Friday, September 09, 2011

Quando os alunos se reencontraram na plataforma da estação de Sofia, nem todos exibiam um semblante feliz por estar retornando para mais um ano na escola. Aqueles que todos os anos eram os mais animados e movimentavam a viagem de trem estavam quietos. Trancados em um vagão no meio do trem, Ozzy, Alec, Oleg, Lucian, Finn e Julie fizeram uma viagem silenciosa. Não viam motivo para conversar. Tudo naquela viagem, que era a última e havia há tanto tempo sido planejada, perdera o sentido sem Jack. Tudo os fazia lembrar o amigo. Em outro vagão, no inicio d trem, Parvati fitava a paisagem pela janela com um fone no ouvido e um capuz escondendo o rosto, alheia a conversa entre Leo e Robbie. Voltar para Durmstrang não estava sendo fácil aquele ano.

De volta à rotina de aulas, a mudança de comportamento daqueles afetados pelo acidente ficou ainda mais visível. Sempre bagunceiros e divertindo os alunos ao atrapalhar as aulas, ninguém mais interrompia o professor com piadas. Ninguém sequer conversava. Os treinos de Hóquei, que recomeçaram na 2ª semana de aula, passaram a ser apáticos. Os Ducks, campeões na temporada anterior, já não eram mais favoritos ao bicampeonato. Ozzy, capitão do time, não conseguia mais manter seus jogadores focados, estavam todos abalados demais com a perda do companheiro de time para pensar em jogo. Ele se sentia culpado pelo acidente e a idéia de que pode ter causado a morte de seu melhor amigo o torturava. Não podia contar a ninguém, não o levariam a sério, e as únicas pessoas que conheciam seus motivos não acreditavam em sua culpa, mas ele não conseguia se perdoar. Era mais fácil se culpar e dar um motivo a morte tão brutal do amigo do que pensar que ele partiu sem razão.

Se Ozzy se culpava por ter dito a Parvati que batesse com o carro, ela se culpava por estar ao volante. Parvati não conseguia, e nem queria, se perdoar por ter tomado as chaves da mão de Jack e dirigido enquanto estava tão alterada. E o pior, por ter sobrevivido. Parvati não compreendia por que um acidente daquela gravidade havia tirado a vida de sua irmã e de seu primo, mas poupado a sua, a culpada por ele ter acontecido. Ela não aceitava aquilo e sempre que cruzava com a prima, via em sua mente o mesmo questionamento. Julie agora não dividia mais o quarto com as meninas da sua turma. Assim que voltou a Durmstrang, pediu a presidente da casa para mudar e agora estava alojada no quarto de Lenneth, no 3º andar. Parvati entendia sua raiva e não tentava se aproximar, pois sabia que não ia suportar ouvir alguém dizer o que ela dizia para si mesma todos os dias.

As tardes de quinta-feira eram sempre ocupadas com a aula de Educação Física e para que os alunos relaxassem da já puxada rotina dos N.I.E.M.s, Maddox pediu que se dividissem em duas equipes e se divertissem um pouco com um simples jogo de queimada. A partida corria bem e todos estavam gostando de descarregar um pouco do estresse atirando bolas uns nos outros, mas a coisa ficou séria quando Derek chutou uma bola no rosto de Ozzy. Querendo apenas um motivo para estourar, o garoto partiu pra cima do colega e em um instante uma roda se formou no meio do campo e os dois trocavam chutes e socos no meio dela. Maddox correu com a varinha em punho e com um único feitiço apartou a briga. Os garotos caíram de costas na grama, cada um pra um lado.

- Quero os dois fora do campo agora! - Maddox gritou furioso - Noah e Alec, levem os dois pra enfermaria pra cuidar dos machucados e se certificar que não vão mais brigar. Derek e Ozzy, da enfermaria direto para suas repúblicas e 10 pontos a menos para cada casa!
- Anda, vamos embora - Alec puxou Ozzy pelo braço para o amigo levantar do chão.
- Não precisa me segurar, não vou atacar ele - Ozzy reclamou e o amigo o soltou.

Alec e Noah levaram os amigos até a enfermaria e depois de terem os ferimentos no rosto limpos e cuidados, Noah rebocou Derek de volta a Osíris antes que algo mais acontecesse. Alec esperou até que eles já estivessem bem afastados para começar a andar com Ozzy para a Kratos. Foram o caminho todo calados, mas Alec quebrou o silêncio quando passaram em frente a Atena. Parvati estava sentada sozinha na varanda, o rosto escondido por um capuz e um olhar perdido. Só então eles perceberam que ela não estava na aula de Educação Física. Ozzy parou de andar quando a viu e Alec parou ao seu lado, o encarando sério.

- O que foi?
- Você sabe o que precisa fazer, não é?
- Não preciso fazer nada.
- Sim, precisa. Ela precisa saber o que aconteceu, você tem que contar a ela.
- Por que eu? Você e Oleg também são perfeitamente capazes de explicar tudo.
- Só você pode ajudá-la e sabe muito bem disso. Não é só explicar o que houve, é ajudar nas mudanças.
- Nós nos odiamos, ela não vai me ouvir.
- O modo como você agiu quando estava tentando salvá-la, ninguém faz isso por alguém que odeia.
- Preferia ter salvado o Jack.
- Eu sei, mas vocês não se odeiam. O que aconteceu pra vocês chegarem a esse ponto?
- Não aconteceu nada, só não vamos com a cara um do outro.
- Se você diz... Tenho que voltar pra aula, nos vemos mais tarde. Faça a coisa certa.

Alec deixou o amigo sozinho na estrada das repúblicas e voltou para o campo. Ozzy ficou parado em frente à Atena por um bom tempo, tentando decidir o que fazer. Ele sabia que tinha que contar a ela porque estava viva e o que isso significava, sabia que tinha que lhe dizer que as vozes que ouvia não significavam que estava maluca, mas ele não sabia como. Seu relacionamento com Parvati era complicado, tinha um passado que desencadeou dois anos de brigas e trocas de insultos que acabaram em tragédia e ele agora não sabia como lidar com a situação. Ainda devia odiá-la, ou a morte de Jack e Alexis deveria apagar tudo que aconteceu? Como falar com ela, sabendo que era o culpado por tudo aquilo que estava acontecendo? Até onde ela acreditaria nele, se chegar a ouvi-lo? Quando ele decidiu se aproximar, ainda não sabia o que ia dizer.

- Oi – Parvati levantou os olhos para ver quem estava parado na sua frente e voltou a encarar o vazio – Queria conversar com você, pode tirar o fone do ouvido?
- Não tente querer ser legal só porque acha que deve isso ao Jack. Por favor, me deixa em paz.
- Não estou tentando ser legal, só quero conversar – ele ignorou seu pedido e sentou ao seu lado – Há algumas coisas que precisa saber.
- E por que é você quem tem que me contar?
- Porque só eu posso explicar o que está acontecendo com você. Sou o único que pode ajudar.
- A única maneira de me ajudar é me deixando em paz! – Parvati levantou irritada do banco e começou a caminhar na direção da porta – Não finja que se importa, não preciso de pena!
- Eu sei o que você está sentindo, sei das vozes! – Ozzy ficou de pé também e ela parou de costas pra ele – Você não está louca. Eu sei o que causou isso.
- Não, você não sabe o que eu estou passando, ninguém sabe!
- Também posso ouvi-los, o tempo todo. Então sim, eu sei o que você está passando.

Parvati o encarou e por um instante Ozzy viu em sua mente que ela estava considerando aceitar sua ajuda. Por mais doloroso que fosse, ela queria deixar que ele a ajudasse, mas não durou muito tempo. O que antes era dúvida havia se transformado em raiva. Ela não confiava mais nele. A mágoa ainda existia e talvez nunca fosse passar.

- Me deixe em paz – disse por fim e virou de costas outra vez, batendo a porta da república ao entrar.