e ficava encarando a menina, abobado.

- MICHAEL?! – Nina gritou, estalando os dedos na frente dos olhos do garoto – Para onde nós vamos?
- Eu fiz reserva para nós dois em um lugarzinho lindo – respondeu, como quem acorda de um coma profundo – Sugestão do Chris. É impressionante como nós estamos ficando próximos, sempre sonhei com isso!
- Por Merlin – disse Nina, cerrando os punhos com toda força – Michael, o Parker te enganou. Não tem nenhum lugar decente por aqui...

Uma casinha rosa surgiu no meio das árvores. Tinha uma chaminé de tijolos em formato de coração e tossia uma fumaça quente, vermelha.

- ...a não ser o Ivy&Leo...mas você não espera que eu entre aí...certo?
- Ahá! Deve ser esse. Que lugarzinho fofo, bem que o Chris falou que era tão doce e delicado como você...
- Eu não vou entrar aí! Isso é um motel disfarçado de restaurante! Não...não...NÃO! – gritou, quando Michael tentou puxar seu braço delicadamente.
- Eu liguei para eles para fazer a reserva! É um lugar fantástico...acredita que a fila de espera para conseguir uma mesa nele é de cinco meses?
- ...então eu acho que isso significa que o encontro está cancelado...
- Mas eu consegui dar um jeito...
- ...é até bom, porque eu precisava terminar meu pergaminho de poções mesmo...
- ...tive que pagar 60 galeões...
- AH?! – Nina congelou por alguns segundos, encarando o menino absolutamente chocada – Poxa...que pena, né? Eu te compro um sorvete no caminho.
- Não, Ninys, por favor! Eu tive que gastar economias de um ano para conseguir uma mesa...vai valer a pena, por favor!
- Ah não, não, Michael...por favor digo eu! Esse lugar é...er...abafado! – Nina falava encarando o chão para não capturar um relance dos olhos marejados do menino – Não acredito nisso...ok, ok, mas só por meia hora, tudo bem?
- Obrigada, Ninys! Você não vai se arrepender!
- Pouco. Não vou me arrepender pouco – sussurrou para si mesma.

O Ivy&Leo pertencia a um simpático casal de velhinhos ingleses que se mudou para a Bulgária há oito anos. Inspirado no Madame Puddiffoot, seu restaurante era completamente decorado de rosa e vermelho, com direito a fadinhas, anjinhos, confete e casais apaixonados, que não faziam parte da decoração, mas eram quase figuras permanentes. Nina tremeu da cabeça aos pés quando pisou no lugar e foi recebida por fadinhas cor de rosa. Mike contemplava o local com o queixo caído.

- Vale cada galeão...
- Meef...- Nina tentou balbuciar alguma coisa, mas parecia estar assistindo a um filme de terror.
- Vem, aquela é a nossa mesa. – Mike conduziu a menina até uma mesa no fundo, decorada com azevinhos e mais fadas. Nina sacudia os braços freneticamente para espantar as criaturas de seu rosto – Pronto...ah, senhora? Obrigada. Eu vou querer uma cerveja amantegada. E você, Ninys?
- O que a senhora tiver de mais forte... – respondeu Nina, ainda tentando dizimar as fadas como mosquitos.
- Ah, Nin...- os olhos de Michael voltaram o foco para a menina, com um brilho assustador – Olha! Azevinho...duas pessoas embaixo de azevinho, você sabe o que isso quer dizer?

Nina limitou-se esticar o braço e esmagar lentamente o azevinho com as mãos, sem tirar o olhar fulminante de Michael.

- Er...eles estavam me incomodando, de qualquer maneira – disse o menino, mordendo os lábios – Mas então...do que você quer falar?

A menina tinha uma boa resposta na ponta da língua, mas quando iria começar seu monólogo, o sininho da porta tocou, indicando que mais um casal havia chegado. Uma menina loira, com uma expressão tão confusa quanto a de Nina, deu dois passos para trás ao ser recebida pelas fadas. Seu acompanhante era um garoto mais ao menos da altura de Michael, com os olhos de Michael, cabelo de Michael e um sorriso cínico nos lábios.

- Eu...não...acredito – Nina ressaltou cada sílaba com tamanho ódio que fez as fadas desistirem de vez de animar o casal – O que o seu irmão está fazendo aqui?
- Onde? Ah, o Chris veio! Em troca dos diversos favores, eu consegui uma reserva para ele também. Bonita menina, mas não tanto quanto você – respondeu, porém Nina já não estava mais prestando atenção. Se esticava para enxergar o rosto da garota loira, quando pareceu ter levado um choque da cadeira.
- Georgia?! – engasgou com a palavra e escorregou no banco até ficar invisível. Georgia também parecia prestes a cavar um buraco e enterrar a cabeça. Girava os olhos de um lado para outro, tentando localizar algum conhecido. Chris parecia imensamente satisfeito. – Dessa vez...dessa vez...! – os resquícios de azevinho na mão de Nina estavam sendo triturados.
- O que aconteceu? O que tem a garota?!
- “O que tem a garota?!” – repetiu Nina, com uma voz esganiçada que nem de longe lembrava a de Michael. – É só a garota mais...mais...ridícula e idiota e estúpida e... de toda Durmstrang! – Nina agora cravava as unhas na madeira da mesa – Ai, Merlin, ela está olhando para cá! – exclamou Nina, quase de joelhos no chão do Ivy&Leo.
- E qual é o problema? Ah, as nossas bebidas! Aqui, aqui, senhora! – Michael sacudia os braços no ar, atraindo a atenção de metade do restaurante. Chris fingiu um olhar de surpresa e convidou Georgia a se levantar e ir até a mesa do irmão.
- Michael! Que surpresa agradável...e quem seria a sua acompanhante escondida debaixo da mesa? – perguntou Chris, com um sorriso de orelha a orelha. – Ah, Olenova. – Nina foi surgindo lentamente, sentindo o rosto pegar fogo.
- Eu estava procurando a minha...er...lente – respondeu Nina, apontando para algo invisível na palma da mão.
- Já te apresentei a minha amiga? Essa é a Gretchen. Gretchen, Olenova. – Georgia franziu a testa absolutamente revoltada e soltou a mão de Chris.
- É Georgia!
- Tanto faz. Já conhece, Olenova? – perguntou Chris, sem desviar o olhar de Nina.
- Eu não sei onde eu estava com a cabeça quando aceitei vir aqui com você...e eu já conheço a Nina. – disse a menina, afastando as mechas loiras do rosto com violência.
- Muito infelizmente, diga-se de passagem – respondeu Nina, levantando da mesa e encarando a garota. Precisava descontar a raiva em alguém. Georgia não se intimidou e deu um passo a frente. – Que patético, Georgia. A garota mais popular da escola aceitando convites do Parker?! Tempos decadentes...
- Decadentes mesmo. É duro sair com uma pessoa exatamente idêntica ao namorado de alguém como você!

Michael parecia assistir a uma partida de tênis e Chris filmava mentalmente o confronto, encantado. A senhora, que deveria se chamar Ivy, saiu apressada da cozinha para tentar acabar com a confusão.

- Meus queridos, os ânimos parecem estar exaltados...
- Não tem ninguém exaltado aqui, minha senhora! – disse Georgia, praticamente gritando – Para falar a verdade, eu já estou de saída! – pegou a bolsa, lançou um último olhar de desprezo para Chris e bateu a porta com tanta força que as fadas soltaram gritinhos.
- E eu também, não vou participar do seu espetáculo patético! – falou Nina, apontando as garras para Chris. Michael ainda estava mudo, ao lado da senhora Ivy.
- Mas não foi você que dizia ter taaanto interesse no meu irmão? Pois eu te entrego tudo de bandeja e você se esconde debaixo da mesa, Olenova? Assim fica complicado – disse Chris, ficando de pé para chamar a atenção da menina. Ainda tinha um tom cínico na voz, mas estava sério.
- Você...é...patético. Você e toda a sua ceninha ridícula! Ótima pesquisa, eu realmente não gosto da Georgia. Mas acho que ainda tenho mais pena dela do que de você! – respondeu Nina, voltando dois passos, as mãos tremendo.
- Er...queridos...por que todos não resolvemos isso com uma boa xícara de chá fumegante? – disse a senhora Ivy, parando na metade da frase ao encontrar o olhar assassino de Nina.
- Eu realmente sinto muito por toda a confusão, senhora Ivy. Tome, – tirou 10 galeões do bolso – depois eu pago o resto do seu prejuízo. – começou a caminhar em direção a porta, mas ainda foi surpreendida pela última provocação de Chris.
- Pelo menos o meu encontro foi melhor do que o seu. – disse, com uma expressão desafiadora, tentando testar os limites da garota. O restaurante inteiro havia parado e o senhor Leo segurava o braço da esposa para que ela não interrompesse. Nina sentia o olhos arderem e o rosto pegar fogo. Caminhou a passos longos em direção a Chris, o empurrou para o lado e beijou Michael. A cabeça girava, mas simplesmente ignorou a voz descontrolada que gritava dentro dela e focou a atenção no olhar genuinamente surpreso do outro gêmeo. Puxou a bolsa, engoliu seco e bateu com violência a porta do Ivy&Leo, deixando um Chris com a certeza de que tinha passado dos limites.

Wednesday, December 26, 2007

Das memórias de Ty McGregor

O natal em família, apesar da falta que meu pai faz, foi muito divertido. Os pais de tia Megan que são trouxas, estiveram conosco e tanto eles quanto Ethan, o garoto que minha mãe e Logan querem adotar ficavam estarrecidos em ver as coisas acontecerem magicamente em nossa casa. Vovó mostrou os elfos domésticos que cuidam de nós aqui e era engraçado ver a alegria de Ethan quando um deles aparecia atrás dele com alguma guloseima. Ele olhava maravilhado para as fadinhas pulando de galho em galho na enorme árvore de Natal e foi muito engraçado vê-lo pular assustado quando a rede de Flú foi ligada para que tio Sergei, tia Yulli e Miyako viessem nos dar um abraço.
Meus tios, não estavam aceitando a presença de Logan muito bem. Apesar de eles o conhecerem há anos, ainda se ressentiam com o fato de minha mãe estar se casando poucos meses após a morte de meu pai, mas não falavam nada diretamente a ele, tudo era na base das indiretas, ou gestos.

- Não sente nesta cadeira Logan, era de Kyle...
- Kyle adorava comer manjar turco lembra??
- Você não gosta de doces?Kyle adorava.
- E quando Kyle arrumou briga naquele bar em Glasgow com aquele motoqueiro enorme, só porque ele chamou a Alex de gatinha?
-Sim, ele era o melhor... Não que você não seja bom cowboy...

Quando minha mãe se aproximava meus tios disfarçavam e não citavam meu pai ou faziam algum comentário depreciativo, e tio Logan agüentava tudo calado. Riven comentou depois de ouvir umas destas pérolas:
- Eles estão sendo cruéis. Mamãe ontem fez meu pai dormir na biblioteca por isso, mas não adiantou.
- Se o Logan não agüentar a pressão não serve para casar com nossa tia. - disse Declan categórico, e John deu-lhe um soco no braço dizendo:
- Deixa de ser baba ovo de tia, garoto. O cara esperou por ela a vida toda, agora que ela tá livre, vai desistir? Desculpe Ty.- disse meio sem jeito.
- Tudo bem. Eu já teria socado os pais de vocês. Tenho que admirar o auto controle de tio Logan. - respondi e olhei para o local onde Mary, junto com Brian e Brianna ensinavam Ethan a jogar snap explosivo.
Sorri. O garoto parecia se adaptar bem a nós, e às vezes eu o pegava olhando com admiração para minha mãe ou para as coisas ao nosso redor, como se estivesse no meio de um sonho. Voltei a prestar atenção à conversa:
- ...Tão provocando de propósito, querem ver com quem ele estoura primeiro. E depois nós é que somos crianças. - disse Chloe, a mais calada das meninas, enquanto lia seu novo livro de Runas.
- Aposto que se o Logan partir pra briga, ele ganha. Ele é frio. – disse pegando uma moeda do bolso e jogando para John, enquanto ele anotava nossos nomes.
- Eu aposto que vovó, acaba com tudo rapidamente. – disse Amber, e deu seu dinheiro. Meus primos reviraram os seus bolsos, fazendo as apostas e Sophia foi a última e disse:
- Pois eu aposto que se uma briga começar, tia Alex detona todos eles. – rimos.
Vimos quando minha mãe abriu os pergaminhos com as anotações sobre o casamento e ia dizendo, enquanto riscava as tarefas:
- Wayne vai cuidar das chaves de portal dos amigos do Brasil, Alucard vai cuidar dos amigos de Londres... Sergei já programou a deles. Hanna pegará meu buquê... Já peguei o vestido... Preciso mandar a ordem de pagamento para o florista e os músicos ficaram a cargo de Annabeth...
- Os garotos podem ficar recebendo as pessoas, assim ficam longe de confusão. – sugeriu tia Megan e mamãe concordou e anotou no pergaminho. Vovó completava a lista de comidas e bebidas que a mãe de tio Logan enviou via coruja urgente e ditava ordens para Buttler, o elfo encarregado da cozinha.
- Deixe que eu envio as ordens de pagamento Alex, é só passar a lista. – disse tio Logan prestativo.
-É tradição a família da noiva bancar a festa...- começou vovó, mas parou ao ver a cara séria de Logan.
- Não quero que você mexa em seu dinheiro. É seu e de Ty, eu pago tudo. – ele explicou.
- Alex sempre dividiu as contas com Kyle. Não sei por que mudaria agora... – disse tio Kieran, o pai de Amber, e isso inflamou tio Logan, fazendo com que respondesse ríspido:
- Não sou o Kyle. Eu pagarei as despesas que minha mulher fizer para o nosso casamento.
- Está dizendo que meu irmão não pagava as contas da mulher dele?- perguntou tio Dylan que estava jogando poker com tio Ian, tio Leonardo e tio Jack.
- Não me interessa o que Kyle fazia antes, agora eu serei o marido da Alex e vou pagar as contas. - E todos eles ficaram de pé ao mesmo tempo, aquilo cheirava a briga.
Mary empurrou os mais novos para um lugar mais seguro e eu, John e Declan nos aproximamos para segurá-los caso fossem às vias de fato, e eles começaram a se encarar. Mamãe ficou na frente deles e disse irritada:
- O que esta havendo aqui? Não vão dizer? Onde foi parar a valentia de agora a pouco?
- Eles têm provocado Logan, comparando-o ao Kyle, há dias Alex. – respondeu tia Patrícia quando entrou na sala segurando o pequeno Kayan no colo, e recebeu um olhar dardejante de tio Dylan, que ela ignorou.
- Vocês não têm vergonha em magoar alguém que não fez nada a vocês? – pela segunda vez naquela semana vi os olhos de minha mãe brilharem com lágrimas que ela segurava, e meus tios ao verem aquilo começaram a ficar embaraçados e tio Logan a olhava sem saber o que fazer.
- Estranho... O normal seria sua mãe dar uns gritos com eles... e não ficar “sensível”.- comentou Declan e eu balancei a cabeça pasmo. Mamãe tava tão... ’Mulherzinha’.
Ethan parecia procurar algum lugar para se esconder e se acalmou quando Brianna segurou a mão dele. Olhei firme para ele e pensei que tudo ficaria bem. Ele olhou nos meus olhos e pareceu entender isso. Será que meu novo irmão já sabia legilimência? E o que mais ele saberia fazer?
Vovó levantou-se e resolveu o problema:
- Meu filho, embora não demonstrasse, sempre admirou a amizade que Logan dedicou a Alex e à nossa família, e se ele estivesse aqui iria mandar vocês pastarem por agirem xomo crianças birrentas, rejeitando um colega novo. – olhava duro para cada um deles e era muito legal ver os coroas levarem bronca da vovó.
- Que falta faz uma filmadora agora... - sussurrou John e concordamos com ele, enquanto ela voltasse a dar bronca.
- Alex sempre apoiou cada membro desta família em todos os momentos e agora vocês retribuem com esta palhaçada? Logan não é o Kyle, mas uma coisa que ele tem em comum com meu filho é o amor incondicional por Alexandra e Ty, e isso para mim é o suficiente para recebê-lo de braços abertos na família. Minha vontade é dar-lhes um bom puxão de orelhas. - e acabaram sorrindo quando tio Ian protegeu as dele. Cada um deles ficou mexendo os pés sem graça e tio Leo, pigarreou e disse:
- Gostaria de conhecer aqueles cavalos que você cria Logan, dizem que são rápidos... - e olhou para os outros, os incentivando.
- Já pensou na lua de mel? Nós podemos ajudá-lo a escolher um bom lugar, pode ser o nosso presente de boas vindas à família. - disse tio Jack e os outros concordaram.
Tio Logan aproximou-se de minha mãe e perguntou, segurando seu rosto:
- Tudo bem amor?- e notei que ele não se referia aos oferecimentos de meus tios.
Ela sorriu e disse:
- Gostaria de dividir ok? Famílias dividem tudo. - e depois de pensar um pouco, ele sorriu concordando com ela. E virou-se para mim:
- Ty, já que a festa é no rancho, você poderia convidar seus amigos da escola, talvez eles apreciem escapar do frio. E se quiserem podem passar a semana lá, depois os mandamos de volta juntos, o que acha?
- Vai ser ótimo. Vou escrever para todos agora.
Subi ao meu quarto para escrever quantos pergaminhos pudesse e meus primos foram buscar suas corujas, estavam muito animados. Quando desci, vi Amber receber o dinheiro ganho com a aposta. Ela foi a única que lembrou do gênio forte de nossa avó.

Tuesday, December 25, 2007

A casa de Jeravna estava exatamente do jeito que Evie lembrava, quando a viu pela última vez há dois anos. Os mesmos móveis, os mesmos ruídos que toda casa antiga carregava e a mesma atmosfera acolhedora, que a fazia sentir-se em casa. Casa. Estranha a definição dessa palavra. Casa para ela era onde a pessoa se sentia bem, protegida e bem vinda. E o único lugar que a fazia se sentir assim era ali, e não junto de seu pai. Foi logo atirando a bolsa na mesa e correndo para abraçar as três mulheres que a encaravam sorrindo ternamente na sala. Um abraço longo, que terminou apenas quando uma delas, a loira, lembrou que tinham mais uma visita no cômodo.

‘Evie, apresente seu amigo’ Disse sorrindo encarando Micah

‘Desculpe’ Respondeu parando ao lado dele ‘Esse é o Micah, um amigo de Durmstrang. Micah, essas são Nicole, Vivian e Teresa’ Ela fez uma pausa e riu antes de terminar ‘Minhas mães’

‘Não meu bebê, por favor. Mamãe não gosta de ser chamada pelo nome’ A morena chamada Teresa alisou o cabelo de Evie em tom de brincadeira ‘É Tessa, Nicki e Vivi’

‘Muito prazer, Micah’ A ruiva chamada Vivian estendeu a mão a ele, com um sorriso estranho no rosto. Como se ela visse algo que mais ninguém pudesse ver ‘Obrigada por trazer a Evie até aqui. Espero que fique conosco pelo resto das férias também’

‘Sabíamos que viria, meu amor’ Nicki explicou quando ela se mostrou surpresa por elas estarem a esperando ‘Quando não a vimos no velório de sua avó, imaginamos que estaria a caminho daqui e voltamos, nem esperamos o enterro’

‘Seu quarto está pronto já, mas não temos uma cama extra nele’ Vivi acrescentou ‘Mas nada que um rápido aceno de varinha não resolva!’

‘Vou enviar uma coruja à sua tia Madalena. Ela pediu que a avisássemos quando você chegasse. Ela e Sofia estavam preocupadas com a sua ausência’

‘E Nicki e eu vamos providenciar a cama extra, voltamos logo e aí sentaremos para conversar’ Vivi empurrou Nicki para fora da sala, deixando os dois a sós

‘Evi, não sei se devo ficar’ Micah falou sem jeito ‘Acho melhor voltar pra Durmstrang, não vou me sentir a vontade’

‘Por favor, não vai’ Ela segurou sua mão num impulso ‘Amo as três mais que tudo e sei que posso contar com elas sempre que precisar, mas no momento o que eu preciso é de um amigo comigo’

‘Tudo bem, eu fico’ Respondeu depois de alguns segundos, sorrindo de leve ‘Mas tenho que mandar uma coruja pros baixinhos, eles não sabem que saímos’

‘Também vou escrever para as meninas contando que estamos aqui e o que aconteceu’

‘Elas vão colocar cama extra no seu quarto?’ Micah perguntou rindo maroto

‘Sim. Espero que não ronque’ Respondeu brincando

‘Essa devia ser a menor das suas preocupações’

‘Há Há Há, como você é engraçado!’ Disse forçando a risada e ficando séria em seguida, o fazendo rir. Tudo que ela precisava era de diversão, para se manter ocupada e não pensar na avó. E a semana prometia ajudar.

~*~*~*~*~*~

‘Evi?’ Micah se mexeu em sua cama ‘Está dormindo?’

‘Não’ Ele ouviu a amiga se mexer na cama do outro lado do quarto ‘Que horas são?’

‘Já passou de uma da manhã. Estou sem sono’

‘Eu também. Ouvi muita coisa hoje, o dia parece ter durado 30 horas’ Mesmo sem poder vê-la por causa do escuro, ele sabia pela voz que ela estava com uma expressão desanimada

‘Acho que fez bem em não ir ao velório’ Ele sentiu que precisava tocar no assunto ‘Não é agradável’

‘Velório é horrível, vovó odiava tudo isso, achava de mau gosto’ Ele a ouviu respirar pesado ‘Quando minha mãe morreu, meu pai obrigou Max e eu a ficarmos de pé ao lado do caixão recebendo condolências das pessoas. Tínhamos 9 anos!’ Ela elevou a voz e ele podia jurar que ela estava segurando o choro ‘Eu tento não lembrar, mas sempre que penso na minha mãe a primeira imagem que me vem à cabeça é a dela no caixão’

‘Não consigo imaginar como foi ruim pra vocês’ Micah se ajeitou de lado na cama para conversar melhor e acendeu a luz do abajur, deixando o quarto iluminado apenas por uma luz fraca ‘Também não gosto de velórios, e justamente por esse motivo. É de extremo mau gosto ficar velando um corpo. Seu pai foi cruel obrigando duas crianças a passar por isso’

‘Meu pai não é a pessoa mais gentil do mundo, ele acha que só os fracos choram’ Ela riu ‘Foi vovó quem nos resgatou depois de um tempo. Brigou com ele na frente de todo mundo e nos levou embora. Só deixou que voltássemos quando o caixão já estava para ser enterrado, para que deixássemos as coisas que queríamos sobre ele’

‘Sua avó parece ter sido uma ótima pessoa’

‘Ela era a melhor’ Disse com a voz já saudosa ‘Conseguia manter a família junta nas férias sem que ninguém se desentendesse. Ela simplesmente fazia a paz reinar. Assim, sem qualquer esforço’

‘Sinto falta da minha avó também’ Micah adotou o mesmo tom saudoso dela ‘Fazem dois aos que ela morreu’

‘Sinto muito, não sabia’

‘Tudo bem, não costumo sair contando por ai’ Riu ‘Depois que ela faleceu passei a morar com Andrea e Michael, mas eles precisaram viajar e optei por ficar na escola para não passar o natal sozinho’

‘Andrea e Michael? Por que não diz “meus pais”?’ Evie riu

‘Porque eles não são meus pais,’

Apesar da luz fraca, Evie percebeu que Micah estava sério. Talvez estivesse tocando em um ponto que ele não gostava de falar. E pensando assim ela resolveu não continuar a fazer perguntas, apenas o encarou muda.

‘Pode perguntar, sei que está se coçando por dentro’ Ele riu da inquietação dela ‘Prometo não responder com sarcasmo’

‘Você, hmm, eles são...’

‘Meus pais adotivos, sim’ Micah completou para ela

‘Quando seus pais morreram?’

‘Eles não morreram, ainda estão vivos’ Ele não sabia por que estava contando isso a ela, mas algo o impedia de parar ‘Acho que eram muito novos quando eu nasci, então me largaram com a minha avó para que ela me criasse e sumiram no mundo. Vinham me visitar quando eu fazia aniversário, traziam presentes e depois sumiam outra vez. Mas depois que fiz 5 anos, pararam de vir. Nunca mais os vi’

‘Mas você não tem um irmão?’ Ela estava achando aquilo tudo um absurdo e não entendia porque ele falava com tanta naturalidade. Aquilo não era a coisa mais normal do mundo, como ele fazia parecer ‘Você apresentou um menino com seu irmão nas Olimpíadas. Ele é filho de quem então?’

‘Sim, o Connor... Ele também é filho deles, fizeram a mesma coisa com ele. Mas eu não estava em casa quando eles o largaram lá, e diferente de como foi comigo, nunca apareceram nos aniversários dele’

‘Micah, isso é um absurdo! Como você aceita isso?’

‘Por que teria que me incomodar se nunca os conheci de fato?’ Ele agora a encarava na penumbra e não sorria ‘Pra mim, aqueles dois não passam de meros estranhos, que me deram alguns brinquedos quando eu era criança. Para ser sincero, pouco me lembro da fisionomia deles’

Ele parou de falar e ambos ficaram mudos por um tempo, sem se olharem. Evie pensava no quanto ele devia ter sofrido com isso, embora mesmo conhecendo ele há pouco tempo soubesse que nunca admitiria isso. Micah pensava no porque de ter dito aquelas coisas a ela, coisas que ele nunca contou a ninguém, a nenhum de seus amigos, mesmo os de anos. Como se fosse capaz de ler seus pensamentos, respondeu a pergunta que ela estava se remoendo para fazer.

‘Quando minha avó faleceu, Connor e eu fomos mandados para um orfanato. Eu já estudava, então passava o ano inteiro fora e só ia para lá nas férias. Connor acabou sendo adotado por uma família. Eles são legais, sabe, gostam dele de verdade, mas acabamos separados. Eu acabei indo morar com Andrea e Michael’

‘E você não vê mais seu irmão?’

‘Vejo sim. Sabendo o que tinha acontecido com Connor, eles procuraram a família dele e fizeram uma espécie de acordo. E com esse acordo deles, Connor sempre passa alguns dias de férias conosco’ Ele deixou um leve suspiro escapar e o transformou numa tosse ‘Queria ter ido para casa para vê-lo, mas acho que terei que esperar até a Páscoa’

Não era preciso dizer mais nada para que ambos soubessem que o assunto estava encerrado. Micah já havia falado mais do que um dia pensou em falar e mesmo sem ter pedido, ele sabia que ela não contaria a ninguém. Mesmo que não fosse nenhum segredo, não era algo que ele gostasse de explicar às pessoas. Os dois ficaram mudos no quarto pouco iluminado, mas o silencio não durou muito. Evie teve um ataque de riso causado pelo clima tenso, e Micah não conseguiu manter-se sério por mais muito tempo. Riam tão alto que não ouviram o barulho dos passos de Vivian e nem quando ela parou na porta do quarto, observando os dois sorrindo por um longo tempo antes de bater e anunciar que estava ali.

‘Chega de conversa por hoje, já são quase 2hs e vou arrancar vocês cedo da cama!’ A ouviram dizer

‘Ok’ Responderam juntos, ainda rindo

‘Boa noite, John Boy’ Evie falou se enrolando no lençol

‘Boa noite, Mary Ellen’ Micah respondeu já com a cabeça enterrada no travesseiro

‘Boa noite família Walton. Luzes apagadas’

Vivian deixou o corredor às escuras e fechou a porta rindo. Sabia que aquele era o começo de uma história complicada, mas que poderia ter um final feliz. Só dependeria dela.


You’ve got a way with words
You get me smiling even when it hurts
There’s no way to measure what your love is worth
I can’t believe the way you get through to me

Notting Hill – You’ve Got a Way

Thursday, December 20, 2007

A primeira semana de férias havia passado depressa e Evie se deu conta que não havia dormido um único dia sequer na Avalon desde que Micah a tirou da cama com bolas de neve no vidro. Ficar hospedada na Spartacus na companhia dos meninos era melhor do que ficar sozinha na Avalon, sem ter com quem conversar. Em poucos dias Patrick havia conseguido fazê-la entender as regras do truco e as partidas noturnas se tornaram diárias. Os quatro, únicos ocupantes de toda a república, viravam a noite jogando. E quando a neve permitia a saída, o vilarejo era sempre convidativo, com seus cafés com lareiras dentro.

A véspera de natal chegou e Evie nem sentiu o tempo passar. Não sentia a menor vontade de voltar para sua própria república. Voltava a Avalon vazia apenas para pegar roupas limpas e saia outra vez. Mas na última visita rápida encontrou a coruja de Max repousando em cima da cômoda de seu quarto. Havia esquecido a janela aberta e a ave entrara. Nem foi preciso pegar a carta presa à sua pata para saber seu conteúdo. A notícia que ela mais temia nos últimos dias havia enfim chegado.

Com as mãos trêmulas, Evie conseguiu soltar o envelope da pata da coruja e a soltou pela janela. Não queria abrir, tinha receio de que descobrisse estar certa. Enfiou a carta no bolso e retornou a Spartacus. Os meninos estavam na cozinha sujando tudo para conseguir preparar uma pizza e ela subiu as escadas correndo, fechando a porta do quarto e se largando na cama que era de Dimitri e que estava usando para dormir na última semana. A carta estava amassada na sua mão e ela respirou fundo antes de abrir. Max confirmara a sua maior preocupação: sua avó havia falecido naquela manhã.

~*~*~*~*~

‘Aí está você’ Micah entrou em seu quarto e encontrou Evie sentada na janela olhando distraída para os jardins ‘Pensei que tivesse ido embora sem nos avisar’

‘Se não se importa, estava pensando em ficar aqui mais um pouco’ Evie desviou a atenção dos jardins quando Micah sentou na janela ao seu lado

‘Fique o tempo que quiser, tem muita cama sobrando aqui’

‘Obrigada. Vou continuar com a do Dimitri mesmo’ ela voltou a encarar o jardim

Micah sabia em que ela estava pensando, mas não sabia se deveria tocar no assunto. ‘Talvez ela não queira falar’ foi o que ele imaginou e decidiu esperar até que ela desse o primeiro passo. Em vez de conversar, Micah passou a encarar o jardim também, sentado ao lado dela.

‘Minha avó morreu’ Evie falou de repente e Micah sentou de frente para ela

‘Eu sei... Li a carta na sua mão quando vim te chamar pra comer a pizza, fiquei preocupado quando vi que dormiu chorando. Mas achei que você talvez não quisesse falar nada sobre isso, então não perguntei’

‘Não achei que fosse falar algo também’ ela virou de frente para Micah para encará-lo ‘Eu sabia que isso ia acontecer, mas não tive coragem de ir para casa. Max disse que eu era covarde por fazer isso’

‘Então foi por isso que você brigou com ele?’

‘Sim... Mas ele tinha razão, eu sou mesmo uma covarde. Não tive coragem de ir para casa me despedir da minha avó, preferi ficar aqui e fingir que nada disso estava acontecendo. Eu sou uma covarde e agora estou arrependida e é tarde demais’

‘Ei, você não é covarde’ Micah forçou-a a olhar para ele ‘Olha pra mim, Evi. Você não é covarde por não querer ver sua avó morrer’

‘Então por que me sinto uma?’ Evie tinha uma expressão triste no rosto, mas não derramava nenhuma lágrima

‘Nunca deixe que ninguém diga isso de você’ ele soltou seu queixo e ela não desviou o olhar dele ‘Não tem nada de errado em não querer ver uma pessoa que você ama morrer na sua frente’

‘Quem chamou você de covarde?’ Micah não havia dito, mas Evie sabia que era isso. Ela não sabia como, apenas sabia

‘Ninguém importante. Mas ele estava errado’

‘É, acho que você tem razão’ ela deixou escapar um longo suspiro antes de levantar ‘Vou dormir, boa noite’

‘Boa noite’ Evie fechou a porta do quarto quando saiu e Micah permaneceu na janela, pensativo

~*~*~*~*~

‘Ei, aonde você vai?’

Micah parou no meio da escada vendo Evie sair da casa. A garota apenas sorriu e não respondeu sua pergunta, fechando a porta. Micah correu atrás dela e a deteve no meio do jardim.

‘Eu fiz uma pergunta’ ele segurou seu braço e soltou em seguida, percebendo que ela havia ficado irritada

‘Não lhe devo satisfação de nada’ Evie continuou andando e Micah foi atrás

‘Não disse que me deve satisfação, só estou perguntando aonde vai e porque ia sair escondida’

‘Vou até Sofia, para o enterro da minha avó’ ela disse por fim ‘Não sou covarde, posso fazer isso’

‘E está fazendo isso por você mesma ou só para provar para o seu irmão que ele estava errado?’

‘Por mim, claro’

‘Está bem então, eu vou com você’

‘Faça como quiser’

Ela deu as costas para ele e continuar caminhando até os portões. Micah ainda olhou para a república e lembrou que não tinha avisado nada aos meninos, mas não voltou e correu para alcançá-la. Mesmo dando coices, ele sabia que ela estava triste e não ia deixá-la sozinha.

~*~*~*~*~

O funeral de Evangeline Montez Stanislav acontecia na Igreja de Santa Sofia e toda sua família e amigos estavam presentes. Todos, menos sua segunda neta mais velha. Evie observava toda a movimentação de longe, do outro lado da rua.

‘Ela não queria nada disso, está tudo errado’ Evie falou depois de um longo tempo em silêncio

‘O que está errado?’

‘Ela não queria nada disso, odiava ser o centro das atenções e sempre falou que não queria esse monte de gente velando o corpo dela. Ninguém escutava o que ela dizia’

‘Por que não vai até lá então e diz o que ela queria?’ Micah se aproximou dela

‘Ela era minha madrinha também, temos o mesmo nome’ Evie continuou falando sem tirar os olhos das pessoas na igreja ‘Max estava certo, sou uma covarde e não consigo fazer isso’

‘Você não é covarde, Evi’

‘Ela vai fazer muita falta’ ela falou em um tom de voz tão baixo que ele provavelmente não teria ouvido se não tivesse esperando ‘Muita falta’

Era como se ela tivesse falando para si mesma, mas ainda assim queria ser ouvida. Ela então se afastou da calçada e parou em frente a ele, olhando mais uma vez para sua família na porta da igreja.

‘Tenho certeza que sim’ Micah respondeu com um sorriso leve, sem esperar o que viria a seguir. Evie se aproximou dele e o abraçou, descansando a cabeça em seu ombro e se deixando chorar de verdade pela primeira vez desde que soube da morte da avó.

Micah estava surpreso com o gesto, a princípio. Evie não costumava ter esse tipo de comportamento com ele, mesmo ele sabendo que ela era assim com seus amigos. A amizade deles era mais relaxada, mais a base de brincadeiras e briguinhas sem sentido e menos momentos calmos como esse. Mas por mais estranho que fosse, ele estava gostando dessa sensação de tranqüilidade.

Levando as mãos até as costas dela, Micah puxou seu corpo para mais perto do dele, e a deixou chorar em seus braços. Evie suspirou e deu uma última olhada em sua família antes de encará-lo.

‘Vamos embora’

~*~*~*~*~

Os dois pararam em frente a uma casa de aparência antiga, como uma casa de campo. Eles estavam em Jeravna, uma cidade totalmente bruxa no interior da Bulgária. Evie olhava ao redor sorrindo e parecia estar tentando perceber alguma diferença no cenário, como se há muito tempo não o visse. A porta da casa se abriu de repente e três mulheres aparentando ter a mesma idade apareceram na soleira, olhando a menina com sorrisos saudosos no rosto.

‘Estávamos esperando você aparecer, querida’ a mulher morena de cabelos muito negros se adiantou e abraçou Evie ‘Entrem, os dois, está frio aqui fora’

Wednesday, December 19, 2007

Like a flower
Waiting to bloom
Like a light bulb
In a darkened room
Im just sittin' here
Waiting for you
to come on home
And turn me on

As férias de Natal em minha casa, não são iguais àquelas festas de revista, cheias de gente, ate porque minha família é pequena, mas sempre temos a visita de alguns tios de meus pais, meu irmão sempre aparece e traz algum amigo, por isso minha mãe, gosta de fazer todos os pratos que ela sabe, e mesmo assim na hora da ceia, ela acha que a comida não vai dar. Papai fica empurrando pra ela alguns cálices de Grozdova, uma aguardente de uva, aqui da Bulgária, e vários outros aperitivos, ele se acha O barman rsrs, e ela acaba se soltando, e no final, todos movidos a bebida e muita comida, rimos e nos divertimos muito, contando coisas do passado, ou simplesmente aproveitando o fato de estarmos juntos. Ou vamos para a casa dos Ivanov, e celebramos por lá.
Este ano passaríamos o dia de Natal em casa, porque Yuri iria trazer Mary para apresentar aos meus pais, e isso estava deixando minha mãe ansiosa. Quando desembarquei do trem, ela já me crivou de perguntas do tipo:
- Como ela é? O que faz? É enjoada? É bonita? Gosta de cozinhar?? Yuri gosta tanto de tarator... Acho que vou ensinar a ela como fazer... Será que não vai nos achar simples demais???
Não deu tempo sequer de ver onde Iago estava, mas quem se importa?? Fui para casa ouvindo os planos de mamãe para as festas de fim de ano.
Estava caindo uma neve fininha, e isso deixava o clima mais festivo. Eu estava na cozinha ajudando no preparo das coisas, quando papai chegou em casa e gritou:
- Ludmilla tem visita pra você, é o Iago. - olhei para minha mãe esperando uma cara de poucos amigos, mas ela deu de ombros:
- Vá logo, falar com seu namorado, e convide-o para jantar conosco, é época de Natal. – dei-lhe um abraço para agradecer e fui para a sala. Iago quando me viu levantou correndo e ficou sério, quando viu minha cara fechada. Papai pegou a garrafa de bebida e foi pra cozinha, mas antes disse:
- Svetlana, fez moussaka búlgara, é de comer agradecendo aos deuses, fique para jantar. – e Iago apenas balançou a cabeça concordando. E me olhou.
- Quer sair um pouco?- ele perguntou.
- Tá nevando. – respondi seca e ele disse:
- Vim falar com você, acertar as coisas e você não quer, então vou embora.
- Ta bom, espera, que vou buscar mais um casaco. - peguei um casaco pesado com capuz e sai com ele. Ao pisarmos na varanda ele começou a falar:
- Eu não imaginei que vocês fossem fazer uma festa surpresa pro Ricard, senão teria alertado os garotos.
- Porque não falou que ia fazer um ‘programa de homem’? Que ia num lugar daqueles?
- Você teria compreendido? Não teria ficado irritada? – ele perguntou:
- Ok, eu teria ficado irritada. – disse depois de pensar um pouco e ele se aproximou, como eu não recuasse, ele segurou meu rosto entre suas mãos e disse sério:
- Não toquei e nem quis ficar com nenhuma delas, quando eu sei que tenho você.
Nos encaramos e ele abriu os braços todo esperançoso, e eu me atirei neles.
- Senti sua falta Yéti. – e ele riu e me aconchegou mais em seus braços, mas lá no fundo eu me sentia uma pontinha de preocupação.
o-o-o-o-o

Like the desert
Waiting for the rain
Like a schoolkid
Waiting for the spring
Im just sittin' here
Waiting for you
to come on home
And turn me on

Na semana do Natal, fomos convidados para jantar na casa de Luka, e meu irmão Yuri deu uma desculpa, para não ir. Ia num jantar com tratadores de dragões da Romênia.Ao chegarmos na casa, reparei que a ela estava toda decorada com muitos visgos pelas portas, guirlandas e bolas douradas. A arvore tinha fadinhas, e muitos laços, e velas acesas flutuavam no teto. Durante toda a noite, evitei ficar ao lado de Luka, especialmente, se tinha visgo por perto, e ele disse:
- Relaxa Milla, se tivermos que nos beijar, não vai ser surpresa para você.
- Muito engraçado Luka.
- Então... O seu namoradinho sabe o que houve entre nós?- perguntou presunçoso enquanto andava pela sala, e eu fui atrás dele.
- Luka, se você gosta de mim pelo menos um pouco, não vai falar disso para ele.- pedi quando ele parou.
- Não me importo com ele. - e tinha as mãos atrás das costas.
- Prometa Luka. - insisti.
- Está bem eu prometo. - e ao tirar as mãos detrás das costas havia um galo de visgo em sua mão, e ele o levantou colocando sobre nossas cabeças.
- Vou selar minha promessa com um beijo. Sabe que é a tradição. - e para minha infelicidade nossos pais viram e começaram a rir, e dizer, que a tradição deveria ser seguida. Ele tinha um olhar presunçoso no rosto, como se fosse o grande vencedor, e isos me irritou. Aproximei-me dele como se fosse beijá-lo na boca, mas beijei-lhe o rosto dizendo:
- Você prometeu! - e ele sorriu maroto e piscou.
- Nosso segredo está bem guardado. - e voltamos para junto dos outros.
Preciso confiar que ele cumpra o que me prometeu.

Era dia de Natal, e Annia e Vina, vieram me visitar. Levei-as ao meu quarto enquanto Yuri conversava com Vlad,o irmão da Vina na sala junto com meu pai, e minha mãe explicava a Mary como fazer os pratos favoritos de meu irmão. Minha cunhada estava fazendo o maior sucesso com meus pais, e eu não faria nada para atrapalhar este amor recém descoberto.
-E ai? Alguma noticia da Evie? Lá deve estar tão frio, tremo só de pensar. - disse Vina e jogou na boca uma de suas pílulas de vitaminas.
-Ela está com Micah, e duvido que ele deixe a ‘Evi’ congelar. - disse Annia abraçando um enorme urso de pelúcia que estava na minha cama, e rimos.
- É, ele vai cuidar dela direitinho. Mas falando em cuidados... Onde você estava Annia? Se Nina não tivesse juntado suas coisas, teria perdido o trem. - perguntei e Annia, respondeu, torcendo a orelha do urso.
- Estava com o Ty.
- Ummm, estava com o Ty... Isso está evoluindo. - disse Vina.
- Como assim, você estava com o Ty e não nos falou nada?- Evie vai ficar indignada, eu disse, mas parei ao ver que Annia não estava rindo.
- Eu falei que não vou ficar mais com ele. Vamos ser apenas amigos.
- Mas porque isso agora? Vocês não se davam bem?
- Você não gosta dele?- a enchemos de perguntas e ela respondeu:
- O problema é que neste ultimo encontro ele deixou claro mais uma vez, que somos amigos, e isso doeu. Quero alguém que goste de mim de verdade.
- É estar com alguém que goste da gente, é uma coisa muito boa. - disse e fiquei encarando Vina. Ela nos olhou e disse:
- Olha, isso deve ser bom mesmo, mas no meu presente momento não quero saber disso. Estou muito bem sozinha, e não quero confusão pro meu lado. E você Milla? Sei que foi jantar na casa do Luka, correu tudo bem??
- Sim, tudo bem, e se ele falou alguma coisa, é mentira. – respondi rápido e elas me encararam. Annia perguntou de cara:
- Aconteceu alguma coisa entre vocês Milla?
- Não. - respondi de olhos baixos e Vina insistiu:
- Ludmilla Kovac, pela minha caixinha de remédios em amostras grátis. O que foi que você fez?
Já estava cansada, de esconder e precisava desabafar.
- Luka e eu nos beijamos.
- Vocês o que??- perguntou Annia e levantou da cama jogando o meu urso no chão.
- Ai meus sais! Me segura que vou desfalecer. – disse Vina deitando na cama e Annia disse irritada:
- Lavinia Durigan, se você desmaiar, faço você acordar ao estilo japonês. Estamos numa crise aqui. - e Vina se aprumou na cama, se abanando e perguntou:
- Quando foi?
- Foi naquele sábado do aniversário do Ricard.
- Bem, se foi uma vez só, o Iago nem precisa ficar sabendo né? Afinal, vocês estavam brigados... – disse Vina sem muita convicção, mas Annia me olhava séria e perguntou:
- Você gostou?
- Não sei...
- Não tem esta de não sei... Ou gostou ou não. – pressionou Vina e eu respondi irritada:
- Gostei, e não consigo esquecer, estão satisfeitas??
- Não, Milla, não estamos satisfeitas. Este lance com o Luka era uma coisa de criança, sempre brincamos com isso, mas não achei que você fosse levar isso adiante, ainda mais agora. O que você pensa em fazer?- perguntou Annia.
- Do jeito que você fala, parece que tudo foi premeditado e não foi. - me defendi.
- Da sua parte não, mas e o Luka? Ele nunca aceitou seu namoro com o Iago, eles têm uma rixa antiga. – disse Vina, e ficamos quietas pensando, e eu comecei a dizer:
- Eu gosto do Iago, muito. Mas sabe quando você beija alguém e esta pessoa coloca tanta paixão no beijo, que você pensa que vai se afogar?Ai quando você pára, você percebe que não estava se afogando, mas sorvendo o ar? Foi assim com o Luka, e cada vez que o Iago me beija eu me sinto culpada, sinto que o estou traindo.
-Ér... Mas você está traindo o Iago. Desculpe, mas é a verdade. - disse Annia e Vina sacudiu a cabeça concordando. Senti meu estomago se revirar.
- O Iago desconfia de alguma coisa?- Vina perguntou.
- Não. Mas ele ta dizendo que não estou como antes, diz que estou distante. Eu não quero magoá-lo.
-Ah Milla... Se ele desconfiar disso... Ou se o Luka falar...
- Não, ele não vai falar, ele prometeu. - e ao olhar para as caras descrentes delas eu disse:
- Vou resolver isso. – quando elas foram embora, e peguei o urso que Iago havia me dado de Natal e o abracei. Só esperava poder acreditar nas minhas palavras e resolver este problema, da melhor maneira possível.

In my poor heart
It's been so dark
Since you been gone
After all you're the one
who turns me off
But you're the only one,
Who can turn me back on


N.A. música Turn me on, Norah Jones

Monday, December 17, 2007

It's the most wonderful time of the year
There'll be much mistletoeing
And hearts will be glowing,
When loved ones are near
It's the most wonderful time of the year.

Andy Williams - It’s the most wonderful time of the years


Por onde se andava, para qualquer lado que se virasse, lá estavam elas: pinheiros, guirlandas, bolas de cristais, laços vermelhos e dourados, visgos e pinhões, todos formando a decoração de natal. Evie nunca havia visto Durmstrang tão bonita. E a forte neve que insistia em cair completada a decoração, dando um toque especial. Apesar de ainda enfrentar certa dificuldade para se adaptar ao novo sistema da escola, ela não podia negar que o novo diretor estava dando uma nova identidade ao Instituto. E era uma identidade que ela estava começando a gostar.

Com o inicio das férias de natal, todos os alunos preparavam as malas para ir para casa. Todos, menos Evie. Pela primeira vez desde que entrou para o Instituto Durmstrang ela passaria o natal na escola. Há dois dias havia brigado com o irmão e querendo evitar um mal estar durante as festas de família, optou por ficar no castelo. E também porque ela sabia que a avó não estava bem de saúde e não queria passar o natal em meio a um clima pesado e triste em casa. Nem os apelos de Dimitri fizeram com que ela mudasse de idéia. Então, enquanto as amigas faziam as malas para ir embora, Evie apenas observava desanimada.

‘Tem certeza que vai passar quase um mês sozinha aqui?’ Nina a questionou pela milésima vez

‘Por que não fica na minha casa?’ Milla sugeriu mais uma vez ‘Não gosto da idéia de você ficar sozinha no castelo por 3 semanas. O que vai ficar fazendo??’

‘Ah ela não vai ficar sozinha, o Micah não vai pra casa... ’ Evie se ajeitou na cadeira ao ouvir Vina, tentando parecer normal ao falar

‘Mas ele já até foi embora com o Ty assistir a um jogo de quadribol. Quem disse que ele vai ficar na escola?’ A tentativa de parecer desinteressada não teve o efeito desejado

‘Parece que houve uma mudança de planos, e ele volta pra cá depois do jogo do amigo deles’ Annia disse rindo

‘Bom, nesse caso então a Evie vai se manter ocupada esses dias, não precisamos mais nos preocupar!’ foi à vez de Nina debochar da amiga. As quatro riam enquanto Evie se mantinha séria

‘Quatro comediantes... ’ disse querendo rir, mas se controlando ‘Não vai acontecer nada, fiquem despreocupadas’

‘Querida, preocupada é algo que não estamos’ Milla falou rindo alto ‘Agora você, que parece resistir firme mesmo depois de já ter ficado com ele, deveria começar ficar’

Evie revirou os olhos e se jogou na cama enquanto as amigas riam, um leve sorriso esboçado no rosto. Se há alguns minutos atrás os planos para as férias estavam em branco, agora ela via a possibilidade de, de fato, se divertir um pouco.

*************************

Dois dias inteiros das férias de natal já haviam se passado e Evie não havia colocado sequer a ponta do nariz do lado de fora da republica. Fazia muito frio e a perspectiva de vestir no mínimo 4 agasalhos para percorrer o caminho até o castelo a desanimava. E Micah também não parecia disposto a deixar o conforto da república aquecida e aparecer para dar um alô. Mas o período de hibernação foi forçado a ter um fim. Na manhã to terceiro dia Evie foi acordada com o som de bolas de neve estourando no vidro da janela do quarto. O barulho que elas faziam era tão forte que a garota saltou da cama assustada, pensando que o vidro estava sendo estilhaçado. Vestiu um casaco e abriu a janela. Uma bola acertou em cheio seu rosto.

‘EI!’ Gritou com raiva, limpando o rosto ‘O que pensam que estão fazendo?’

‘Vai hibernar até quando?’ Ela ouviu Micah gritar do jardim, e em seguida ser atingido por duas bolas de neve nas costas. Rapidamente preparou mais duas e devolveu aos atiradores

‘Você não tinha um modo mais sutil para me acordar?’ Ela berrou de volta

‘Saia da toca. Vamos esperar aqui’

Ela fechou a janela e vestiu os casacos, saindo para a luz do dia pela primeira vez. Ainda na porta da república ela pode identificar que os donos das bolas que atingiram Micah eram dois meninos do primeiro ano que moravam na Spartacus. Os três deviam ser os únicos moradores da república a ficar na escola. Micah notou que ela já havia saído e pediu para os meninos continuarem a brincadeira sem ele, indo de encontro a ela na varanda. O vento gelado que corria permitia que apenas nariz e olhos ficassem expostos.

‘Não sabia que estava na escola, descobri ontem’ Micah sentou no banco ao lado dela e descobriu a boca ‘Estava começando a ficar preocupado por não vê-la aqui fora’

‘Também não vi sinal seu desde que as aulas terminaram, não fui a única a ficar trancada na república’

‘Mas você está sozinha na Avalon. Eu ainda tenho a companhia dos pigmeus ali’ Disse apontando para os meninos que travavam uma batalha com bolas de neve ‘Patrick e Sven, são da Mannaz. Ei pirralhos, venham aqui!’

Micah chamou os meninos e eles pararam a guerra, caminhando até a varanda. Os dois eram loirinhos e as bochechas estavam vermelho tomate por conta do frio e da brincadeira que começava a deixá-los suados. Pareciam dois esquimós de tão empacotados que estavam.

‘Essa é a Evi, minha amiga’ Disse quando eles pararam na frente deles, tirando os gorros ‘Não estava congelada como pensei hoje cedo’

‘Legal, agora podemos jogar truco!’ O que se chamava Patrick falou animado

‘Eles dois são viciados em jogo de carta, não liga’ Micah acrescentou depressa ‘Mas agora podemos arriscar uma partida, já que consegui uma dupla’

‘Está marcado para mais tarde’ O outro menino recolocou o gorro na cabeça e desceu a escada da varanda, enchendo a mão de neve ‘Mas agora... GUERRA!’

Sven atirou a bola de neve pra cima deles e ela estourou na parede da varanda. Patrick mais do que depressa correu atrás dele atirando neve sem nem ao menos ter o trabalho de formar bolas e Micah levantou do banco puxando Evie pela mão para se juntar a bagunça. O frio era intenso e tudo que ela queria era ficar escondida na cama, a não ser que as companhias valessem sair do conforto da republica aquecida. E na primeira bola que conseguiu acertar em cheio na cara de Micah ela soube que valeria a pena.

Friday, December 14, 2007

‘Fecha a porta, Victor!’ Falei irritado ‘Não quero mais ninguém aqui dentro!’

‘Vão ouvir assim mesmo, os quartos não são a prova de som’ Victor respondeu rindo e trancando a porta

‘Relaxa cara, a burrada já ta feita e você ta ferrado de qualquer forma. Vamos acabar logo com isso, você ta errando a letra!’ Ty falou pegando a copia com a letra da música que teria que cantar

‘Essa música é ridícula’ Resmunguei lendo um trecho que seria minha parte e eles riram ‘Evi me paga, isso não é o oposto de jogar quadribol!’

‘Ninguém mandou você ir lá cutucar a onça com vara curta’ Iago falou calmo, pegando o papel com Ty ‘As meninas ainda estão mordidas por causa do aniversário do Ricard’

‘Pois é, o mais sensato era manter distancia delas. Se aproximar e provocar então, é praticamente suicídio’ Ricard falava sério lendo junto com Iago ‘Você ainda pode desistir, ora. Vá até ela e diga que estava errado, que teatro não é tão simples assim, e poupe a si mesmo de fazer papel de idiota naquele palco’

‘Nunca!’ Tomei o papel da mão deles e empurrei na mão do Ty ‘Canta a parte dela aí, vou aprender isso hoje!’

Ty pigarreou alto e começou a cantar com a voz aguda imitando uma garota, mas que ficou mais parecido com uma gralha. Todo mundo ria e comecei a cantar minha parte. Nem sob tortura ia admitir que ela estava certa. Fazer papel de idiota é a especialidade dos homens. Um a mais ou um a menos não faria diferença.

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As meninas ainda gritavam empolgadas quando deixei a arquibancada do campo de quadribol indignado. Evie tinha se saído muito bem no teste, conseguindo marcar dois gols! Das duas uma: ou ela mentiu esse tempo todo e sabe jogar quadribol, ou não dormiu para poder treinar. Qual das duas era a certa não importava. O que importava era que eu ainda não havia decorado a letra da música e agora estava a um passo de perder a aposta. Como se já não bastasse o papel de palhaço que ia fazer, ainda ia sofrer a humilhação de perder pra ela.

Marchei de volta para a república rebocando a Ariel postiça que Ty encarnou e apanhei o papel amassado na mochila. Agora era questão de honra aprender aquela letra e me sair bem no teste. Vergonha é algo que não tenho, então as risadas dos meus amigos na platéia não iriam interferir em nada. Tudo que tinha que fazer era não errar a letra e empatar o jogo. E quem sabe pegá-la de surpresa também, por que não?

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Georgia e um menino magrelo que parecia uma gazela correndo e saltando no palco se aproximavam do fim do teste. O garoto era muito bom, conseguia pular daquele jeito e ainda cantar sem soar ofegante. Evie estava de pé atrás da cortina observando os dois, nervosa. Dei uma espiada também e corri o olho rápido na platéia. Simplesmente todos os nossos amigos estavam sentados nas cadeiras, esperando pela hora do riso e acho que era isso que a deixava mais aflita. Olhei para o papel com a letra, mas dobrei e guardei no bolso. Não precisava mais dele, sabia o que tinha que fazer.

‘Muito bom, Georgia! Excelente, Alexsei!’ Ouvimos o professor encerrar a música no piano e os dois agradeceram sorrindo, deixando o palco

‘É a nossa vez’ Falei passando por ela ‘Pronta?’

‘Sim’ Respondeu vaga e me encarou ‘Não faça nenhuma gracinha. Isso pode não passar de uma grande piada pra você, mas é importante pra mim’

Bati continência e ela bufou, saindo dos bastidores para o palco quando o professor chamou nossos nomes. Georgia se plantou do lado dele para assistir a apresentação com um bloco nas mãos, esperando por algo que pudesse relatar no jornal e transformar em uma grande piada. Acenei cínico para ela e peguei os microfones em cima do piano, entregando um para Evie.

Quando o professor começou a tocar a música depressiva, Evie teve o primeiro choque. Minha parte era a primeira e ela por certo estava esperando que eu fosse fazer alguma coisa para estragar, mas tudo que não esperava era que eu cantasse direito. Ela deu um meio sorriso e começou sua parte espantando a tensão para longe. Mas não durou muito. Quando chegamos ao refrão, que tínhamos que cantar juntos, dei um passo rápido para cima dela e puxei sua mão, entrelaçando nossos dedos. Ela me olhou assustada e as meninas gritaram na platéia. Evie gaguejou na hora de entrar no refrão e cantei mais alto para abafar o erro, até que ela se recompôs. Se eu estava desconfortável em cantar com platéia, ia levar ela junto.

Almost Paradise
We're knocking on heaven's door
Almost Paradise
How could we ask for more?
I swear that I can see forever in your eyes
Paradise

O professor parecia estar gostado da interpretação, então resolvi levar até o fim e quando o refrão terminou não soltei sua mão. Senti-a relaxar e entrar na onda, então deixei que se afastasse para continuarmos a música, mas ainda sem soltá-la. O mais longe que ela ia era a distancia dos nossos braços estendidos. Quando entramos na estrofe final da música, onde eu deveria cantar sozinho, puxei-a com força para cima de mim e deixei nossos rostos separados por milímetros.

‘And in your arms salvation's not so far away, we're getting closer, closer every day’ Os microfones se chocavam de tão próximos e ela ficou muda enquanto eu finalizava a música encarando-a nos olhos.

‘Bravo!’ O professor levantou do piano aplaudindo freneticamente e nossos amigos começaram a gritar tão empolgados quanto ele. Soltei a mão dela e sorri ‘Fabuloso! Excelente! Sr. Wade, foi realmente bom! Estou surpreso!’

‘Não é o único então’ Evie respondeu corada desviando o olhar de mim e se virando para o professor

‘Próxima dupla, por favor! Está ficando bom! Isso sim é o show business!’

O professor agitava os braços para a próxima dupla entrar no palco e saímos depressa. Quando já estávamos atrás das cortinas novamente ela acertou um tapa no meu braço.

‘Onde aprendeu a cantar e interpretar uma música assim?’ Disse indignada ‘Estava me enganando para ganhar a aposta?’

‘Se eu estava mentindo, então você também me enrolou’ Respondi alisando o braço ‘Pra quem dizia que mal sabia voar, se saiu muito bem no teste!’

‘Eu treinei muito pra isso!’ Ela sentou na cadeira perto da cortina para observar a outra dupla e sentei ao seu lado

‘Bom, eu também. E ainda tive que agüentar o Ty cantando a sua parte’ Estendi a mão e ela me encarou desconfiada ‘Quites então? Aposta anulada? Terminamos empatados, certo?’

‘Ok, empatado. Aposta anulada’ Disse finalmente apertando minha mão ‘Você devia considerar fazer o teste final para a peça. Leva jeito’

‘Nem pensar. Minha carreira em musicais começou e terminou hoje’ Disse depressa e ela riu ‘Não sirvo pra isso’

‘Acho que não faz idéia do que é capaz quando se empenha’ Ela respondeu desviando a atenção para o palco, onde a menina que se apresentava acabara de levar um tombo e a platéia ria ‘O professor Ivo não vai lhe deixar em paz, gostou da nossa apresentação’

‘Ouch, aquilo vai deixar uma marca’ Falei rindo da menina

Ficamos o resto das apresentações sentados no banco observando dos bastidores e não comentamos mais da nossa. Quando todas as duplas já haviam se apresentado o professor dispensou a turma e avisou que a 2ª audição, para os papéis de Rusty e Willard, seriam na semana seguinte. Logo depois passou por nós dois sorridente, fazendo sinal de positivo com a mão e batendo palmas. Evie me olhou rindo. Acho que nunca admitiria a ela, mas até que gostei de experiência.

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‘Tem certeza que não quer mesmo ir pra minha casa?’ Ty perguntou pela quinta vez ‘Não vai ficar ninguém na escola!’

O jogo do Californian Coyotes contra o Texas Bulls havia terminado e comemorava a vitória do meu antigo colégio com meus amigos, mas já estava na hora de ir embora. A mãe de Gabriel já havia arrastado ele irritada de volta para a escola porque ele esqueceu de fazer as malas e os meninos aproveitaram a carona. Ty tinha acabado de voltar de um sumiço de alguns minutos, com o tio do lado.

‘Tem certeza que não quer mesmo ir pra minha casa?’ Perguntou pela quinta vez ‘Não vai ficar ninguém na escola!’

‘Ver você de dançando de saia?’ Falei debochado e o tio dele riu ‘Não, obrigado. Vou ficar em Durmstrang’

‘Ok então... Nos vemos em Janeiro. Bom natal, Ren’ Falei me provocando

‘Bom natal pra você também, Ariel’ Respondi e o tio dele olhou sem entender antes de desaparatarem

Iago estava conversando com Jaeda e fui até eles. Mesmo seu time tendo perdido, ela nunca perdia o bom humor e conversamos ainda um bom tempo antes de nos despedirmos e ela sumir na multidão com os amigos. Aparatamos de volta para a escola e ele foi arrumar a mochila para ir para casa. E quanto a mim, bem, só me restava dormir e torcer para acontecer qualquer coisa durante as férias que quebre o tédio de ficar isolado nesse fim de mundo por três semanas...

Thursday, December 13, 2007

Das memórias de Ty McGregor

Ty,
Após uma intensa investigação descobri que a Rory está estudando na escola de Magia do Texas, e faz parte do jornal de lá. Danielle ficou cismada com minhas perguntas, mas a convenci de que quero trocar matérias com a Rory, ou quem sabe ela queria colaborar com o Lê Soucier, foi por pouco, então acho que sua garota não será avisada da sua iminente visita rsrs. Espero que tudo dê certo entre vocês.
Abraços
Went”

Amassei o papel e o atirei na cesta de lixo, sem errar. Era muita coincidência eu estar indo assistir a um jogo, justo na escola aonde a Rory estudava. Sorri. Talvez tudo desse certo no final.

As semanas que antecederam as férias de final de ano passaram rápidas e embora eu e Micah ríssemos muito das caras irritadas das meninas para o nosso lado, devido à comemoração do aniversário do Ricard numa boate do vilarejo, tudo estava indo relativamente bem. Quer dizer, Victor depois de entregar o ouro durante sua serenata frsutrada de “reconciliação”, tentava disfarçar que não sentia falta de Lavínia, e Iago pisava em ovos, pois Milla, estava dando um gelo nele. Como eu e Micah queríamos ver o primeiro jogo do Gabriel como capitão, estávamos tentando convence-lo a aparatar conosco até lá, e após mais um olhar gelado da Milla, ele resolveu que iria conosco.
- Iago, tem certeza que vai fazer isso? A Milla ainda está irritada. – perguntei.
- Mais um motivo para eu ir ver o jogo, se eu ficar aqui não vai adiantar, então vamos lá. Quero ver como os americanos jogam.
- É isso aí, Yéti, mostra quem manda no iglu. - disse Micah e rimos, quando vimos a dúvida sobre quem mandava em quem nos olhos do grandalhão.
Peguei minha mochila, porque de lá eu iria para casa passar o Natal e pegaria carona com meu tio Dylan, que estaria voltando de um Congresso de Curandeiros e Micah voltaria com Iago.

Chegamos ao estádio do Texas Bull’s, e a primeira coisa que fizemos foi nos livrar dos casacos pesados, e começar a procurar nossos amigos. Logo encontramos Griff, Miyako, Seth e Luna, e nos dirigimos as arquibancadas com os ingressos enviados pelo Lobão. Eu esquadrinhei cada lugar daquele estádio com um onióculos, e não a encontrei lá. Nem mesmo seus irmãos haviam ido ao jogo. Rimos muito quando vimos Iago, de queixo caído vendo Jaeda, usando o uniforme de cheerleader com as cores do Bull's, e ele aplaudir entusiasmado. É, se Milla visse isso, o último dos Yétis seria extinto rsrsrs.
O jogo foi muito disputado, mas a equipe da Califórnia, estava mais concentrada e para a infelicidade do ex namorado da Evie, os Coyotes venceram o jogo. Gritamos e comemoramos com tudo e Griff soltou alguns fogos da Gemialidades, atraindo a atenção e como ele mesmo disse, novos clientes. Após cumprimentar Gabriel, saí dali e fui até os alojamentos da escola. Andei por um tempo, e na falta de um balcão de informações, encontrei umas garotas conversando. Aproximei-me delas e perguntei:
- Por favor, eu gostaria de saber aonde encontro o pessoal do jornal da escola. - e uma garota morena, de cabelos e olhos negros respondeu cordial:
- O pessoal do jornal está no jogo. Quem você procura?
- Procuro por Rory Montpellier, vocês a conhecem?
- Ah, a francesa arrogante? Sim, nós a conhecemos. – respondeu a garota azeda.
- Ela não é arrogante Charlene, é até bem legal. Ela está no restaurante, acabei de vê-la indo para lá. – respondeu a outra garota sorrindo e me apontou a direção que eu deveria seguir.
Caminhei por um tempo, esbarrando aqui e ali com alguns estudantes apressados, mas continuei até encontrar o tal lugar. Era um local grande, com muitas janelas, e me aproximei de uma delas para dar uma olhada geral e para minha surpresa a avistei sentada numa mesa e alguns livros abertos na sua frente. Ela estava bronzeada, e não usava mais os cabelos compridos até a cintura, agora eles mais curtos, na altura do ombro. Senti um nó no estômago, e minha boca ficou seca, só de olhar para ela daquela distancia, eu percebi o quanto eu senti a falta de estar junto com ela. Comecei a me mover, e a enumerar os pedidos de desculpas, quando um garoto apressado esbarrou em mim, e nossas mochilas foram ao chão.
- Desculpe amigo. - ele disse.
- Sem problemas. – respondi enquanto pegava minhas coisas de volta.
Ele pegou as suas coisas e foi rápido para o restaurante, quando olhei novamente pela janela, vi aquele mesmo garoto se aproximar da Rory e beija-la com vontade. Fiquei pasmo. Olhei-os por alguns instantes e resolvi sair dali, para evitar fazer alguma besteira, porque a minha vontade era ir até lá e encher aquele cara de socos, por estar com as mãos na minha namorada.
Ela não é mais sua namorada. Ou você pensou que ela iria ficar te esperando depois do jeito rude que você a tratou? Você não é tão especial assim... – era o que eu pensava enquanto voltava para o estádio e digeria a seco, que Rory havia seguido em frente. Bem... eu agora estava livre para fazer o mesmo.

Wednesday, December 12, 2007

“A novidade dos primeiros momentos de namoro traz para a vida um colorido diferente, um estímulo que nem a distância, nem as condições atmosféricas, por piores que possam parecer, poderiam fazer que os enamorados adiassem um encontro.

Após algum tempo, muitas vezes, lentamente, o romantismo, que se esperava durar por toda a vida, vai perdendo o empenho e a força. O desinteresse nos compromissos é justificado por “desculpinhas”, entre outras coisas, que originalmente não faziam parte do relacionamento. Há a impressão de que a relação parece estar sendo sustentada apenas por um dos namorados. As evidências apontam para caminhos que talvez o mais apaixonado dos dois não gostaria de assumir… Seja pelo longo tempo de convivência ou seja pela insistência em acreditar que ainda poderá haver o desejo de uma mudança concreta de comportamento do outro.”

[José Eduardo de Moura]


A verdade era que, mesmo não querendo assumir para si mesma, Lavínia sentia a cada dia que o término do namoro com Victor pesava em cada centímetro do seu corpo. Sentimento que ela ainda não conhecia muito bem, mas que estava aprendendo a denominar de “arrependimento”. Uma semana antes de ir para casa passar o Natal em casa (embora sem nenhuma vontade), muitas vezes ela pensou em procurá-lo para dizer que tinha certeza de que o namoro dos dois valia sim a pena, e que não queria desistir disso. Mas o orgulho era maior ou pelo menos, falava mais alto. Acabava deixando tudo como estava...

‘Você não vai MESMO falar com o Victor?’ Ricard perguntou para ela mais uma vez como se cada vez que ele perguntasse fosse por si só, suficiente para causar uma ação.

‘Já disse que não tenho mais nada para falar com ele. Foi ele quem terminou comigo, não eu quem terminei com ele. Se ele quiser, que venha falar comigo então, e conversaremos...’

‘Vocês dois terminaram o namoro simultaneamente! E você sabe muito bem que ele só fez isso por que acha que você precisa de um tempo para definir se é isso mesmo que quer’

‘E ele já tem isso definido?’

‘Arrisco dizer que desde o dia em que nos conhecemos, vocês se conheceram, ele nunca teve dúvidas do que queria com você’

Deixou a voz ir morrendo aos poucos com a frase para que a menina percebesse o tom misterioso e ao mesmo tempo, definido, que ele queria causar. E causou. Como não sabia o que responder, e não queria continuar nesse assunto, se despediu do amigo e seguiu sozinha para a Avalon se perguntando por que tinha que ser tão teimosa.

°°°

Lavínia,

Sei que andei agindo como um verdadeiro idiota nos últimos meses. Peço desculpas. Minha intenção nunca foi e nunca será a de te magoar. Sinto saudades dos tempos em que você confiava em mim e contava comigo como um verdadeiro irmão, ou amigo. Será que podemos recuperar isso?

Espero que tenha aceitado meu convite para passar o Natal em casa. Mamãe e Leopold finalmente conseguiram tirar férias nos trabalhos e vão viajar juntos. Marcella vai viajar com a família do namorado. E eu, definitivamente, não quero passar esse Natal sozinho. Prometo que vou fazer tudo o que puder para que fiquemos em paz durante esses dias e além, e possamos nos divertir.

Se vier, mesmo, mande uma carta. Vou te buscar na estação de Sofia, no sábado.

Com carinho, Vlade.”

°°°

“Vlade,

Eu também devo desculpas por não ter te dado um tapa quando você verdadeiramente se meteu na minha vida. Mas acho que podemos superar isso, ou o espírito natalino nos fará suportar isso à força.

Até pensei em ficar para o Natal no castelo, mas Durmstrang está embaixo de gelo e não me sinto animada a comemorar a única data do ano onde tudo pode dar certo, dentro de um iglu.

Já que estamos só nós dois para o Natal, por que não ficamos em Sofia mesmo, no seu apartamento? Seria bem triste comemorar em uma casa tão grande quanto a nossa da Irlanda, não acha?

Espero que já esteja providenciando algo legal para a ceia, e cronogramas divertidos. Andei um pouco pensativa e triste essas semanas, mas te conto tudo quando estivermos juntos pessoalmente. Você sabe que eu sempre vou confiar em você como amigo, não sabe? Mesmo sendo um idiota de vez em quando...

Não se atrase para me apanhar na estação. Sabe como sou impaciente com atrasos!

Beijos, Vínia”

Dobrou a carta e esperou a coruja sumir de vista para se deixar cair na cama. Com seu irmão ela poderia esquecer por um tempo da angústia que estava sentindo nas últimas semanas, e quem sabe, recuperar a amizade que tinha com Vlade antes de começarem a brigar interminavelmente. Seria um Natal solitário, no fim das contas, mas apesar de tudo ela pensou que talvez seria um Feliz Natal.

Tuesday, December 11, 2007

Algumas lembranças de Ludmilla Kovac

- Eu não fiz nada de errado, acredite em mim. – dizia Iago me seguindo, enquanto eu andava até o vilarejo. Após uma noite mal dormida, ao me levantar para sair, o encontrei montando guarda na porta da Avalon. Embora estivesse todo arrumado, as olheiras denunciavam que ele não havia dormido. Mas não me importei, pois isso era pouco.
- Deixar-me plantada esperando por você, numa festa surpresa, não é nada sério. E quando você aparece está bêbado e com o colarinho sujo de batom. Não sou tonta Iago.
- Mas está agindo como uma. Quando digo que não fiz nada, eu não fiz mesmo. Só saí com os rapazes para comemorar o aniversário de um amigo.
- Claro, um programa de “homens” do pior tipo. Aposto que a idéia foi sua.
- Não interessa quem teve esta idéia. Mas eu só fiquei lá vendo as garotas dançarem, e pagava como todos, nem percebi quando me beijaram... - ele tentou me segurar, e eu praticamente rosnei de tão irritada:
- Poupe-me dos detalhes sórdidos Iago. – olhei para ele, percebendo algo:
- Então foi por isso que vocês nos atormentaram durante o dia todo para trocar todas aquelas moedas?- e ele ficou vermelho e disse num fio de voz:
- Foi...
- ARGH! Vocês são detestáveis. – eu disse empurrando seu peito.
- Lud, vamos conversar... - ele tentou argumentar, mas eu entrei na livraria e bati a porta com força na cara dele.

Alguns clientes olharam assustados, mas eu não liguei. Se Iago gostava de viver, ele ficaria longe de mim.

A livraria do povoado, tinha um café na parte de cima, onde as pessoas podiam pegar os livros ou revistas da semana para ler ou ficar conversando baixo, enquanto tomavam alguma coisa quente. Era uma área muito agradável e eu resolvi ficar por ali, dando um tempo para que eu me acalmasse e pensasse em algo que fizesse Iago sofrer. Arrumei uma poltrona confortável com dois lugares, perto da lareira e comecei a ler. Algum tempo depois alguém tampou meus olhos e sussurrou ao meu ouvido, me deixando arrepiada:
- Olá!
- Luka! Você é um bobo. – e tirei suas mãos dos meus olhos e me senti estranha.
Desde a nossa “conversa” em Hogwarts, não ficávamos tão próximos. Ele se sentou ao meu lado, e começou a falar sobre o time, discutimos táticas de jogo, e à medida que o tempo passava, e os assuntos iam mudando rapidamente, eu percebi que Luka sabia ser agradável quando queria. Volta e meia ele tocava em meus cabelos ou pegava a minha mão, que eu retirava embaraçada, e mudava de assunto.
- Vou embora, daqui a pouco esfria demais... – comecei a dizer, sem vontade de ir embora, e ele respondeu rápido.
- Eu levo você. - e saímos da livraria, e levantamos nossos casacos para nos proteger do vento frio.
- Acho que seu namorado hoje está descansando depois da noitada, então vou aproveitar pra curtir você. – riu quando fiquei sem graça e perguntei, sem parar de andar:
- Ah é? Quem te contou?
- Moro na mesma república dos novatos e eles têm... Um dom natural pra chamar a atenção. E o fato deles irem para uma noitada é normal, ou você acha que quando o time viaja, ficamos trancados na concentração? Karkaroff já deve ter te contado alguma coisa.
- Iago, não costuma falar do que vocês fazem quando viajam. Só sei que é amigo de Krum. – e a desconfiança que havia começado na noite anterior, agora era presente em mim.
- Ah! Grande Krum, conhece cada... Lugar. - disse rápido e eu estava voltando a ficar irritada. Ficamos andando por um tempo e acabamos mudando o caminho para voltar a república, passando por um beco. Andávamos apressados e de repente, eu tropecei, mas o fato de Luka estar bem próximo fez com que ele me segurasse, estávamos muito próximos. Ficamos nos olhando, e eu sorri, tentando me afastar:
- Pode me soltar, prometo não cair. – não consegui ouvir sua resposta porque ele colou os lábios aos meus. Minha primeira reação foi de choque, depois eu comecei a corresponder ao beijo, e quando me dei conta do que realmente estava fazendo, o empurrei com força:
- Porque você fez isso?- perguntei enquanto recuperava o fôlego.
- Gosto de você! E se você me der uma chance, pode vir a gostar de mim.
- Tenho namorado e gosto dele.
- Você correspondeu ao meu beijo, não negue. - acusou.
- Foi só uma reação instintiva... – falei rápido.
- Pois então não lute contra seus instintos. Fica comigo.
- Não vamos ficar juntos Luka, pare com isso, se gosta de mim. – virei-lhe as costas e saí correndo, como se com isso pudesse apagar os últimos momentos da minha cabeça. Mas eu sabia que não conseguiria mais olhar Luka, sem lembrar do seu beijo ou da sensação intrigante que ele me despertou.

A noite é muito longa,
Eu sou capaz de certas coisas
Que eu não quis fazer.
Será que alguma coisa,
Nisso tudo, faz sentido?
A vida é sempre um risco,
Eu tenho medo do perigo.

N.A. Lágrimas e Chuva, Kid Abelha

Monday, December 10, 2007

Oficina de Artes

1ª Audição para o musical Footloose – 14/12, sexta-feira, 20hs
Teste de Voz
Papéis: Ariel Moore e Ren McCormick
Músicas: Almost Paradise


Nina arrancou o aviso do quadro e me entregou. Então os testes já iam começar, que ótimo. Não havia sequer me preparado psicologicamente para cantar no palco e já teria que fazer o teste de voz se quisesse mesmo tentar o papel de Ariel. Por sorte já estava familiarizada com as músicas graças a Chris, que pegou o filme emprestado com o tio e fizemos uma sessão de cinema na casa dele pouco antes das Olimpíadas. Sentamos no banco e começamos a ler o roteiro do teste quando Micah chegou com o Parker. Ele puxou o papel da minha mão e leu.

‘Fala a verdade, vocês fazem teatro só porque são os créditos mais fáceis que tem, não é?’ Micah e Chris riram e olhamos atravessado para eles. A comemoração do aniversário de Ricard ainda estava entalada na garganta

‘Fazemos as aulas porque gostamos’ Puxei o papel de volta ‘E não tem nada de fácil nas aulas de teatro’

‘Qual a dificuldade de decorar um pedaço de papel e repetir num palco?’ Chris desdenhou e Nina rosnou do meu lado

‘Para fazer as provas também temos que decorar a matéria’ Ela respondeu azeda e Chris deu um sorriso debochado ‘Não vejo vocês fazendo pouco caso disso’

‘Ah, mas vocês não são reprovadas por errar uma fala no palco’ Micah tinha uma resposta para tudo e aquilo me irritava

‘Pois acho mais fácil eu marcar gols no teste para novo artilheiro da Berkana do que você decorar um texto e se apresentar em uma peça’ Respondi provocando

‘Isso é um desafio, lago dos cisnes?’ Ele me encarou meio rindo, meio sério

‘É’ estendi a mão para ele decidida ‘Uma aposta. Vamos ver quem leva a melhor’

‘Fechado. Chris, que dia são os testes da Berkana? Temos que reservar essa tarde e não comer muito, pois podemos passar mal de tanto rir’

‘Muito engraçado’ Puxei uma pilha de papel da mochila e larguei na mão dele ‘Mas é melhor se preocupar menos com o meu teste e ocupar seu tempo decorando isso. A audição é dia 14, e é um teste de voz’ Ele arregalou os olhos e ri ‘Espero que tenha o costume de cantar no chuveiro’

Nina levantou do banco e saímos rindo, deixamos os dois parados encarando as músicas e instruções para participar dos testes para Ren McCormick. Sabia que aquilo não chegava nem aos pés de causar neles a revolta que sentimos ao saber onde estavam no aniversário de Ricard, mas que era uma sensação boa, ah era...

~*~*~*~*~*~

‘Evie, você precisa voar COM a goles’ Milla gritou no meu ouvido ‘Como pretende marcar gols, se não está segurando ela?’

‘Não consigo me equilibrar na vassoura E proteger uma goles ao mesmo tempo! Ou faço uma coisa, ou faço a outra’

‘Então Micah vai ganhar a aposta. Não é possível jogar assim’

‘Passa isso pra cá!’ Tomei a goles da mão dela e elas riram

Estávamos no campo de quadribol há horas e não tinha feita muita evolução. Era péssima nisso, mal sabia voar. Mas graças à paciência das meninas, estava progredindo aos poucos. Vina estava na arquibancada assistindo, Nina jogava como artilheira comigo, Milla era a batedora e Annia estava fazendo o papel de goleira, voando de um lado a outro dos aros imitando Micah para me provocar. Estava tão convincente que começava a ficar com raiva dela.

Concentrei-me para conseguir manter o equilíbrio na vassoura segurando o cabo com apenas uma das mãos e Nina atirou a goles para mim. Consegui pegar de primeira e a prendi contra o corpo, mirando em Annia. Ela continuava imitando ele, agora dizendo que perderia a aposta, pois não sabia sequer voar direito. Senti o sangue ferver lembrando a cara debochada dele quando eu disse que ia fazer o teste para artilheiro e acelerei a vassoura. Quando já estava bem próxima lancei a goles com toda força que consegui e Annia não conseguiu nem chegar perto de agarrá-la, deixando passar pelo aro do meio.

‘Engole essa, idiota!’ Gritei empolgada erguendo os braços, mas logo agarrei o cabo da vassoura com medo de cair

‘Excelente Evie!’ Milla voou para perto de mim batendo palma ‘Apenas repita isso no dia do teste e ele vai morder a língua’

‘Certo. Mas preciso de mais um pouco de treino. Vamos de novo!’

Annia lançou a goles para Nina outra vez e recomeçamos. Já estava escurecendo quando deixamos o campo, mas valeu à pena. A vaga de artilheiro eu não conseguiria nunca, e nem tinha essa pretensão, mas ao menos ia calar a boca daquele idiota. E aí era só sentar e rir do teste de voz dele para o musical...

Mesmo depois de comermos e bebermos exageradamente, nenhuma de nós conseguiu pregar o olho ao lembrarmos que os meninos haviam se organizado para uma comemoração exclusiva do aniversário do Ricard e nos ignorado. Mas mesmo tendo consciência que minhas amigas estavam todas acordadas, cada uma de nós havia deitado em sua própria cama e agora curtia o silêncio e escuridão à volta, esperando por um mínimo sinal que indicasse que eles haviam voltado. O sinal apareceu um par de horas depois... Primeiro, eu me peguei acordando de um cochilo, mas Annia se sentou na cama parecendo alarmada.

‘Que barulho é esse?’

Foi instantâneo: todas nós nos sentamos também prestando atenção. Um par de vozes masculinas, altas o suficiente para fazerem eco, e parecendo bastante risonhas se aproximava. Estávamos tentando descobrir a quem pertenciam, mas não foi preciso muita paciência. Em menos de dois minutos, o lado de fora da janela do quarto explodiu em melodias descompassadas e gritantes.

If I had to live my life without you near me
The days would all be empty
The nights would seem so long
With you I see forever… Oh so clearly
I might have been in love before
But it never felt this strong
Our dreams are young and we both know
They’ll take us where we want to go
Hold me now
Touch me now
I DON’T WANT TO LIVE WITHOUT YOOOOOOOOU

‘Esse é, claramente, o Victor!’ Evie disse já soltando uma gargalhada alta e pulando da cama.

Corremos todas até a janela. Victor e Iago eram os causadores da música e embora estivessem descabelados, com as roupas amarrotadas e COMPLETAMENTE bêbados, se apoiavam um no outro e cantavam. Não tivemos coragem de interromper. Nos dividíamos entre o choque, as risadas e a ira. Sentimentos divergentes demais para que qualquer atitude fosse tomada.

Nothing’s gonna change my love for you
You ought to know by now how much I love you
One thing you can be sure of
I’ll never ask for more than your love
Nothing’s gonna change my love for you
You ought to know by now how much I love you
The world may change my whole life through but
Nothing’s gonna change my love for yooooou

Quando eles finalmente pararam de cantar, de braços abertos, e começaram a rir descontroladamente, eu troquei olhares com todas as minhas amigas. Milla foi a primeira a fechar a cara e tomar uma iniciativa para conversas...

‘MUITO BONITO SR. KARKAROFF! MUITO BONITO! O SENHOR SAI SEM ME DAR SATISFAÇÕES E DEPOIS VOLTA BÊBADO, AMARROTADO, E DESAFINADO?’

If the road ahead is not so easy
Our love will lead the way for us
Like a guiding star’

Iago recomeçou a cantar agora olhando para Milla com os braços abertos estendidos para ela, que cruzou os próprios braços fazendo um bico. Victor se virou para mim e continuou a cantoria.

I’ll be there for you
If you should need me
You don’t have to change a thing
I love you just the way you are
So come with me and share the view
I’ll help you see forever too
Hold me now, touch me now
I don’t wanna live without you!
Nothing’s gonna change my love for you…’

‘CHEGA’ gritei finalmente e antes que os dois tomassem ar e continuassem o refrão, murcharam e ficaram me olhando assustados. ‘Vocês dois estão ridículos aí embaixo cantando e acordando todos. Subam aqui, precisamos conversar!’

Virei às costas seguida de minhas amigas. Milla fechou a janela com violência e nos sentamos esperando que eles subissem, em silêncio. Quando bateram na porta, Nina abriu. Parecia a mais tranqüila de todas nós. Ficaram parados na porta nos encarando com sorrisinhos simpáticos. Iago veio andando na direção de Milla, pronto para abraçá-la, mas ela foi mais rápida e o empurrou pra longe.

‘Não se aproxime de mim!’

‘Não gostou da serenata, Milla?’ Ele perguntou parecendo assustado com a repulsão da menina. Ela não respondeu, mas o bombardeou de perguntas.

‘Onde vocês estavam? O que estiveram fazendo? Onde estão os outros? QUE MARCA DE BATOM VERMELHO É ESSA NO SEU COLARINHO?’ Ela correu até ele e agarrou o colarinho da camisa dele tremendo de raiva e o olhando com nojo. Victor riu e respondeu por Iago, que parecia estar encantado ao ver aquela marca de batom tão perto de seu pescoço.

‘Fomos comemorar o aniversário do Ricard, é claro! Não é todo dia que se faz 17 anos! Então, para data especial, comemoração igualmente especial: fomos até a boate do vilarejo, com dançarinas, e pagamos uma para Ricard de presente! Ty, Micah e Parker ficaram por lá também. Já se arrumaram essa noite... Quanto à marca, não posso te responder se foi feita pela professora ou pela dançarina de dança do ventre. As duas estavam cercando a mim e Iago, não era?’ Victor respondeu e soltou uma gargalhada prazerosa ao se lembrar, mas um véu de tensão e ódio desceu no quarto e um segundo depois vários berros de indignação foram proferidos por cada uma de nós.

‘VOCÊS O QUÊ?’

‘O RICARD VAI DORMIR COM UMA DANÇARINA?’

‘EU NÃO ACREDITO QUE O MICAH É TÃO BAIXO!’

‘E O TY TEM QUE SE REBAIXAR A ESSE NÍVEL? IMBECIL’

‘PARKER ESTÁ TÃO ENCALHADO A ESSE PONTO?’

‘PROFESSORA E DANÇARINA DE DANÇA DO VENTRE TE CERCANDO? ELAS TE BEIJARAM SÓ NO PESCOÇO, OU A SUA FESTINHA FOI MAIS RÁPIDA, IAGO?’

Sem querer, Victor percebeu que havia jogado bomba de bosta para todos os lados. A confusão estava armada. Milla chutou Iago aos berros para fora do quarto enquanto eu exigi que Victor tivesse ao menos um mínimo de caráter e me poupasse o trabalho de lançá-lo pela janela. Saiu logo atrás. Se antes da revelação, não tínhamos sono, depois dela se tornou impossível dormir. Eu queria que o dia amanhecesse o mais rápido possível.

°°°

‘Você é ridículo!’

Mal esperei Ricard, Micah, Ty e Chris entrarem nos terrenos da escola com as camisas desabotoadas, gravatas frouxas, cabelos amassados e sorrisos largos e marchei até o encontro deles jogando os dois braços contra o peito de Ricard e o empurrando com força.

‘Baixo, imundo e sem consideração!’

‘Nossa, começamos bem o dia de hoje!’ Ricard falou cínico e riu. ‘É claro que eu não esperava um “Feliz aniversário, Ricard!” ou ao menos um “Bom dia!”. Seria educado demais para você, não é?’

‘Como você pôde me deixar plantada na República, fazendo papel de idiota, com bolo de aniversário, chapéu cônico, doces e bebidas? Tinham até dezessete velas em cima do seu bolo! Não se deu nem ao trabalho de me avisar que iria comemorar do seu jeito medíocre!’ Eu gritei e Ricard arregalou os olhos surpreso, mas então começou a rir.

‘É sério que você fez festa surpresa?’

‘Por que eu estaria mentindo?’

‘Posso saber então porque não fez para hoje, que é o dia do meu aniversário de fato?’

‘PORQUE SERIA MUITO ÓBVIO E EU TIVE MEDO DE VOCÊ JÁ TER OUTROS PLANOS PARA HOJE!’

‘Você sabe que eu prezo o óbvio! Sai com os meninos ontem, porque hoje queria comemorar com todos vocês... E se avisássemos aonde iríamos ontem, vocês armariam um escândalo. Mas fique sabendo que o nosso “jeito medíocre” de comemorar fez desse o melhor aniversário da minha vida, até hoje!’

‘Ótimo. Fico feliz. Então fique com suas dançarinas.’

Me afastei marchando, mas não tão rápido a tempo de não escutar a resposta baixa de Ricard.

‘Estarei em ótimas companhias, obrigado.’

Os outros riram e eu fiz questão de sair dali o mais depressa possível. Mesmo que eu tentasse manter uma amizade tranqüila com Ricard, ele não abriria mão de certas pessoalidades e eu nunca assumiria uma posição neutra com relação a elas. Seria um ciclo de brigas sem fim e eu sabia que carregaria isso para o resto da vida...

N.A.: Nothing’s gonna change my love for you – Air Supply

Friday, December 07, 2007

‘Eu tenho 3.451 nuques’ Victor terminou de contar as últimas moedas de bronze ‘Alguém tem 7 galeões ai?’

‘Como você conseguiu juntar 3.451 moedas??’ Perguntei espantado e ele riu

‘Sabe quando você vai colocando no fundo do malão porque tem preguiça de contar e passar adiante? Soma isso há 5 anos de estudo, e está respondida sua pergunta’

‘Eu tenho 204 sicles, isso dá 12 galeões! Acha que dá, Ty?’ Ricard contava as moedas de prata ainda sem graça, mas sem conseguir disfarçar a ansiedade

‘Claro que dá, Ricard! Relaxa, vai ser divertido’ Ty guardou os galeões que já havia trocado no bolso e colocou as outras moedas no saco

‘Mas não adianta nada trocarmos isso entre a gente, todos precisamos de galeões. Será que as meninas topam trocar?’ Chris Parker separava as suas e sugeriu esperançoso

‘Contanto que elas não saibam o porquê, acho que trocam sim. Mas não podemos chegar lá com Nuques, vamos ser expulsos’

‘Já estão com tudo separado?’ Iago ficou de pé com uma bolsa pesada de moedas de nuques e sicles ‘Vamos procurá-las logo, daqui a pouco escurece e vamos acabar nos atrasando’

‘Calma Yeti’ Levantei também e dei dois tapinhas nas costas dele ‘Sei que está tenso, mas relaxa. Não vamos perder nem um segundo sequer...’

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‘Vamos lá Ricard, olhe com atenção e escolha, hoje você é o REI!’

Bati nas costas dele e Ricard derramou o drinque que segurava. Estávamos numa boate do vilarejo sentados em uma mesa de frente para a passarela, vendo várias strippers rebolarem e se insinuarem para a gente. Já passava da meia noite, então Ricard agora era maior de idade e essa tinha sido a comemoração mais votada para uma data tão especial. Afinal, 17 anos só se faz uma vez na vida! Uma dançarina ruiva com uma roupa provocante de professora primária escorregou no poste mais próximo e piscou pra Ricard. Vi ele virar o copo vazio na boca depressa e engolir a cereja, engasgando.

‘Calma rapaz! Não vá ter um enfarte aqui’ Ty deu um soco nas costas dele rindo e Ricard alisou a garganta ‘Vai estragar nossa noite, não seja egoísta’

‘E então, aniversariante? Já escolheu o presente?’ Parker pediu mais uma dose de whisky de fogo e botou um galeão na bolsa presa na calcinha da dançarina que o atendeu ‘Podemos providenciar também um laço dourado, se fizer questão’

‘Não sei bem’ Ricard falou meio gago e rimos ‘Vocês têm certeza que isso foi uma boa idéia? E se algum professor estiver aqui hoje?’

‘Ah não, você só pode estar de brincadeira!’ Olhei para ele incrédulo e estalei o dedo olhando para trás. Na mesma hora uma dançarina loira vestida de enfermeira surgiu do nada e apontei para ele. A loira alisou o rosto dele com delicadeza e sentou em seu colo, beijando seu pescoço

‘Hora de conhecer o outro lado da boate, galera’ Victor pegou o copo da mesa e pagou a dançarina do mesmo jeito que Parker e saímos de fininho.

Ricard estava tão ocupado tentando não desmaiar enquanto a enfermeira cuidava dele que não percebeu que nos afastamos. Já estávamos bem distantes quando vi a loira tirar a temperatura da testa dele e depois puxar um pirulito do bolso, enfiando na boca dele e puxando de volta, quase o engolindo ao colocar na própria boca. A vontade geral era de rir, e muito. Mas resolvemos deixar isso para o dia seguinte, quando fosse preciso contar a ele o que aconteceu. Pela quantidade de whisky que ele estava consumindo, esqueceria de alguns detalhes mais marcantes.

Logo encontramos outra mesa para sentar e assistir o restinho do show, que se aproximava do fim. Iago era o mais contido, se limitando a beber pouco e distribuir os galeões com satisfação, mas sem aceitar a provocação de nenhuma das garotas. Quanto a nós... Bem, acho seguro dizer que a maioria das dançarinas fez algum tipo de dança particular para cada um, e logo já tínhamos escolhido cada um a sua favorita, reservando a conversa fiada só pra elas. Victor falava embolado com duas delas, acho que contava alguma história, e dava beijo na bochecha das duas alternadamente. Ty estava falando ao pé do ouvido com uma morena vestida de policias e ela empurrava as mãos dele para trás da cadeira, tentando prendê-las com algemas de pelúcia. Parker dançava no palco com uma garota de cabelos castanhos vestida de advogada e já estava com os bolsos zerados de galeões, todos depositados na bolsa dela.

Quanto a mim, eu estava deitado numa cadeira reclinável com uma morena de cabelos bem escuros e roupa camuflada deitada por cima de mim, mordendo minha orelha. Ela falou alguma coisa baixo em tom de ordem e levantamos, subindo as escadas do fundo da boate. Aquela ordem da minha General jamais poderia ser desacatada. Antes de subir vi que Iago tentava avisar aos garotos que estava indo embora, e vi quando Victor saltou da cadeira e estufou o peito para dizer que ia também, trocando as pernas. Ricard já havia desaparecido há tempos e era uma questão de minutos para Ty e Parker passarem por essas escadas. Essa era uma comemoração que Ricard jamais esqueceria, sem sombra de dúvidas...

And if you say this life ain’t good enough
I would give my world to lift you up
I'd change my life to better suit your mood
Cause you’re so smooth...

Santana - Smooth

Thursday, December 06, 2007

O último andar da República Avalon era o único que mantinha uma réstia de luz acesa àquela hora da noite. No quarto, a fonte de luz se originava de uma lamparina pousada na mesa de cabeceira de uma das ocupantes: uma menina pálida, de olhos verdes escondidos atrás de óculos, e longos cabelos loiros que caíam em seus ombros. Lavínia Durigan. Ela folheava um pesado livro de Transfiguração, mas as palavras já passavam por sua cabeça sem se fixar em lugar algum. Ao seu redor suas amigas respiravam fundo e dormiam profundamente.

“Para se transformar um gato em um relógio cuco, o praticante deve se concentrar nos movimentos firmes da varinha...”.

Fechou o livro com violência. Estava se sentindo exausta. Sabia que não conseguiria terminar aquele relatório naquela noite. Não enquanto não tirasse ao menos algumas horas de sono... Jogou o livro de lado e se levantou para trocar de roupa. Mas antes que pudesse alcançar o armário, antes mesmo de qualquer outra coisa, seus olhos se detiveram no calendário preso no meio do quarto e ela sentiu uma terrível sensação de desconforto quando viu o quadradinho do sétimo dia de dezembro assinalado com flechas vermelhas e os dizeres “Aniversário do Ricard, 17 anos”. Se ela não tomasse uma providência, esse seria o primeiro aniversário (desde o ano em que se conheceram), que ela e Ricard passariam brigados. E a perspectiva disso fez com que a menina tomasse uma decisão...

°°°
‘Srta. Durigan, terá de treinar um pouco mais a sua transfiguração... ’ Ivana Mesic passou ao lado da carteira de Lavínia pousando os olhos sobre o relógio cuco com um grande rabo peludo e orelhas de gato. A menina se sentiu queimar.

‘Eu sei. Desculpa professora. Vou praticar mais. ’

A professora a encarou com severidade e passou. Ela se sentiu desabar. Era incontestável o fato de que seu rendimento escolar andara caindo muito desde que brigara com Ricard e terminara seu namoro com Victor. Ela nunca admitiria culpa em nenhuma das separações, mas sabia que precisava voltar atrás, de alguma maneira.

‘Está tudo bem, Vina?’ Nina perguntou baixo tirando os olhos de seu relógio cuco impecavelmente transformado e encarando a amiga com curiosidade. Lavínia sacudiu os ombros.

‘Está, obrigada. Só estou um pouco cansada e acho que não fixei os movimentos dessa transformação’

A sineta da aula tocou e ela demorou um pouco mais do que o natural para juntar suas coisas e sair da sala. A verdade é que queria um tempo sozinha. Mas nem tinha alcançado o corredor e uma voz tão familiar chegou aos seus ouvidos que ela quase não se sustentou.

‘Você é mesmo muito orgulhosa, Lavínia Durigan’ era Ricard. Seu motivo de maior aflição naquela semana. Ela queria tanto correr para lhe abraçar forte e dizer que sentia muito... Como faria isso sem parecer frágil e dependente demais?

‘Do que você está falando?’

‘Estou falando dessa sua cabeça dura! Está estampada na sua testa a frase: “Sinto muito Ricard, por ter sido uma idiota. Será que você pode me desculpar? Podemos ser amigos de novo, porque eu estou sentindo muito a sua falta!”. Por que você não diz? Por que simplesmente não admite, UMA VEZ NA VIDA, que a briga foi sua culpa. Que estamos sem nos falar por que você quis assim?’

Ela não sabia o que responder. Ele tinha tirado da boca e da cabeça dela exatamente as mesmas perguntas que estivera se fazendo há semanas.

‘Sinto muito, Ricard. Eu realmente agi como uma idiota com você, com a Miyako. Eu já me arrependi muito por isso, de verdade’ ela disse espontaneamente, mas pesando cada palavra. Ricard também as sentiu.

‘Você disse mesmo que sente muito? Que está arrependida? Que a culpa foi sua? Tem certeza que está se sentindo bem?’ Ele perguntou incrédulo se aproximando dela, que foi obrigada a rir.

‘Não me faça repetir tudo de novo, ok? Você sabe o quanto isso já está sendo difícil para mim...’

‘Sei, sei sim. Pedir desculpas nunca foi do seu feitio. Nem errar uma transformação considerada simples...’

‘Não é de meu feitio passar o seu aniversário da “maior idade” sem falar com você. Eu já estava enlouquecendo!’

‘Então vamos passar uma borracha definitiva em cima disso, tudo bem? Mas com uma condição: eu escolho minhas namoradas.’

‘Feito’ ela concordou rindo e se largou no ombro dele, enquanto ele a abraçava apertado. Por mais que ela aprontasse e bagunçasse a vida dele, ele nunca poderia negar: não conseguiria viver longe dessa menina.

°°°
‘Tudo pronto’ Milla disse olhando ao redor. A sala de estar da República Osíris estava toda decorada com balões e serpentinas coloridas. Uma mesa com bolos e doces também havia sido preparada.

‘Ainda bem que terminamos tudo antes de Ricard voltar... Festa surpresa só tem graça se for surpresa mesmo!’ Lavínia sorriu satisfeita colocando um chapéu cônico na cabeça. Consultou o relógio. ‘Eles devem estar aqui a qualquer momento...’

‘Espero que sim. Estou com fome’ Evie comentou olhando desejosa para a mesa de doces.

Sentaram-se. O plano da festa surpresa havia partido, é claro, de Lavínia. Mas logo suas amigas acataram e a ajudaram a preparar tudo no mais absoluto sigilo. Não tinham comentado nem mesmo com Micah, Ty, Iago, Victor ou Chris Parker. Sabiam que qualquer deixa seria o suficiente para Ricard descobrir tudo alguns dias antes. E esperaram... Não se passaram apenas alguns ‘momentos’ como Lavínia imaginou que passariam. Passaram-se vários minutos, que se transformaram em horas.

‘Não agüento mais esperar! Onde eles estão?’ Annia levantou impaciente indo até a janela. ‘A Spartacus também está toda escura! Eles não devem estar aqui no castelo...’

‘É claro que estão no castelo! Onde mais estariam?’ Evie perguntou depressa acompanhando Annia em uma vistoria dos terrenos pela janela. Estavam desertos. Olhem ali, é o Chris! ‘CHRIS!!!’

Seu grito fez eco nos gramados escuros e gelados do castelo. Um garoto loiro parou de chofre quando estava prestes a entrar na República escura e se virou. Ao ver Evie pendurada na janela, correu sorridente até a garota.

‘Oi Evie. Oi meninas. O que estão fazendo aqui? A Avalon fica do outro lado, não fica?’

‘Sabe nos dizer onde estão Ricard, Victor, Ty, Micah, Chris Parker, Iago ou qualquer um desses?’ Evie perguntou ansiosa ignorando a curiosidade de Chris. Ele sacudiu os ombros.

‘Os vi quando estava saindo da aula de Astronomia. Os ouvi comentarem de irem até o vilarejo comemorar o aniversário de alguém... Aconteceu alguma coisa?’ Perguntou quando percebeu os olhares estressados e flamejantes que as meninas trocaram.

‘Tem certeza? Todos eles foram ao vilarejo?’ Milla perguntou devagar, querendo ter certeza do que estava de fato acontecendo.

‘Não os vi saindo, mas estavam todos juntos sim. De quem é o aniversário?’

‘Ricard. Mas esse é o último aniversário da vida dele, espero que aproveite muito!’ Lavínia disse tremendo de raiva e arrancando o chapéu com violência.

‘E eu juro que mato o Iago. Ah, mato!’

‘Pois eu é quem não vou ficar plantada aqui esperando esses idiotas voltarem. Vamos levar tudo para a Avalon e podemos fazer nossa própria festa!’ Evie disse tentando transparecer indiferença e um surto de animação, mas a tentativa falhou. Seus olhos também brilhavam de raiva.

‘Isso, boa idéia. Ótima idéia!’ Nina se levantou parecendo carrancuda e ajudou a amiga a recolher os doces na mesa.

Poucos minutos depois saíram com os braços carregados de doces e garrafas de whisky de fogo e cerveja amanteigada. Trancaram a porta do quarto e cada uma se sentou em sua própria cama, com uma garrafa na mão e um bom pedaço de bolo de aniversário, que fora generosamente fatiado. Annia levantou sua própria garrafa encarando as amigas.

‘Um brinde à nossa festa, e à nossa noite, que será muito mais divertida que a dos garotos.’

Todas levantaram suas garrafas e tomaram um gole em seguida. Passaram horas bebendo, comendo doces e falando mal dos homens. Tinham vários planos de vingança arquitetados, mas no fundo todas elas sabiam que nenhum deles atingiria qualquer um dos meninos como essa saída privada ao vilarejo tinha afetado todas e cada uma delas...