Lembranças de Lucian P. Valesti
- Por que você não me contou? – Eu perguntei, um pouco irritado. Liseria deu de ombros e passou pomada na minha mão.
- Porque ela me pediu que não falasse nada.
- E você iria deixa-lo batendo nela, machucando-a?
- Lucian, por Odin, isso já acabou. Você comprou as dores dos outros, ele foi punido e eles terminaram o namoro. Simples. – Ela respondeu, irritada também.
- Não é simples. Isso só aconteceu porque a Julie veio falar comigo. Não posso perdoar o que ele fez.
- Lucian, querido, eu concordo com você, mas não podíamos nos meter na vida dos dois! – Liseria falou, irritada.
- Ele podia ter feito coisas muito piores. – Eu falei, teimoso e também bem irritado.
- Ai seria culpa da Lenneth, por não falar nada. – Ela respondeu.
- Seria culpa nossa por não termos percebido!
- Aí está a questão. Você não se perdoa por não ter percebido nada antes e demorado a agir. – Ela falou, incisiva e eu abri a boca para falar, mas sabia que ela estava certa.
- Sim, eu admito. Devia ter prestado mais atenção... Ela é minha melhor amiga. – Eu falei e logo Liseria amarrou a cara.
- Sempre ela, não?
- Ah não, vai começar com o ciúme bobo de novo? – Eu me apressei a dizer e Liseria fechou ainda mais a cara. Ela bateu com força na minha mão e eu reclamei de dor.
- Vá pedir para sua “melhor amiga” passar então pomada e tratar de você sempre que se machucar. – Ela falou, levantando-se e saindo.
- Tenho certeza que ela me ajudaria e não esconderia nada de mim! – Eu falei, antes dela bater a porta.
Eu tinha brigado com Patrick, na verdade, batido nele, há uma semana. No mesmo dia, ouvindo a todos os deuses, Lenneth terminou com ele, mas eu não deixava de ficar preocupado. Patrick ainda estava recebendo detenções de Renomaru e se eu conhecia meu professor, estavam sendo rígidas. Mas Patrick merecia muito mais do que simples detenções.
Eu tinha que me controlar sempre que o via, pois toda vez que ele passava por mim, sentia vontade de bater nele mais um pouco. Pelo menos não era só comigo, e todos os nossos amigos tinham a mesma reação.
Apesar de tudo, a escola voltava a sua rotina normal e nós também. Tivemos uma notícia ruim recentemente, pois o pai do Finn faleceu de repente e foi um choque para ele e até mesmo para nós.
Eu fora proibido de ir para o vilarejo por uma semana e apenas hoje pude voltar a trabalhar na livraria de Fer. Ela me recebeu animada e conversamos sobre tudo que aconteceu. Eu contei pra ela sobre minha briga com a Liseria e ela falou que eu estava sendo cabeça-dura, mas pelo menos concordou comigo que Liseria também. Então comecei a ouvir uma música suave, vinda do andar de cima.
Fare thee well, little broken heart
Downcast eyes, lifetime loneliness
Whatever walks in my heart will walk alone
Constant longing for the perfect soul
Unwashed scenery forever gone
No love left in me
No eyes to see the heaven beside me
My time is yet to come
So I'll be forever yours
Era Lenneth cantando. Eu havia esquecido que ela tinha aulas de canto no andar de cima da livraria. Fui até a sala onde ela tinha aula e abri a porta devagar. Eu conhecia essa música, era uma música do Nightwish. A música era muito bonita, mas era triste, falando sobre corações partidos e uma busca eterna por carinho e amor. Fiquei parado na porta observando-a e vi como ela se esforçava para cantar e como gostava disso. Percebi que seus machucados estavam sumindo, e sua beleza permanecia a mesma de sempre.
- Você tem talento, Val. – Eu falei quando ela terminou de cantar. Ela se sobressaltou um pouco e ficou vermelha por eu tê-la ouvido cantar.
- Obrigada, mas ainda tenho muito que aprender.
- E sua professora? – Eu perguntei, sentando-me no sofá. Ela ficou atarefada mexendo em algumas partituras e não veio falar comigo. Parecia até querer evitar meu olhar.
- Ela já deve estar chegando, eu vim um pouco mais cedo para ensaiar essa música... Queria muito cantá-la. – Ela falou e sorriu para mim. Nesse momento, a professora dela bateu na porta e eu me desculpei e sai, deixando-as ensaiar.
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Eu e Liseria nos resolvemos dois dias depois. Como sempre não conseguíamos ficar muito tempo brigados, mas voltamos a discutir no mesmo dia e nos afastamos por mais um dia. Só depois de três dias da primeira briga voltamos a nos falar normalmente.
Hoje saia mais uma edição do nosso jornal, em que fizemos a cobertura da festa de Halloween. Infelizmente, também saiu o jornal clandestino, que agora se denominava Aurora Boreal.
Foi um desastre essa nova edição deles.
Ainda não sabíamos como eles publicavam-na, pois todas as gráficas estavam informadas de não aceitar nenhuma publicação estranha daquele jornal.
Mesmo assim, na mesma manhã que nosso jornal saia, ele circulava entre os alunos. Haviam comentários e colunas sem o menor controle. Falavam mal de alunos abertamente, contavam sobre casos de namoros mal resolvidos, sobre quem havia ficado com quem, sobre quem tinha sido visto se agarrando em um local do jardim. Falaram sobre Lenneth, Patrick e eu, dizendo que eu queria impedir os homens “de verdade” de colocarem suas mulheres no lugar. Falaram mal até mesmo do diretor e de vários professores. Não haviam limites alguns. E claro, houveram ataques ao nosso jornal, além da publicação de meus textos.
O Diretor mandou recolher todos os jornais e disse que quem fosse pego com um exemplar receberia detenção e punição. Mas sempre haviam novas edições escondidas.
A maioria dos alunos fingia não ligar para o jornal novo, com medo da represaria do Instituto, mas muitos se divertiam e comentavam as matérias com escárnio e gritaria. Estava saindo do controle!
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- Caro Derfel, que honra tê-lo conosco! – Arthur falou, a voz cheia de escárnio na voz.
- Foi difícil encontra-los, Vossa Majestade. – Lorde Derfel falou, fazendo uma referência a contra gosto. – Mudaram os locais de reunião e não fui informado.
- Não? Era papel do Lord Gwaine avisá-lo. – Arthur falou e olhou para Gwaine, como se brigasse com ele, mas havia diversão na voz de todos.
Derfel encarou os rostos mascarados e encapuzados. Viu o olhar de apoio de muitos de seus companheiros e soube que ainda tinha apoio ali. Mas não podia brincar com Arthur. Ele não era o líder deles a toa.
- Não há motivos para puni-lo, eu sou inteligente o bastante para encontrar os locais de reunião. – Derfel falou, jogando um exemplar do Aurora Boreal. – Vocês estão fazendo um grande trabalho, por não serem vistos.
- Obrigado, obrigado. – Arthur riu. – Mas devemos isso tudo a meu filho, Mordred. – Ele falou e um jovem saiu das sombras à sua direita. Ele tinha um ar metido e austero, sendo digno do título que carregava. – Mordred, acho que não conhece Lorde Derfel, ele era o responsável pelas iniciações.
- Mas amoleceu. Eu conheço sua história. – Mordred falou rindo. A temperatura da sala cresceu na mesma proporção que a tensão. Uma tocha acendeu-se do lado de Mordred, quase queimando seu rosto.
- Eu nunca amoleço, caro Mordred. Apenas aguardo a minha hora. – Derfel falou, o desafio claro na voz. – E sei quando atacar e como defender a mim e aos meus.
- Fico feliz que continue o mesmo.. Derfel... Mas vamos dar início às cerimônias? – Arthur falou e acenou com a mão. Três garotos, sem camisas, saíram de uma porta lateral. Seus olhos estavam vendados, mas eles caminhavam com orgulho. – Daremos boas vindas a novos irmãos essa noite, se eles se mostrarem dignos...
N.A.: Forever yours, Nightwish