Tuesday, March 20, 2012

Chegamos às 17h em ponto na sala do curso de auror e nos deparamos com um aviso na porta mandando todos seguirem para o campo de quadribol. Ninguém tinha ideia do que nos esperava, mas uma coisa era certa: se a aula era em campo aberto, íamos cansar. E acertamos em cheio. Quando pisamos no campo vimos uma estrutura enorme montada, parecendo uma pista de obstáculos de treinamento militar: tinha uma plataforma alta, uma rede de escalada, uma pinguela, pneus enfileirados, vários troncos altos e baixos e uma pista de lama com cordas em cima, onde ficou bem claro que teríamos que rastejar por baixo delas pra passar.

- Boa noite, senhores – o professor Wade falou em seu tom de voz mais sádico. Aquilo era um mau sinal – Como já notaram, hoje vamos fazer algo diferente.
- Hoje nós vamos avaliar como anda a comunicação entre as duplas, e quanto vocês confiam um no outro – a professora O’Shea explicou – Um de vocês vai ficar vendado, enquanto o outro, de cima daquela plataforma, vai guiar o parceiro pelos obstáculos. Vocês vão começar em lados opostos e o objetivo é fazer o seu parceiro chegar até a sua plataforma em segurança.
- Não é uma corrida, isso não é Survivor e vocês não estão lutando pela imunidade, então não se apressem. Encontrem uma maneira de se comunicarem de forma eficaz, porque todos vão gritar ao mesmo tempo e vai ser difícil para o seu parceiro ouvir suas instruções. Vocês têm cinco minutos para decidir quem vai ficar vendado e quem vai guiar e bolarem uma estratégia antes de começarmos.
- Não acho que consigo gritar alto o suficiente – Parvati disse logo – Acho melhor você guiar.
- Você sabe que vai ter que rastejar na lama, não é? – perguntei rindo, mas ela deu de ombros – Ok então, eu guio.

Quando eles autorizaram o inicio do exercício, um caos se instalou. Todos gritavam ao mesmo tempo instruções confusas e os que estavam vendados, do outro lado da pista, pareciam galinhas decepadas andando rumo. Demorou até que Parvati conseguisse distinguir minha voz no meio daquela confusão, mas quando ela conseguiu me ouvir, trabalhamos bem. Passou sem muita dificuldade pela rede de escalada (quase saiu do alto dela, mas se segurou a tempo), atravessou os pneus sem pressa e seguindo minhas instruções para não tropeçar, passou pela pinguela colocando um pé na frente do outro e com os braços estendidos como mandei e pulou e passou por baixo de todas as traves que tinham no caminho sem acidentes. Só faltava o rastejo e quase todas as duplas estavam nele, as vozes começaram a se embolar outra vez e precisei gritar mais alto.

- Parvati, pra baixo! Você precisa rastejar!
- O QUE? OZZY? NÃO CONSIGO OUVÍ-LO.
- ABAIXA! VOCÊ PRECISA RASTEJAR!
- AI! – Oleg trombou feio com ela, derrubando Parvati por cima das cordas.
- Desculpa! – ele tentou ajuda-la a levantar, mas vendado estava atrapalhando mais do que ajudando – Quem caiu?
- Parvati! Quem é? Oleg?
- OLEG, SAI DAI! – Mitchell gritou da plataforma do meu lado – ESQUERDA, VAI PRA SUA ESQUERDA!
- PARVATI, FICA ABAIXADA! VOCÊ PRECISA RASTEJAR PRA ATRAVESSAR AS CORDAS!

Parvati finalmente ouviu e fez sinal de positivo, seguindo o que mandei e passando rastejando pela lama debaixo das cordas. Incentivei-a a continuar dizendo que faltava pouco e quando ela passou por todo o percurso de cordas, a professora O’Shea apitou e saltei da plataforma para encontra-la.

- Karev e Lusth estão ok, pode tirar a venda! – ela deu sinal positivo e Parvati arrancou a venda dos olhos. Estava suada, o rosto vermelho e toda suja de lama.
- Acho que fomos bem – ela falou quase sem folego, limpando a lama do rosto.
- Sim, vocês foram muito bem – a professora se aproximou – Apanharam um pouco no começo, mas quando conseguiram se comunicar Parvati confiou nas suas instruções e passou sem problemas pelo percurso – ela sorriu e apitou outra vez – Callahan e Karpov ok, pode tirar a venda!

Oleg tirou a venda dos olhos e vi que tinha um corte no supercilio direito, de quando não ouviu Mitchell mandando que abaixasse e deu uma cabeçada na trave. Também estava todo sujo, mas fora o machucado, eles passaram bem pelo percurso e tinham cumprido o objetivo da prova. Demorou mais meia hora até que todos tivessem concluído o percurso e sentamos na grama para ouvir a avaliação.

- No geral, todos se saíram bem. Alguns tiveram mais dificuldades, alguns até se machucaram – e Oleg passou a mão na testa na hora, fazendo a turma rir – Mas todos provaram que a comunicação entre as duplas está boa e que vocês confiam um no outro.
- O próximo exercício de dinâmica entre as duplas, como já havíamos avisado, é nesse fim de semana. Nós só vamos chegar aqui às 17h, então quem vai orientar vocês é o Dr.Pace. Estejam na sala de aula pontualmente às 10h.
- O que vai ser o exercício? – Mitchell perguntou com a mão levantada.
- Sábado vocês vão descobrir. Lembre-se que ninguém vai poder ir pra casa, ele vai ocupar todo o fim de semana, também já havíamos avisado sobre isso.
- Vocês vão gostar, é divertido – mais uma vez, o tom de voz sádico – Agora antes de liberarmos vocês, 50 voltas no campo. Vamos, vamos! – ele bateu palmas e gritou e todo mundo levantou depressa.

Corremos as 50 vezes que ele mandou em volta do campo de quadribol e conforme íamos terminando, éramos liberados da aula. Já eram quase 21h quando cheguei à Kratos e desmaiei na cama antes mesmo de considerar tomar banho. Ainda bem que não tinha sido eu a atravessar o percurso, ou teria dormido todo sujo de lama.

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Sexta-feira passou como um raio e quando me dei conta já era sábado e estava mais uma vez preso na escola por conta de algum trabalho do curso de Auror. Como havíamos sido orientados, às 10h estávamos todos na sala de aula esperando que o Dr. Pace chegasse para explicar o que teríamos que fazer. Foi impossível não notar que em cima da mesa dele havia uma caixa de madeira enorme e aquilo me preocupou. O que quer que fosse, se seria passado aos alunos por ele, a avaliação teria um valor muito maior do que parecia. Ele entrou logo depois que nos acomodamos e estava animado. Outro sinal de preocupação. O que deixa um psicólogo animado dificilmente anima seus pacientes.

- Bom dia, turma, como estão? – todos o cumprimentaram de volta e ele sorriu ainda mais animado – Muito bem, vou ser bem direto para podermos começar logo a dinâmica – ele abriu a caixa e puxou uma espécie de algema de dentro, mas era de pano e tinha uma corrente um pouco maior – Hoje, vocês serão acorrentados às suas duplas e terão que passar 48h assim. Só poderão retirá-las para usar o banheiro, mas a outra pessoa deverá ficar por perto. O que vamos avaliar nessa dinâmica é a habilidade de vocês em trabalhar juntos. Para a dinâmica funcionar, vocês precisam encontrar o ritmo.
- Dr. Pace, nem todos moram na mesma republica. Não podemos tirar pra dormir também? – Mitchell perguntou e todo mundo apoiou.
- Não, não podem, pois já pensamos na solução para isso – ele colocou a mão na caixa outra vez e puxou um saco de dormir – Para aqueles que não conseguirem chegar a um consenso sobre onde dormir, como é apenas uma noite vamos montar um acampamento aqui na sala e podem vir pra cá. A corrente pode ser usada nas mãos ou nos pés, cabe a vocês decidir onde fica melhor.
- Podemos ir até o vilarejo com elas? – perguntei
- Sim, podem. Só não devem ir para casa, mas podem circular normalmente pelo vilarejo. Estarei observando vocês de perto, assim como Micah e Shannon quando retornarem de Hogwarts. Amanhã às 17h recolheremos as correntes e entregaremos as avaliações durante a semana.

Um por um, as duplas foram até a mesa para receber a corrente e ser liberado. A maioria estava achando divertido e brincando com a idéia, como Oleg e Mitchell, que já começavam a ensaiar andar com os passos iguais, mas eu não estava achando aquilo muito divertido. Era verdade que se fosse um ano antes eu ia querer enforcar Parvati com aquela corrente, mas mesmo nos dando bem agora, passar 48h acorrentado a ela não tinha como dar certo.

Decidimos usar a corrente no braço, porque no pé íamos parecer uma dupla de presidiários. E no instante em que nos prendemos um ao outro, a falta de sincronia ficou clara. Passei pela porta e virei à esquerda, enquanto ela foi pra direita. Fomos puxamos de volta pra perto à força e ela alisou o pulso, reclamando de ter machucado.

- Isso não vai dar certo.
- Tem que dar certo, são 48 horas assim. Só temos que nos comunicar melhor.
- Certo, então vamos pra direita, porque eu tenho que passar no jornal.
- Eu tenho que ir ao vilarejo. Katarina pediu que a encontrasse no café às 10:30.
- Não vou ao vilarejo com isso.
- Eu tenho que ir até lá, ela disse que era importante.
- Ok, tudo bem, mas vamos passar no jornal antes.
- Não pode ser depois? Fico a tarde inteira lá se quiser, mas temos que ir até o vilarejo agora.

Ela finalmente cedeu e seguimos para a cidade. As ruas ainda estavam vazias, nenhum aluno circulava por elas ainda, todos deviam estar dormindo. Parvati caminhava depressa pra ninguém ter tempo de ver a corrente nos prendendo e sentamos na mesa mais afastada do café. Como sempre, Katarina estava atrasada. Já estávamos esperando há quase 10 minutos quando ela finalmente apareceu.

- Desculpe o atraso, maninho, mas não controle os acidentados que chegam ao hospital! – ela já chegou se explicando e puxando uma cadeira – Olá Parvati, que bom que veio!
- Não tive muita escolha – ela levantou nossas mãos e Kat viu a corrente.
- Curso de Auror? – ela perguntou e assentimos – Por isso escolhi ser Curandeira.
- Ok Kat, você disse que era urgente, então que tal começar a falar? – disse impaciente.
- Muito bem. Primeira coisa, não precisa mais bloquear a mente dela, eu já sei de tudo.
- Sabe tudo o que?
- Sei que ela morreu, e depois voltou – ela abaixou a voz e ficamos tensos – Sei o que você e os gêmeos fizeram.
- Quem contou isso a você?
- Ninguém me contou, mas você contou Eddie e isso bastou – ela deu um sorriso cínico e me amaldiçoei por ter dito a ele – Ele não teve culpa, bastou olhar pra ele e vi tudo.
- Por que você contou a ele? – Parvati perguntou nervosa.
- Ele sabia, ele leu o relatório da policia que o Dr. Pace me deu e me confrontou. Não pude mentir, ele queria saber por que só salvamos você.
- E por que você o deixou ler isso? Droga Ozzy, isso deveria ser um segredo, você mesmo disse que ninguém podia saber! – ela quase gritou, irritada.
- Eu não entreguei a ele, ok? – respondi tão irritado quanto ela – Ele viu em cima da cômoda e pegou! O que eu devia fazer? Tomar da mão dele e rasgar? Só ia piorar as coisas!
- Ok, se acalmem vocês dois! – Kat interferiu a tempo, pois já estávamos quase rosnando – Não vim aqui para dar bronca, vim para ajudar.
- O que? Você não vai nos denunciar ao Conselho?
- Está maluco? Tem idéia do que pode acontecer com vocês se eu entregá-los? Não quero perder meu irmãozinho, então não, não vou denunciar os três patetas.
- Então o que? Vai nos chantagear?
- Oscar, você tem muita pouca fé na sua irmã. Não vim chantagear ninguém, já disse que quero ajudar.
- Em que exatamente você pode ajudar? – Parvati perguntou em um tom mais gentil.
- Sei que você tem a mesma habilidade que nós dois, e existem tantas coisas que posso fazer que vocês nem podem imaginar. Isso vai muito além de ler mentes. Quero ajudá-la a aprender todas.
- E...? – emendei, pois aquela era Kat, tinha algo mais.
- E eu fiquei muito curiosa por saber que o ritual funcionou em uma mortal comum, sem ofensas – ela adiantou depressa e Parvati fez sinal de tudo bem – Não sabia que isso era possível. E você ainda voltou com poderes, achava isso ainda mais impossível.
- Por que impossível? Não é o ritual que desencadeia isso tudo?
- Eu sempre achei que fosse algo relacionado à linhagem sanguínea, mas acho que ficou provado que não é. Quero descobrir o que é.
- Cuidado com essas pesquisas, pode atrair a atenção de alguém.
- Não se preocupe, sei ser discreta quando preciso.
- O que exatamente podemos fazer, além de ler mentes? – Parvati perguntou de repente, como se só aquela parte da conversa tivesse lhe interessado.
- Ah, isso é conversa pra outra hora, quando eu tiver mais tempo – ela chamou o garçom – Um café para viagem, por favor. Preciso voltar para o hospital, mas quando forem para casa em um fim de semana e eu tiver folga, conversamos.

Kat pagou pelo café e assim que nos despedimos ela aparatou de volta pra Sofia. Pedimos cafés para viagem também e saímos para a rua. Ela já estava lotada, os moradores da cidade que ainda estavam dormindo quando chegamos agora já ocupavam a praça e as lojas do vilarejo. Parvati recolheu a corrente que nos separava e agarrou minha mão.

- O que está fazendo?
- Não quero que ninguém veja essa corrente idiota, vamos voltar depressa.

Andamos de mãos dadas cerca de um minuto até tudo dar errado. Quando fizemos a curva para pegar a estrada que subia até os portões do castelo, Lukas estava encostado no muro esperando por ela. A primeira reação dela foi sorrir animada, mas quando a expressão no rosto dele se fechou, ela percebeu que ainda segurava minha mão. Soltou depressa, mas era tarde demais. Lukas passou batido por nós dois e quando estava fora do alcance da proteção contra aparatação, desapareceu. Parvati correu até onde ele desaparatou, mas continuei parado e a corrente a freou.

- Solta essa coisa do meu pulso, tenho que ir atrás dele! – ela começou a desatar a corrente, mas segurei sua mão para impedi-la.
- Ficou maluca? Não podemos sair!
- Eu preciso ir, ele está pensando besteira!
- Ninguém morreu, então não pode sair! Estamos presos goste você ou não e eu não vou colocar em risco minha chance de ir pra Academia de Auror porque você quer ir atrás dele! Se não está levando isso a sério e prefere priorizar esse namoro falso, não devia ter se inscrito no curso!
- Namoro falso? Quem você pensa que é pra falar isso?
- Você nem gosta dele! Só está com ele porque não quer ficar sozinha! Relaxa, ele já está mais que acostumado com o peso do chifre, e um imaginário não vai fazer diferença – ok, eu tinha ido longe demais e nem teria sido necessário olhar pra expressão no rosto dela – Desculpa, não quis dizer isso.
- Não, você quis sim.
- Onde está indo? – perguntei quando ela passou por mim na direção dos portões – Ah, não vai me responder?
- Tenho que ficar 48h acorrentada a você, mas não precisamos conversar. Estamos entendidos?

Assenti sem opção e voltei para o castelo atrás dela. Como previ, não tinha como passar 48h acorrentado a Parvati sem que alguma coisa desse errado. Eu só esperava que demorasse um pouco mais para as coisas desandarem.