- Acorda, irmãzinha! – disse uma voz familiar, invadindo o quarto e escancarando as janelas para deixar um miserável raio de sol entrar. Não se podia esperar muito mais das manhãs na Bulgária, mas foi o suficiente para fazer com que Nina abrisse os olhos, absolutamente contrariada.
- Seja lá qual dos dois idiotas você for, tem cinco minutos para fechar as cortinas e desaparecer do meu quarto – resmungou, enquanto cobria o rosto com o lençol.
- Você é um raiozinho de luz de manhã, irmã querida. E de tarde. E de noite. – disse o rapaz, puxando as cobertas – Não reconhece mais minha voz?
- Para falar a verdade, eu nunca reconheci. Identificava os dois pela camisa com a letra do nome... – respondeu Nina, mal conseguindo conter um sorriso ao ver o rosto do irmão. – Os dois estão aí ou eu estou vendo tudo dobrado por causa do sono?
- Só eu, Ninys. – levantou e abraçou a irmã – O Nicolau, caso você ainda não tenha notado. Ivan está lá embaixo com mamãe, papai e uns convidados para a Páscoa.
- Convidados? Ninguém me avisa mais nada nessa casa?! Eu nem sabia que vocês viriam!! E Ninys é uma garota idiota de 6 anos. É Olenova, para você!
- Sim, também estou muito contente em te ver depois de 3 anos, docinho. À propósito, por que você colocou esses papeizinhos coloridos nas suas paredes ao invés do pôster que eu te mandei?
- Esses “papeizinhos” são instrumentos de organização, para o seu governo! E eu não gosto daquela banda. – respondeu uma Nina injuriada, tentando arrumar o quarto e ativando os lembretes com a varinha.
Nicolau suspirou, constatando o óbvio: Nina sabia ser insuportável quando queria e parecia querer punir os irmãos por cada segundo de existência desperdiçado fora do trabalho.
- Já te contei que fui em uma entrevista de emprego? – disse, esperançoso.
- Jura?! – os olhos da menina pareciam brilhar, enquanto ela encarava o irmão com absoluta incredulidade. – Onde??
- Em um serviço de entrega de pizzas! “Entrega em 10 minutos ou seu dinheiro de volta”. Moleza, com a minha vassoura eu chego lá em 5!
- Ah... – resmungou Nina, desapontada. – Que...legal. Eu não quero te criticar, Nico, mas...você poderia chegar longe se tivesse estudado...sabe?
- Não, não sei, Nina. Também não sei o que você quer de mim. Eu realmente tento te deixar orgulhosa, mas tudo parece insuficiente.
- Não é isso!! Eu...eu estou orgulhosa. Eu me orgulho de você, só acho que desperdiça seu potencial! – respondeu a menina, assumindo, mais uma vez, a posição de irmã mais velha.
- Garanto para você que não trocaria de vida, se pudesse. Deixei seus chocolates atrás da mesa...achei que você gostaria de procurar como fazíamos quando éramos crianças. Mas você não é criança. Feliz Páscoa. – disse Nicolau, saindo do quarto e colocando um ponto final na conversa.
Nina sentiu uma vontade incontrolável de chorar quando viu o chocolate em forma de coruja que seu irmão tinha deixado. Sabia que ele não ganhava muito, mas sempre fazia questão de presentear a irmã nos aniversários e no Natal. Os irmãos já não moravam mais com a família desde que decidiram viajar pelo mundo sem lenço, documento ou um nuque. Não trabalhavam e viviam mudando de albergue para albergue. Nina procurou espantar o desejo de abraçar o irmão e pedir desculpas por sua estupidez, mas se convenceu de que eles mereciam o tratamento frio por não terem correspondido às expectativas dos pais...e as dela.
- Feliz Páscoa, gente. – disse a menina, sonolenta, enquanto descia as escadas para dar de cara com uma sala cheia de pessoas.
- Ninys!!! – Ivan correu para abraçar a irmã, entregando uma caixa de sapos de chocolate. – Você não mudou nada, irmãzinha! E, pelo boletim que está pregado na geladeira, suas notas também não mudaram!!
Nina corou levemente quando percebeu que seus troféus, medalhas e boletins estavam espalhados pela casa inteira, mas logo percebeu que seus irmãos não eram as únicas visitas.
- Lizzie!! Eu pensei que vocês só viriam de Londres na semana que vem! – gritou a menina, correndo para abraçar a amiga inglesa, acompanhada dos 2 irmãos e dos pais.
- Sim, era o planejado, mas papai não agüentava mais ficar na Inglaterra e decidiu que passaríamos a Páscoa aqui. À propósito, Feliz Páscoa!
- Feliz Páscoa para você também! Hey, Michael! – e correu em direção ao menino que tinha acabado de levantar do sofá para recebê-la com um abraço.
- Feliz Páscoa, Nina! É ótimo te ver, quero saber várias coisas sobre Durmstrang. – disse o garoto, entregando uma caixa gigante de sapos de chocolate.
- Obrigada! Pode deixar que eu faço um tour com você pelo vilarejo e a escola, Mike...e também é ótimo te ver! Onde está o Chris?
- Ele foi na cozinha e já volta, mas está revoltado com a mudança. Veio relatando “100 razões para não morar na Bulgária” durante toda a viagem...é verdade que as veelas atacam estrangeiros nas ruas?
- Não...e eu tenho certeza de que ele vai gostar de morar aqui...ah, oi, Chris! – Nina sorriu quando o garoto entrou na sala e meramente acenou para ela. – Er...bem vindo à Bulgária...eu acho...
- É, ok. São seus os papéis que estão apitando na geladeira? – perguntou, com um ar displicente.
- Opa, são sim!! Quer ir lá ver o sistema de lembretes que eu descobri, Mike?
- Claro! Qual o tipo de feitiço que você usa? – perguntou Michael, enquanto ele e Lizzie iam para a cozinha junto com Nina. Chris simplesmente balançava a cabeça, sem se mover do sofá, confirmando as expectativas de que a Bulgária seria um lugar incrivelmente monótono.