Friday, February 03, 2012

Depois das aulas de sexta era normal que os alunos fossem para suas casas, aproveitar o fim de semana com a família. Eu costumava fazer isso e ia para Sofia quase toda sexta-feira, mas desde que as aulas do nosso último ano começaram, aquela era a primeira vez que ficava no castelo por obrigação. Atolada com o material do curso de auror que tinha para estudar, achei sensato ficar pra trás. Nem quando Leo convidou Robbie e eu para acompanhá-la até a Itália pude ceder. Ela acabou tendo que ir sozinha, pois Robbie também estava às voltas com um trabalho para o jornal que andava tirando seu sono. Seriamos só nós dois no fim de semana todo, cada um ocupado com os seus problemas.

- Você precisa se desafiar mais, Sr. von Hoult – Robbie imitou a voz da professora Mira e revirei os olhos – Sei que é perfeitamente capaz de escrever algo além de uma coluna de fofocas.
- Você vai passar o fim de semana inteiro reclamando? – perguntei impaciente – Se for me avise agora, que chuto o balde e vou atrás da Leo, ainda dá tempo de alcançá-la.
- Não estou reclamando, apenas desabafando. Você é minha amiga, cale a boca e me apóie.
- Por que você aceitou esse trabalho, afinal de contas?
- Porque achei que seria um desafio legal e que podia provar a ela que sou perfeitamente capaz de escrever algo sério, mas estou começando a me arrepender.
- Você é sim capaz de escrever outras coisas além de uma coluna de fofocas. Conte o que está tentando fazer, quem sabe não posso ajudar.
- Certo... – ele puxou uma folha de papel da bagunça que tinha no chão e me entregou – Ela sugeriu que eu tentasse escrever algo sério, mas não disse o que, então fiquei maluco tentando ter idéias, até que estava com Alec no vestiário dos Ducks e uma luz surgiu no meu caminho.
- O que vocês estavam fazendo no vestiário dos Ducks? – perguntei rindo e ele abanou a mão num gesto que dizia para não interrompê-lo.
- Estávamos saindo quando ouvimos um barulho de soco. Corremos pra ver quem era e a porta do armário de Lucian estava aberta e toda amassada, mas não tinha ninguém no corredor. Alec ainda correu para ver se encontrava o autor do vandalismo, mas não viu ninguém. A porta amassada do armário estava suja de sangue, provavelmente do agressor que se machucou, então pensei: e se eu tentasse bancar o repórter investigativo e descobrisse quem invadiu o vestiário?
- É uma boa idéia, mas você não está conseguindo descobrir quem foi, não é?
- Não, é mais difícil do que pensei! Minha primeira idéia foi coletar amostras do sangue da porta, porque se ele é do autor, então poderia descobrir através dele, mas não sei como fazer isso.
- Você precisa comparar com outra amostra de sangue ou não vai conseguir descobrir de quem é, a menos que tenha acesso a um computador do FBI e a pessoa tenha ficha – ele me olhou espantado e ri – Muito seriado policial nas férias e um professor que trabalha pro FBI.
- Bom, não tenho um computador do FBI, alguma outra brilhante sugestão? – ele perguntou debochado.
- Primeiro, melhore sua atitude ou não ajudo – ele me atirou uma bolinha de papel e desviei dela – Segundo, já tem um suspeito?
- Mais ou menos...
- Com licença... – ouvimos uma batida na porta e virei. Ozzy estava parado do lado de fora do quarto – Está muito ocupada?
- Sim, ela está em um raro momento de paciência com meus projetos, não interrompa! – Robbie respondeu irritado, mas não dei importância.
- Não, não estou.
- Ótimo, podemos conversar um instante? – ele olhou pro quarto, onde Jude e Penny ocupavam suas camas alheias à conversa – A sós?
- Parvati Karev, não desapareça! Preciso da sua ajuda nisso!
- Eu já vou voltar, pare de ser dramático!

Sai do quarto com ele e como a república estava uma bagunça e cheia de gente, fomos até varanda. Ele indicou o banco para eu sentar, mas não sentou de imediato. Parecia que estava se preparando para começar a falar. Finalmente ele sentou ao meu lado e por um instante achei que ele ia me contar que estava morrendo.

- Dr. Pace disse que preciso contar algumas coisas a você e disse que poderíamos fazer isso na próxima sessão, mas acho que precisamos aprender a conversar sem supervisão, então vim até aqui hoje pra isso.
- Também tenho que lhe dizer algumas coisas – admiti, um pouco aliviada por ele ter tomado a iniciativa – Você primeiro.
- Ok... Quando você foi até minha casa no Natal, se desculpar pela história da entrevista, eu menti quando disse que estava tudo bem, que já tinha esquecido aquilo – ele abaixou a cabeça para não me encarar – A verdade é que ainda não consigo perdoá-la pelo que fez. Não estou com raiva de você, não é isso. Acho que é mais mágoa, aquele era o meu sonho e por sua causa ele foi jogado fora.
- Eu sabia que você não tinha me perdoado, sabia que não estava nada bem. O que eu posso fazer pra consertar isso? Eu faço qualquer coisa, é sério.
- Não precisa fazer nada, de verdade. Tudo que preciso é de tempo pra digerir isso e então vai chegar um dia em que não vou mais estar magoado com isso e vou perdoá-la. Só preciso de tempo.
- Eu sinto muito, nunca me arrependi tanto de algo que fiz – ele assentiu, mas continuou de cabeça baixa – Minha vez. Quando você foi a minha casa depois de descobrir o que eu fiz, estava com raiva e nervoso e por isso me disse alguns insultos. Sei que estava no seu direito de estar me odiando, mas o que você disse me magoou.
- Eu me arrependi do que disse no instante em que as palavras saíram da minha boca, mas estava alterado demais pra pedir desculpas. Eu realmente sinto muito. Jack tinha razão, nada me dava o direito de falar daquela forma com você.
- Eu sei que as pessoas falam as mesmas coisas de mim pelas costas, já ouvi algumas falando na minha cara e nunca dei importância, mas quando você disse foi a primeira vez que me magoou. Acho que foi jeito como você falou, eu senti a verdade na forma como me ofendeu, você acreditava naquelas palavras.
- Não, não é verdade – ele puxou minha mão e a acariciou – Eu nunca pensei aquelas coisas de você, nem quando estava no auge da minha irritação com as nossas brigas. Eu tinha sim a intenção de magoá-la, foi por isso que repeti o que ouvia na escola, mas eu nunca pensei nada daquilo.
- Não precisa tentar abafar o que sempre soube. Algumas ofensas às vezes tinham fundamento, não é como se fosse uma novidade.
- Nunca repita isso, Parvati. Você não é nada daquilo, não acredite se alguém disser o contrário. Tivemos nossos problemas, mas hoje somos amigos e sei que você é durona, mas também tem um lado doce que as pessoas não conhecem. Você não merece aceitar desaforo das pessoas aqui e deixar pra lá, essa não é a Parvati que passou dois anos batendo de frente comigo.
- Estou cansada de brigar com as pessoas por causa disso, com o tempo aprendi que o melhor a se fazer é ignorar.
- Bom, então nesse caso vou ter que começar a defender você. Não posso permitir que ofendam minha parceira e deixar isso barato.
- Então agora eu ganhei um defensor dos fracos e oprimidos? – perguntei rindo.
- Se você não faz nada a respeito, tenho a obrigação de fazer. Eu tenho que tomar as suas dores, não foi isso que o professor Wade falou?

Não sei quanto tempo ficamos sentados naquele banco, um de frente pro outro sem dizer nada, apenas sorrindo. Quando me dei conta de que não estávamos mais conversando e ele ainda acariciava as costas da minha mão com o polegar, puxei-a de volta depressa. Isso deve tê-lo feito acordar, pois saltou do banco feito uma mola e parou quase no meio da varanda. Robbie apareceu na porta naquele exato instante, o sorriso mais debochado do mundo estampado no rosto, mas tendo noção do perigo, não ousou soltar nenhum tipo de piada enquanto não estivéssemos sozinhos.

- Se não estiver interrompendo nada, gostaria de ter a atenção dos dois de volta ao quarto.
- Eu também? – Ozzy perguntou surpreso – Já estava indo embora.
- Estava nada, suba um instante, não vai demorar.

Ele me olhou curioso, mas dei de ombros e acompanhamos Robbie escada acima. As meninas que estavam na república agora desciam apressadas com mochilas nas costas, querendo o mais rápido possível chegar em casa e subimos esbarrando nelas pelo caminho. Jude e Penny também estavam de saída do quarto quando entramos e se despediram animadas, se juntando a confusão nas escadas.

- Então, o que quer nos mostrar? Já descobriu quem arrombou o armário?
- Não, porque como você disse, preciso de provas, mas tenho um suspeito.
- Que armário? O do vestiário? – Ozzy perguntou perdido na conversa e assentimos – Alec comentou que você estava querendo descobrir quem tinha feito aquilo, mas não falou mais nada, achei que tinha desistido.
- Não posso desistir, isso virou um projeto para o jornal e a professora está de olho.
- E quem é o suspeito? Pare de enrolar – disse impaciente.
- Patrick Boris – ele disse satisfeito e quando não respondemos nada, fez cara feia – O que foi?
- Com base em quê você chegou a conclusão de que Patrick invadiu o vestiário dos Ducks e arrombou o armário do Lucian?
- Ele era namorado da Lenneth e obcecado por ela, levou uma surra do Lucian na frente da escola inteira e agora o mesmo está namorando a ex dele. Isso não é motivo?
- Isso é tudo circunstancial. Por que ele iria arrombar o armário?
- É, nada foi roubado – Ozzy completou e Robbie soltou um suspiro de frustração.
- Tenho reunião do jornal às 17h, não posso aparecer lá sem uma evolução no trabalho. Vocês não estão colaborando!
- Se você pudesse provar que o sangue na porta é dele, não precisa de um motivo. Já o colocou na cena do “crime” – e fiz aspas com as mãos – Isso já é uma prova concreta, que não tem margem pra contestação.
- Certo, mas onde vou conseguir uma amostra de sangue dele? Não acho que ele e Lenneth tenham feito algum pacto de sangue e ela tenha guardado um pouco em um frasco.
- Ele joga pelos Wild Penguins, não é? – perguntei para Ozzy e ele assentiu – Acha que pode arrancar um pouco de sangue dele no próximo jogo?
- Está vendo? Durona! – ele sorriu animado com a ideia – Moleza, sempre tem um pouco de sangue em um jogo de Hóquei. E desde aquela história com a Lenneth estou procurando por um bom motivo para dar uns socos naquele idiota. Podem contar comigo.

Robbie voltou a se animar e passamos alguns minutos discutindo como faríamos para coletar o sangue que Ozzy tirasse de Patrick sem ter que invadir o rinque, então Ozzy foi embora e fiquei sozinha com Robbie. Passei horas naquele quarto ouvindo os comentários debochados dele. E o pior era que eu não tinha moral pra contestar nenhum deles. Ia ser um longo fim de semana.