Ivana Karev chamou todos os netos da varanda, carregando Alexis no colo enquanto fazia a contagem dos que iam passando por ela. Parvati, Jack e Julie foram os últimos a entrar, ainda pendurados nos braços do avô Georgi. A mesa da sala, enorme, estava toda ocupada com bolos, pães de todos os tipos, sucos, leite e café, para os netos mais velhos que sempre pediam para experimentar.
- Kurt não está aqui – Ivana observou recontando os netos sentados na mesa, atacando os bolos.
- Karl, onde está seu irmão? – Georgi perguntou ao neto mais velho. Karl era o líder dos primos, com seus poucos 13 anos.
- Disse que ia dar comida ao Rambo – Karl respondeu dando de ombros, com um pão doce inteiro na boca.
- Ah, ai está ele – Ivana apontou para a porta aliviada, mas seu semblante logo mudou quando viu que o neto de 7 anos estava chorando – Kurt, querido, o que houve?
- Rambo fugiu! – ele abraçou a avó aos prantos – Fui levar um pedaço de bolo pra ele e a coleira estava arrebentada.
- Fique calmo, baixinho, Rambo deve ter saído para um passeio na floresta, logo ele volta – seu avô tentou acalmá-lo, abaixando ao seu lado para ficarem no mesmo nível.
- Mas já está escurecendo, e se ele não achar o caminho de volta?
Como se tivesse sido planejado, um trovão fez o chão da casa tremer no instante que Kurt terminou de falar. Logo depois um relâmpago iluminou a sala e todos saltaram assustados na mesa. Kurt olhou para a avó com uma expressão que era de puro terror e Georgi ficou de pé.
- Não se preocupe, nós vamos encontra-lo. Karl, engula esse pão doce e me ajude a organizar grupos de busca. Vamos trazer seu cachorro de volta antes da chuva cair.
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- Parvati? – a voz de Lukas a trouxe de volta a realidade – Chegamos, não vai descer?
Parvati abriu os olhos e estava outra vez dentro do carro de seu pai, sentada ao lado de Lukas e Mason no banco de trás. Estavam parados do lado de fora do portão da mansão dos Lusth, o manobrista aguardando para levar o carro. Seus tios, com Julie, saíram do carro de trás. Seu pai lhe entregou as chaves e logo apareceu alguém do cerimonial para acompanha-los até a mesa. O casamento seria na própria casa, que era grande o bastante para a festa. Todo o jardim estava decorado com tulipas brancas, mas foi quando se aproximaram da parte dos fundos que viram a decoração completa.
Um espaço para a cerimonia havia sido montado em uma parte de destaque do jardim, com um altar improvisado e espaço suficiente apenas para os casais de padrinhos, o restante dos convidados deveriam assistir de suas mesas, que estavam montadas próximas à área. Cada mesa comportava dez pessoas e também tinham como arranjo um lindo buquê de tulipas. Parvati se acomodou com seus pais em uma das mesas mais próximas ao altar, junto de seus tios. Julie não sentou com eles, preferiu se juntar à mesa ao lado, que estava sendo ocupada por Lucian, seu irmão e seus pais, Finn e sua mãe e Lenneth e seus pais. Os gêmeos Karpov estavam sentados com a família, do outro lado do jardim. Apenas acenaram de longe ao verem os amigos, mas não podiam ir até eles antes da cerimônia.
- Você viu a Leo? – Parvati perguntou a Lukas, mas sua pergunta foi respondida antes que ele pudesse olhar em volta.
Leonora chegou acompanhada de Mitchell e sua família. Eles vinham de braços dados, como um casal, e sentaram na mesa atrás da dela. Leo piscou quando passou por Parvati, mas não podia sentar com eles naquele momento. Parvati já estava quase ligando para Robbie quando viu o amigo chegar ao lado dos pais, muito elegante em um terno de risca de giz. Sempre muito sério quando estava na presença do pai, Robbie ocupou uma cadeira vaga ao lado de Parvati e seus pais ocuparam as duas últimas duas vagas da mesa ao lado de seus tios, cumprimentando a todos com educação. A família de Leonora também estava presente, mas sentados em uma mesa afastada, um claro sinal de que não estavam junto da garota.
- Viu isso? - Parvati indicou a mesa de Leo para ele – Acho que era essa a novidade que ela só queria contar pessoalmente.
- Sim, Mitchell me procurou antes do Natal querendo saber o que a Leo tinha com o Damon – Robbie cochichou de modo que só a amiga podia ouvir – Estava se rasgando de ciúmes, mas obvio que não admitiu.
- Então parece que é sério – Parvati abriu um sorriso – Você me deve 5 galeões.
- Pago depois, já vai começar o casamento.
Ele apontou para o altar, onde o padre havia acabado de aparecer e uma música anunciou que a cerimônia estava prestes a começar. O noivo, Joffrey, entrou primeiro com sua mãe. Usava uma farda da Marinha muito bonita, exibindo com orgulho sua patente de Tenente-Coronel das Forças Armadas Búlgara. Quando eles chegaram ao altar, começou a entrada dos padrinhos. Eram quatro casais para cada e do lado da noiva, todos os seus irmãos estavam presentes. Ozzy foi o primeiro deles a entrar, acompanhado de uma garota morena que aparentava ter a sua idade. Katarina entrou por último, de braços dados com seu pai. Estava linda em um vestido branco tomara que caia, bem simples, mas lindíssimo, com tulipas bordadas em todo o comprimento da saia.
A cerimônia foi curta e bonita. Sem enrolação demais, o padre fez algumas brincadeiras para descontrair, passou pelas partes de praxe e em menos de vinte minutos os padrinhos escolhidos para servirem de testemunhas já estavam assinando o livro. Ozzy foi o escolhido por Katarina, enquanto Joffrey escolheu a madrinha devia ser sua irmã, pela semelhança. Os dois voltaram aos seus lugares e o padre autorizou o beijo, encerrando a cerimônia.
Todos continuaram em suas mesas enquanto o jantar era servido e os noivos passavam em uma de cada vez para falar com seus convidados. Quando tudo isso acabou, Parvati puxou Lukas e Robbie para fora da mesa, tirou Leo e Mitchell da mesa de seus pais e encontrou uma vazia para ocuparem. Não demorou muito e Lucian, Finn, Lenneth, Julie, Oleg e Alec se juntaram a eles. Seus pais, se vendo seus os filhos, rapidamente se juntaram também e engataram em um animado bate papo. Edgar tirou Lawfer da conversa de adultos e Mason logo encontrou alguns amigos da mesma idade, desaparecendo entre os convidados.
O clima na mesa estava estranho. Leo agora estava namorando Mitchell, oficialmente, e Finn não gostou da novidade. Lançava olhares rancorosos aos dois de tempo em tempo, parando sempre que Oleg lhe dava uma cotovelada. Lucian e Lenneth ainda estavam distantes. Sem se falar desde a apresentação no vilarejo, ele tentava agir como se tudo estivesse normal, mas não estava tendo muito sucesso. Robbie também não estava relaxado. Mesmo Alec lhe pedindo para não dar atenção às pessoas, não parava de olhar na direção da mesa dos pais para saber o que estavam fazendo. Ele nunca ficava a vontade com o pai por perto. As coisas já estavam estranhas na mesa, mas piorou quando Ozzy apareceu. Estava acompanhado da garota que entrou com ele no altar e puxou duas cadeiras da mesa ao lado, sentando com os amigos.
- Pessoal, aos que ainda não conhecem, essa é a Jane – disse apontando para a garota, que sorriu simpática e acenou para as pessoas na mesa – Bom, tirando Alec, Oleg, Lenneth e Lucian, que você já conhece, esses são Julie, Robbie, Parvati, Lukas, Leonora, Mitchell e Finn. Todos estudam comigo.
Ela cumprimentou a todos e de repente todas as atenções da mesa estavam voltadas para ela. Os que já a conheciam queriam saber como havia sido o ano, os que haviam acabado de conhecer queriam saber mais ao seu respeito. Em questão de minutos Parvati se viu sendo a única a não demonstrar um interesse fora do comum na garota. Ela não estava certa do que estava acontecendo, mas sem dúvida era estranho.
- Com licença, preciso atender isso – Lukas levantou da mesa quando seu celular tocou e Parvati aproveitou para puxar Robbie para perto dela.
- Quem é essa Jane, que eu nunca ouvi falar? – falou baixo para só o amigo ouvir, mas Leonora já estava atenta do outro lado – O que tem de tão interessante nela, que todo mundo está lhe enchendo de perguntas?
- Merlin mulher, seu namorado está logo ali, controle-se! – ele brincou e Parvati lhe lançou um olhar feio, procurando apoio em Leo.
- É Parv, qual é, está ficando evidente – o apoio não apareceu.
- Ah por Merlin, não comecem! Só perguntei quem ela é, estou curiosa com o interesse geral.
- Aham, sei. Quem não te conhece que te compre, querida – Robbie fez uma de suas caretas habituais e Leo riu.
- Ok, se não dá pra falar sério, deixa pra lá – ela levantou e saiu atrás de Lukas.
- Ela cai tão fácil na pilha ultimamente – Leo comentou ainda rindo quando a amiga se afastou – Mas sério, também não entendi todo mundo interrogando a pobre da garota.
- Nem eu, mas depois pergunto ao Alec quem ela é. Vamos deixar a Parv sofrer mais um pouco.
Os dois riram e voltaram à atenção aos seus namorados, quando uma musica mais lenta começou a tocar na pista de dança. Oleg levantou e convidou uma das damas de honra que estava passando para dançar. Mitchell prontamente ficou de pé, estendendo a mão a Leo. Os dois saíram juntos e foram seguidos por Ozzy e Jane e Alec e Robbie. Finn levantou também, estendendo a mão a Julie, que aceitou. Lucian ficou sem alternativa quando se viu sozinho na mesa com Lenneth e a tirou para dançar. O clima entre eles era o mais romântico possível, mas nenhum dos dois admitia e faziam o possível para não deixar transparecer mais do que já estava claro.
- Algum problema? – Parvati perguntou se aproximando de Lukas.
- Sinto muito, vou ter que ir embora – ele parecia realmente chateado – Era o meu agente, tenho que estar no centro de treinamento em uma hora para um confinamento. Tenho que ir para casa pegar minhas coisas e conseguir uma chave de portal pro Canadá. Você me perdoa por abandona-la no meio do casamento?
- Tudo bem, não tem problema. Nem ao menos esperava que fosse poder vir, já estou satisfeita que pode ao menos assistir a cerimonia.
- Você é a melhor – ele a beijou carinhoso – Vou me despedir dos seus pais antes de ir. Assim que tiver uma folga venho lhe visitar, prometo.
Lukas a beijou outra vez e se afastou, indo se despedir de seus pais. Parvati decidiu não acompanhá-lo, tampouco voltar para a mesa. Se fosse ficar sozinha, preferia que fosse em um dos bancos espalhados pelo jardim. Dele tinha uma boa visão da pista de dança, onde seus amigos ainda estavam. Viu Lucian e Lenneth dançarem com os rostos colados, ambos de olhos fechados, lutando para resistir à tentação de se entregar ao que sentiam um pelo outro. Viu Leo com um olhar apaixonado nos braços de Mitchell, sem perceber os olhares magoados vindos de Finn, que dançava a poucos passos de distancia com Julie. E Robbie, sempre tão reservado quando estava perto do pai, dançava abraçado a Alec sem se importar com os olhares de censura. Parvati notou que o Sr. von Hoult os observava, mas não exibia uma expressão zangada. Não estava feliz também, mas parecia conformado. Sem duvida o sorriso de sua esposa, que segurava sua mão com firmeza, estava ajudando naquela fase de aceitação.
Sua atenção de repente se voltou para Ozzy, que estava próximo a Oleg e sua dama de honra. Ele dançava com Jane e ambos tinham sorrisos radiantes no rosto. Não estavam de rosto colado, mantinham distancia e conversavam o tempo inteiro, mas sempre exibindo um sorriso. Estavam se divertindo, sem dúvida. Parvati sentiu um pouco de inveja, queria estar dançando também ao invés de estar sentada de fora, apenas assistindo. A dança dos dois foi interrompida pela chegada de um rapaz loiro um pouco mais alto que Ozzy, com um terno azul marinho. Depois de algumas palavras rápidas, mais sorrisos e um caloroso aperto de mão seguido de um abraço, Ozzy se afastou e Jane começou a dançar com o rapaz, agora com mais intimidade. Antes que Parvati pudesse ver para onde Ozzy tinha ido, os dois já estavam se beijando.
- Por que está aqui sozinha? – ela se assustou quando viu que Ozzy já estava sentando ao seu lado no banco – Perdeu o Lukas?
- Ele precisou ir embora, algo sobre um confinamento e estar no Canadá em uma hora. Perdeu a namorada para o bonitão?
- Quem, Jane? – ele riu com gosto – Ela não é minha namorada, é minha prima. O “bonitão” é Loki, seu namorado.
- Desculpa, mas vocês estavam tão íntimos, pareciam mais namorados.
- Isso é um pouco nojento. Jane e eu fomos criados juntos, temos a mesma idade. Passamos pelo ritual na mesma época, mas logo depois ela foi para o Japão passar um ano estudando na escola de lá, quase não tivemos oportunidade de conversar sobre as mudanças que aconteceram.
- Está acontecendo alguma coisa entre o Lucian e a Lenneth? - ela perguntou de repente, mudando de assunto.
- Não, mas é complicado – ele ficou de pé e estendeu a mão a ela – Não pode vir a um casamento e não dançar pelo menos uma música.
Parvati hesitou por um momento, mas ele tinha razão, não podia passar o casamento inteiro sem ir ao menos uma vez à pista de dança. Se Lukas não estava ali para dançar com ela, não ia se privar por causa disso. Segurou sua mão sorrindo e deixou que a conduzisse até a pista. Ela reconheceu a música assim que se aproximaram dos casais já dançando, era de um dos seus filmes favoritos. Ozzy deslizou a mão pela sua cintura, mas mantiveram uma distancia segura, seguindo o ritmo da melodia. A música era sobre o tempo que a pessoa esperou para estar com quem ela ama, o quanto ela sempre esteve tão perto e ao mesmo tão longe de conseguir o seu final feliz. E sem que percebessem o espaço entre eles foi aos poucos diminuindo.
A cada novo verso da música eles sentiam seus corpos mais próximos. Parvati fechou os olhos e deixou que a letra da música a invadisse. Quando os abriu novamente, seu rosto estava tão próximo do rosto de Ozzy que estavam se tocando, mas algo a impediu de se afastar. Alguma força inexplicável fez sua mão subir até seu pescoço e se entrelaçar em seus cabelos e ela sentiu a mão dele deslizar carinhosamente pelas suas costas. Estavam tão próximos que ela estava respirando em seu pescoço, sentindo seu cheiro. A boca dele tocou sua orelha e ela sentiu seu corpo reagir. Seus olhares se encontraram e Ozzy encostou sua testa na dela, acariciando seu rosto. O beijo foi inevitável. Começou tímido, guiado pela incerteza, mas logo se transformou em um beijo intenso. Era como se eles fossem os únicos na pista de dança e a música tivesse parado para dar lugar àquele momento. Tudo ao redor parou por alguns segundos, e então Parvati percebeu o que estava acontecendo. Ela interrompeu o beijo e pôs as mãos no peito dele, o afastando.
- Preciso ir – disse sem conseguir olhá-lo nos olhos – Desculpe.
Ela não esperou para ouvir o que ele tinha a dizer. Atravessou a pista de dança esbarrando nas pessoas sem pedir desculpa e parou diante da mesa dos pais, ainda ofegante por causa do beijo. Sua mãe a olhou preocupada, estava sempre alerta desde o acidente.
- Podemos ir embora? Não estou me sentindo bem. – era mentira e ela se sentia mal por fazer aquilo com sua mãe, mas sabia que era a única maneira de convencê-los a ir para casa sem questionamentos.
- Claro minha querida, o que você está sentindo? – ela levantou depressa e colocou a mão em sua testa.
- Estou um pouco tonta, preciso deitar um pouco.
- Vamos embora então, Mason já está dormindo na mesa – e apontou para seu primo, deitado em duas cadeiras desmaiado.
- Saia na frente com ela e peça ao manobrista para tirar o carro, Karen – seu pai levantou também – Vou me despedir de Katarina por todos nós e depois pego o Mason, encontro vocês lá fora.
- Tubo bem, vamos querida – Karen se despediu rapidamente dos amigos na mesa, Parvati fez o mesmo e seguiram em direção à saída.
Ela não olhou para trás enquanto caminhavam. Não queria correr o risco de ver Leo ou Robbie e tê-los correndo até ela para perguntar o que tinha acontecido. Pior, ver Ozzy a olhando. Não sabia qual seria sua reação e não estava preparada para descobrir. Seu pai apareceu cinco minutos depois com Mason dormindo no colo e menos de uma hora depois Parvati já estava de pijama, deitada em sua cama. Sua mãe ficou com ela até se certificar de que não estava passando mal e deixou-a sozinha. Assim que a mãe fechou a porta do quarto, Parvati afundou a cabeça no travesseiro e começou a chorar.
How could I face the faceless days
If I should lose you now?
We’re so close
To reaching that famous happy end
And almost believing this was not pretend
Let’s go on dreaming for we know we are
So close
So close
And still so far
Jon McLaughlin – So Close, Trilha Sonora de Encantada