Tuesday, September 27, 2011

Outubro estava chegando e com ele as tão esperadas aulas do curso da Academia de Auror. Todos que tinham pretensão de se tornar auror se inscreveram no curso no começo do ano passado, mas apenas aqueles com as melhores notas e desempenho exemplar nas aulas de DCAT foram selecionados. Oleg e eu estávamos entre os escolhidos e às 16:50 já estávamos na sala de DCAT no 3º andar. Contei aproximadamente 20 alunos, mas a surpresa foi ver que Parvati estava entre os 20. Nunca me passou pela cabeça que ela quisesse ser auror e muito menos que estaria na aula, já que vem evitando qualquer tipo de contato com as pessoas.

Os professores entraram na sala às 17h em ponto e a turma se acomodou nas primeiras mesas, mas ela ficou mais afastada. Por mais que eu tentasse, não conseguia evitar olhar na sua direção a todo instante. Ainda precisava encontrar uma maneira de contar a ela tudo que aconteceu, mas qualquer tentativa de aproximação era imediatamente cortada. Não fazia idéia de como ia fazê-la me escutar.

- Boa tarde – um homem moreno com uma cara séria falou – Me chamo Micah Wade e essa é minha parceira Shannon O’Shea. Somos nós que vamos fazer vocês se arrepender por ter escolhido essa profissão.
- O curso vai até junho e à medida que os meses forem passando, as aulas vão ficando mais exaustivas. Esperamos que todos que estão aqui estejam realmente comprometidos, porque não nos importamos de expulsar alguém do programa faltando apenas uma semana pro término.
- A proposta do curso é preparar vocês para o que vão encarar na academia, mas também para a vida de um auror formado, então vamos começar com algo muito importante: parceria.
- Nenhum auror trabalha sozinho, é preciso sempre ter um parceiro. No primeiro dia como auror vocês vão ser designados a trabalhar com outro auror e essa parceria vai ser pra sempre.
- Só existem duas maneiras de uma parceria acabar – o auror chamado Micah começou a andar entre as mesas – Ou um dos dois se aposenta ou morre.
- Seu parceiro é aquela pessoa que vai sempre dar cobertura e estar lá pra tirar você de alguma encrenca, que vai salvar sua vida. E você vai fazer o mesmo por ele. Uma parceria é baseada em confiança, você confia sua vida à outra pessoa e ela faz o mesmo.
- Como a base da parceria é a confiança, vocês serão divididos em pares e vão trabalhar assim o ano inteiro. Se não gosta ou conhece seu parceiro, aprenda a administrar isso. Vocês vão precisar confiar um no outro e se ajudar, não só aqui nessas aulas, mas em qualquer coisa. Se o seu parceiro se meteu em confusão e vai apanhar, vá até lá e o ajude, esse é o seu dever.
- As duplas já foram formadas, com a ajuda do professor Marko – a auror chamada Shannon puxou um pergaminho da bolsa – Quando ouvirem seu nome procure sua dupla e comecem a se conhecer melhor. A aula de hoje vai ser para vocês conhecerem bem a pessoa com quem vão passar o resto do ano e depois vamos falar um pouco sobre o nosso trabalho.
- E nem pensem em pedir para trocar.

Eles começaram a ler os nomes das duplas e a turma começou a se dividir. Já sabia que não iam me deixar trabalhar com Oleg se a proposta era trabalhar a confiança, seria fácil demais, e isso se confirmou quando a auror chamou o nome dele e o juntou com Mitchell Callahan. Os dois se cumprimentaram animados e começaram a conversar. Conhecíamos Mitchell, mas não bem o bastante. Acho que essa seria a oportunidade perfeita. As duplas já estavam acabando quando ouvi meu nome.

- Oscar Lusth – ela consultou o pergaminho mais uma vez – Parvati Karev.

Mesmo sem olhar pro lado sabia que todos os olhares na sala estavam voltados para nós dois. Em outros tempos ia amaldiçoar aquela escolha, mas agora via aquilo como a minha chance de ouro. Ela não seria louca de pedir para trocar e ia ter que me deixar se aproximar. Mais cedo ou mais tarde, confiaria em mim o suficiente para ouvir o que tinha a dizer. Mas quando parei ao lado dela no fundo da sala, soube o que fazer para que ela me escutasse naquele instante.

- Sei que não tivemos um começo muito bom, mas estamos presos um ao outro. Vamos ter que nos adaptar – disse sentando ao seu lado e ela só assentiu, sem dizer nada – Tire esses fones, não vai conseguir ouvir a aula com eles.

Puxei os fones de seu ouvido e sua reação foi tentar pegá-los de volta desesperadamente. A expressão de pânico no rosto dela deixou claro o quanto aquela novidade a estava torturando, mas antes que conseguisse pegar os fones de volta, ela parou. Olhou pra mim confusa e acabei rindo.

- O que aconteceu?
- Eu disse que também posso ouvir. Estou bloqueando o som, ao menos por um tempo.
- Como você faz isso?
- É fácil, mas leva um tempo até conseguir.
- Diga como faço isso agora.
- Não, não aqui e não agora. Depois da aula nós conversamos.
- Ozzy...
- Parvati, por favor. Preciso contar muitas coisas a você e aqui não é o lugar pra isso.

Ela me encarou outra vez sem dizer nada. Mais uma vez, a dúvida estava lá. Ela ainda não sabia se podia confiar em mim, mas ao mesmo tempo sabia que precisava. Por fim acabou assentindo e continuei ao seu lado, bloqueando os pensamentos para que ela pudesse assistir à aula sem os fones. Não trocamos mais nenhuma palavra até o fim da aula e quando deu 21h e fomos liberados, ela me acompanhou sem hesitar até o pátio. Não tinha ninguém ali, todos que saiam das aulas iam direto para as repúblicas, então não teria uma oportunidade e lugar melhor para contar tudo de uma vez.

- Muito bem, estou aqui, diga como parar isso – ela falou quando paramos perto dos bancos.
- Primeiro preciso que você entenda porque pode ler pensamentos – respondi sentando no banco, mas ela não fez o mesmo. Continuou em pé, de braços cruzados – Você já ouviu falar sobre as famílias de Imortais, certo? – ela assentiu e continuei – Alec, Oleg e eu, nós fazemos parte dessas famílias. Quando nós completamos 16 anos passamos pelo ritual que nos tornou Imortais.
- Vocês três? – ela pareceu surpresa e assenti – Certo, consigo acreditar. Isso explicaria porque sua família é tão grande, mas o que isso tem a ver comigo?
- Quando completamos 16 anos, desenvolvemos certas habilidades. Cada um tem a sua e algumas são únicas, como Alec e Oleg, que podem controlar os elementos. Juntos eles fazem muitos estragos, como você já viu no clube de Alquimia. O meu é ler pensamentos. Essas habilidades só se revelam depois que passamos pelo ritual. Você sabe como ele é feito?
- Li uma vez que vocês morrem e são trazidos de volta, é isso? – assenti e por um instante ela pareceu não entender, mas então a compreensão ficou estampada em seu rosto – O que você está tentando me dizer?
- Nós estávamos lá. Chegamos minutos depois do acidente e vimos o estrago. Descemos a colina desesperados, mas já estavam todos mortos. O homem do caminhão, Jack, Alexis... E você – os olhos dela começaram a se encher de lágrimas, mas me obriguei a continuar para não desistir – Oleg pode ver espíritos, ele viu Jack e Alexis indo embora, eles não tinham nada pendente e fizeram a travessia, mas você ficou. Você não estava pronta pra partir. É assim que voltamos, nossos espíritos demoram alguns minutos para atravessar e nos trazem de volta antes disso acontecer. É por isso que os rituais só são feitos por anciões, para não haver erros.
- Eu morri? – ela encostou-se ao muro, já sem conter as lágrimas – Como isso é possível? Vocês não podem...
- Oleg sabia como fazer e Alec e eu... Nós ajudamos. Trouxemos você de volta.
– Eu... Eu sou como vocês? – ela parecia tanto chocada quanto horrorizada.
- Sim. Quando você volta através das palavras do ritual, se torna uma Imortal.
- Não...
- Você não estava pronta, era o certo a se fazer.
- NÃO! – ela explodiu, as lágrimas já cobrindo todo o rosto - Não cabia a vocês decidir isso!
- Nós salvamos a sua vida.
- Não, vocês só a pioraram! Como se já não fosse ruim o bastante a perspectiva de me culpar pelo acidente até a minha morte, agora vou passar toda a eternidade carregando esse fardo!
- O acidente não foi sua culpa, Parvati.
- Era eu atrás do volante, não era? Fui eu quem jogou o carro de encontro com aquele caminhão.
- Isso tudo, eu sei que é muito pra absorver, mas você vai ver que não é uma coisa ruim. Nós vamos ajudá-la.
- Não, vocês já fizeram o bastante, me deixem em paz!

Ela saiu correndo do pátio, mas não tentei ir atrás. Era muita coisa para absorver e ia levar um tempo, o melhor a se fazer era dar a ela o espaço necessário. Mais cedo ou mais tarde ela ia aceitar e nos procurar para que possamos ajudá-la a entender melhor o que mudou em sua vida. Levantei do banco e comecei a fazer o caminho de volta para as repúblicas com calma, mas uma gritaria vinda da Atena me fez parar. As meninas estavam histéricas e a porta abriu de repente, com Liseria saindo desesperada.

- Ozzy! – ela correu pra fora da varanda e agarrou meu braço – Rápido, precisamos de ajuda!
- O que houve? – perguntei correndo com ela pra dentro da república, já assustado.
- É a Parvati! – ela começou a chorar e subimos as escadas correndo.

Quando chegamos ao quarto delas, Parvati estava jogada no chão e Leonora estava debruçada em cima dela, aos prantos. Uma tampa de remédio estava perto das duas e vi que o frasco vazio dele estava em sua mão. Ela estava pálida e os lábios já estavam roxos. Estavam todas em um pânico tão grande que foi difícil manter a calma.

- Ela tomou todo o vidro de antidepressivo! – Leo falou soluçando – Por favor, tem que levar ela pra enfermaria, é pesada demais, não conseguimos levantá-la!
- Calma, ela vai ficar bem – abaixei-me ao lado dela e peguei Parvati no colo – Vai ficar tudo bem.

Sai da república com ela desacordada em meus braços e Leo veio atrás de mim, ainda chorando. Todas as meninas estavam assustadas e muitas choravam achando que ela ia morrer, mas eu sabia que ia ficar tudo bem. O que me preocupava no momento era saber que ela preferia morrer.