Algumas anotações de Leonora Carrara
Nossa volta para a escola não foi em grande estilo como eu imaginava. Com Parvati tentando se ajustar à nova realidade, ficava dificil, fazer as coisas que costumávamos fazer antes, então alguns alunos nos olhavam assustados quando entrávamos para as aulas quietos e nos sentávamos no fundo da sala. E mesmo os professores, optaram por não falar nada conosco, então éramos deixados em paz. Parvati agora usava casacos com capuz, onde a ajudamos a costurar pequenos bolsos onde cabiam seu iPod e fones de ouvido. Ela também tinha um rádio a pilha, caso houvesse alguma interferência no castelo, e sua música alta fosse interrompida. Robbie e eu no começo até tentamos conversar com ela sobre isso, mas ao ver o seu olhar de pânico, em nossa primeira noite em nosso quarto na República, nos convenceu a fazer o que ela queria, pelo menos por enquanto, então Robbie e eu sempre estavamos por perto, para que ela não tivesse que falar com as pessoas.
As coisas nunca mais seriam as mesmas para nenhum de nós.
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Quando as aulas terminaram eu era a garota gorda e rica, que namorava o amigo de infância. Em nossa volta eu era uma garota muito, mas muito rica, sem namorado e com um corpo de fazer inveja às líderes de torcida dos times de hóquei, elas me olhavam com raiva, e eu adorava é claro. Minha transformação havia sido tão surpreendente que chamava a atenção dos garotos que antigamente se dirigissem um carro e eu atravessasse na faixa de pedestres, eles me atropelariam, mas agora? Sempre havia algum convite para sair, uma cantada um bate papo sem compromisso entre as aulas. Robbie e eu ríamos destas coisas e eu ate comecei a aceitar alguns convites, afinal eu queria saber como era estar do outro lado.
Numa noite, acabei indo até o vilarejo tomar um café com Orion, e confesso que só aceitei pois fui movida pela curiosidade, afinal, todos sabem que ele não se envolve com ninguém. Acabei vendo que Mitchell estava no mesmo café, com uma garota, do 6º ano, e não parecia se divertir. E depois de algum tempo de conversas comuns, Orion começou um monólogo sobre o quanto ele era inteligente, seus projetos de sucesso no futuro, eu olhava disfarçadamente para a mesa de Mitchell e a garota parecia ser do tipo que também gostava muito de si mesma, e quando ela puxou um espelho da bolsa para se admirar, e ele sorriu e piscou para mim.
Voltei meu olhar para um distraído Orion e aleguei ter um trabalho para terminar, e ele me levou de volta para a república, e até trocamos um beijo, que me fez sentir que beijava um peixe. Mal esperei ele ir embora, e entrei na república, não me contendo e limpando os lábios.
Comecei a subir as escadas, quando ouvi uma batida na porta, e quando a abri e fui puxada para fora por Mitchell, que me encostou na parede e me beijou. Quando parou para respirar, abri a boca para perguntar o porque daquilo, mas ele me interrompeu com outro beijo. Acabei sorrindo enquanto o beijava e ele riu junto. Afinal, conversar pra que?
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Estávamos voltando para a nossa república, quando passamos perto de um grupo de garotas que ao nos verem começaram com risinhos e provocações, Parvati e Robbie passaram ignorando-as, e eu até ia fazer o mesmo quando ouvi:
- Lá vai o trio de patetas: o gay nerd, a balofa camuflada e a pé de chumbo assassina.- não aguentei e fui até elas:
- O que foi que você disse, Layla?- perguntei à líder do bando, a nova chefe de torcida dos Dukes:
- Apenas disse a verdade, ou seu amigo não é gay, você não é gorda, e sua líder não respeita limites de velocidade?- e elas voltaram a rir e eu as olhei de cima a baixo com raiva.
- Quero que você pare com estas provocações ou vai se dar muito mal.- Acho que alguma coisa em meu olhar deve ter alertado às outras porque as risadas começaram a morrer:
- Você não pode mais ameaçar as outras pessoas impunemente, Leonora, se o diretor ficar sabendo, pode te expulsar. Todos sabem disso, você não assusta mais.- ela disse presunçosa, e eu senti vontade de unhar a cara dela e fazer um bom estrago. Mas respirei fundo e disse o mais calma possivel:
- E quem está fazendo ameaças? Estou te alertando, como membro do jornal da escola, que se você não calar esta sua boca mal siliconada, o diretor, toda a escola e até mesmo seus pais, ficarão sabendo o porque do seu nariz mal operado viver entupido.Aliás, todas vocês vivem resfriadas ultimamente, não é?- olhei para as garotas e ela ficaram vermelhas. Layla empinou o queixo:
- Todos sabem que você é da coluna de fofocas, ninguém acredita em suas mentiras.- e eu ri cínica:
- Onde há fumaça há fogo e minhas matérias deixam de ser fofoca quando se tem provas para corroborar, e se você não sabe o que esta palavra significa, quer dizer...
- Eu sei o que isso significa.- ela me cortou irritada e eu continuei sorrindo:
- Você sabe que se isso sair no jornal da escola, é o primeiro passo para sair no Profeta Diário, e vai respingar em todas as repúblicas...Sinceramente? Eu não ligo se isso acontecer. E ai? Quer pagar pra ver?- como ela ficasse calada me olhando com ódio eu completei:
- Acho que agora estamos entendidas. – virei as costas e caminhei até onde Parvati e Robbie me esperavam.
- Não precisava ter saído feito uma leoa para me defender, eu não ligo para o que falam. – ele disse sério, e como eu o olhasse de volta ele disse logo:
- Mas eu adorei assim mesmo. Vai conta logo, o que você disse que fez as hienas sossegarem?- ele quis saber e eu sorri:
- Disse a Layla, que iria contar em detalhes no jornal, sobre os retoques que ela fez, naquele cirurgião caro de Sofia, afinal ele também é médico de Camille. Inclusise sobre aquele em particular. – disse apontando para a linha abaixo da cintura e Robbie riu, Parvati deu um meio sorriso, mas algo no seu olhar, me fez pensar em que ela de alguma forma sabia toda a verdade, e não pude evitar um pequeno arrepio na nuca.