Tuesday, April 14, 2009

Numa sala de partos no Hospital Geral de Sofia, pouco antes da Páscoa.

- Você precisa reagir, pode fazer mal ao bebê...- dizia um jovem rapaz, para sua esposa em trabalho de parto.
- Eu não ligo para este bebê. É você que eu quero...Volte para mim...- ela respondia arquejante.
- Força senhora Kovac...- disse o curandeiro obstetra.
Gemidos de dor...Palavras de incentivo...Súplicas...
- Você vai me perdoar? Tudo o que fiz foi por amá-lo demais...
- Irina, faça força, pelo nosso filho, depois falamos sobre isso...Tudo vai ficar bem.
-... Dói demais...Fica comigo Yuri...Faz tanto frio aqui...
A jovem mulher contraiu o rosto de dor e desmaiou. O curandeiro chamou outros e começou uma correria na sala.
- Ela está com hemorragia... Preparar para uma cesárea de emergência.
- O que houve com ela?? Não a deixem morrer...- pediu Yuri.
- Espere lá fora senhor Kovac...Vamos tentar tudo para salvar aos dois...
Ele foi para a sala de espera, e tudo o que podia pensar era em uma esposa que ele não amava como deveria e no pequeno bebê, que ele duvidava ser capaz de lhe despertar algum sentimento além de compaixão.
Alguns minutos depois...
- Infelizmente sua esposa não sobreviveu. Ela estava muito debilitada quando chegou aqui e não conseguimos conter a hemorragia.
- E o bebê?
- A criança apesar de prematura, está bem. É uma menina forte, nem vai precisar ficar na incubadora. - disse o curandeiro e logo uma enfermeira se aproximava com um pequeno embrulho e o apresentou ao jovem.
Instintivamente ele o pegou e olhou para o bebê de rostinho vermelho e enrugado:
- Olá, pequena. Eu sou o seu pai. - O bebê pareceu entender e abriu os olhos e um par de olhos azuis o encarou por breves instantes, e ele sentiu seu estomago se contrair, ante aquele olhar e engoliu seco, enquanto o instinto de proteção falava mais alto em seu peito e ele soube: apesar de tudo ele amava aquele bebê, e faria de tudo para que ela fosse feliz.

o-o-o-o-o-o

Estávamos na aula de Alquimia e a professora Kollontai, após nos ensinar o feitiço de duplicação e mandou cada um de nós utilizar uma fruta para o teste. Eu e meus amigos ríamos de nossas transmutações bizarras, minha maçã estava quase quadrada de tão torta, a de Evie perdeu a cor vermelha no processo e a de Vina, estava um pouco mole. Claro que as frutas de Reno e Annia e Nina estavam perfeitas, e a professora passava de mesa em mesa nos apontando os erros de cálculos no processo. Ela olhava a maçã descorada do Ty, quando ouvimos uma batida na porta e o professor Klasnic, diretor da Mannaz, entrou:
- Desculpe professora Kollontai, por interromper a sua aula, mas é importante. O diretor Ivanovich, solicita a presença do senhor Ivanov e da senhorita Kovac na sala dele. Tragam as suas coisas, por favor.
Olhei para minhas amigas e fiz como era mandada. Logo eu e Luka nos apresentávamos na sala do diretor Ivanovich e o diretor após nos mandar sentar, nos disse o motivo da nossa convocação. Irina havia falecido após dar à luz, e nós iríamos para casa. Senti meus olhos encherem de lágrimas e olhei para Luka. Ele tinha um olhar duro, e estava rígido ao meu lado, sem esboçar reação alguma. Talvez fosse o jeito dele de lidar com a dor.

In the arms of the angel
Fly away from here
From this dark cold hotel room
And the endlessness that you feel
You are pulled from the wreckage
Of your silent reverie
You're in the arms of the angel
Maybe you find some comfort here



Desde o momento que eu e Luka tomamos a chave de portal na sala do diretor e chegamos em casa, não nos falamos mais e por mais frio que Luka parecesse, eu sabia que ele estava sofrendo. Ele e Irina se adoravam, e ficaram mais unidos depois da morte de tia Tânja, a mãe deles, e mesmo que houvesse brigas eles eram irmãos, nada diminuiria este vínculo. O pai dele estava sério e frio, enquanto ouvíamos as palavras do sacerdote e parecia olhar uma parede de vidro quando seu olhar pousava em nós.
Uma garoa fina e persistente caia por sobre nossas cabeças, enquanto estávamos no cemitério. Era o funeral de Irina, e toda a família havia comparecido em peso, e muitos amigos do pai dela vieram prestar suas homenagens, até mesmo Iago mandou uma coroa de flores enorme e uma carta de pêsames.
Eu, meus pais e Yuri estávamos do outro lado do caixão, junto com Morgan, Carlinhos e Nikolai. A única vez que vi o pai de Luka esboçar alguma emoção foi na noite anterior, quando foi até minha casa pedir ao meu irmão que permitisse que Irina fosse enterrada no mausoléu dos Ivanov, ao lado da mãe. Ele estava diferente do homem arrogante e cheio de si, que acha que o dinheiro compra tudo. Talvez ele houvesse percebido que o dinheiro não serviria de muita coisa, enquanto o serviço fúnebre terminava.
Minha mãe chorava baixinho, abraçada ao meu pai que tinha o maxilar travado e Yuri estava sério ao meu lado, segurando minha mão, quando o caixão dela baixou para a sepultura sob uma chuva de pétalas de rosas.
Na hora dos cumprimentos, meus amigos estavam lá, cumprimentaram rapidamente Luka e seu pai e vieram ficar conosco. Max estava junto de Luka e o acompanhou quando eles começaram a sair do cemitério, quando minha mãe chamou o pai dele:
- Ivan, venha até a nossa casa, para conhecer a nossa neta, ainda nem escolhemos o nome da pequenina...- e quando ele se virou para nós, senti um calafrio ante o olhar de desprezo dele.
- Eu não tenho neta, qualquer ligação que eu tinha com a sua família morreu com a minha filha. - e nos deixou pasmos. Até mesmo Luka, o olhou chocado antes de segui-lo. Minha mãe ainda levantou a mão para chamá-lo de volta, mas meu irmão disse, pontuando bem as palavras:
- Vamos para casa, minha filha Elena, deve estar sentindo falta de sua família.
Depois disso, não tocamos mais no nome do pai de Irina. Havia um bebê que precisava de nós muito mais do que ele.

All day long thought that we still had a chance
Letting go, this is the end of romance
Broken hearts find your way
Make it through just this day
Face the world on your own
Life will go on, life will go on


N.Autora: musicas: Life will go on de Chris Isaak e Angel de Sarah McLachlan