Tuesday, February 26, 2008

15 de fevereiro


Nina saiu cedo da República naquele dia. Não costumava agir por impulsos, mas desde que acordou, sabia que precisava conversar com Chris sobre o que havia acontecido. Passou a noite inteira em claro, sendo convencida pelas meninas de que tudo ficaria bem. Sentia a necessidade de fazer o mesmo.


- Oi, meninos...o Parker está por aí? – o clima na república dos garotos estava, no mínimo, fúnebre. Ao ouvirem o nome de Parker, os meninos se entreolharam, sem muita certeza do que dizer, mas não precisaram. Uma cabeleira castanha desgrenhada apareceu no meio.
- Olenova. – uma tentativa de sorriso – Quer entrar?
- Não precisa, eu só queria saber se você estava bem – disse Nina, engolindo seco ao notar as olheiras profundas e o estado do garoto. Qualquer um o confundiria com alguém que não dormia há meses.
- Insisto...– e a tentativa de sorriso de novo, dessa vez, ligeiramente assustadora. Chris não estava acostumado a sorrir gentilmente. Principalmente para Nina. E Nina não estava acostumada a receber sorrisos gentis dele. Queria ter um espelho para ver sua reação.
- Uhnn...tudo bem. Ficou ótima a decoração que vocês fizeram, hein? – brincou, se referindo às roupas jogadas no chão, penduradas na janela, na escada, aos sapatos, aos pratos...Os meninos riram, sem graça, e aproveitaram a porta aberta para sair da República. A chegada de Nina foi a desculpa perfeita para evitar por algum tempo o clima pesado do ambiente. – E...aí?
- Bem. E você? – respondeu Chris, abrindo um espaço vago no sofá amontoado de objetos inúteis. Apontou para que Nina sentasse. A menina só podia concluir que aquele definitivamente não era o Parker. Talvez o Chris, mas não o Parker.
- Bem também...melhor. Eu conversei com as meninas ontem...elas me ajudaram bastante.
- Uhnn, que bom.– murmurou Chris, pegando a caixa de pizza largada no chão, que ainda guardava algumas fatias sobreviventes – Pizza?
- Acho que não, obrigada – disse Nina, sorrindo e brincando com os dedos – Escuta... eu sinto muito mesmo pelo seu pai. Eu gostava muito dele. Mesmo... você provavelmente não vai querer conversar sobre isso, principalmente comigo, mas eu precisava falar – Nina achou melhor dizer tudo de uma vez para se livrar do insistente nó na garganta. Chris girou o corpo no sofá para encara-la e Nina teve certeza absoluta de que nunca tinha visto aquele Parker. Tinha uma tristeza no olhar que não era característica do seu ar brincalhão. E aquele cinismo habitual não brincava mais no sorriso. Ele nem sequer estava mais sorrindo.
- Eu também sinto muito pelo seu. Espero que ele fique bem. – pontuava bem as frases, engolindo seco.
- Eu também. Mamãe mandou uma outra carta e disse que ele teve uma certa melhora na noite passada. E falou que sua mãe está bem...você não precisa se preocupar com ela, ok? – disse Nina, procurando seu tom de voz mais ameno e aproximando a mão do rosto do menino para afastar uma mecha de cabelo. Não sabia dizer o que estava fazendo. Chris franziu a testa.
- Eu não quero que você sinta pena de mim...
- Eu não sinto pena de você! – Nina se defendeu rápido
- Imagina. Só está falando comigo como se eu fosse um bebê. Vai me fazer alguns biscoitos também? – respondeu, sem gritar, mas destacando cada palavra. – Eu não preciso que ninguém tenha pena ou sofra por mim, sei lidar com isso.
- Óbvio. Você não é criança! Mas se meu pai tivesse morrido ontem, eu gostaria que alguém ficasse do meu lado! – e a frase saiu um pouco mais alta do que pretendia – E você não precisa ser grosso!
- Desculpa – contrariado.
- Está desculpado – contrariada, sem nenhuma intenção de desculpa-lo – Por que você vive na defensiva?
- Eu não vivo na defensiva.
- Ó! Imagina! Eu estou aqui, tentando manter uma conversa amigável e você começa a ser hostil, sem motivo algum!
- Você está tentando fazer caridade e não preciso de caridade. Muito obrigada!
- Eu não estou tentando fazer caridade! Só estou tentando ser uma...amiga...decente!
- E desde quando...
- Não começa, Parker! Por favor, será que nós podemos conversar civilizadamente? Será que você pode por cinco minutos ser aquela pessoa que abriu a porta?
- Claro, sobre o que você quer conversar? Quadribol, trabalhos? Pode escolher.
- Eu quero falar sobre o seu pai...
- Pena. Eu não quero.
- Do que você tem medo? – perguntou Nina, levantando bruscamente do sofá.
- Por que você não vai conversar com o Michael? Aposto que ELE vai precisar da sua ajuda quando souber. Não eu! – Chris devolveu a pergunta, também levantando do sofá.
- Como assim “quando souber”? Ele ainda não sabe?!
- Bem...eu não contei.
- Você não contou...?! – Nina estava incrédula – Ele é seu irmão! Como você não contou?
- Bem, além de não ter tido tempo, eu sinceramente não estou preparado para falar sobre isso com o Michael ou com a Liz! E não estou disposto a falar sobre isso com você, então porque não aproveita a deixa e encontra a porta? – mas a menina voltou a se sentar no sofá.
- Eu não pretendo ir a lugar nenhum.
- Sem problemas, eu vou. – disse Chris – Se quiser continuar aí, aproveita o tempo livre e dá uma faxina na República. Está precisando...
- Você não vai a lugar nenhum antes de me prometer que vai conversar com o Michael! Ou você quer que ele descubra por algum colega nosso comentando? – perguntou Nina, segurando o braço de Chris.
- Olenova, você tem 3 segundos para me largar.
- Senão?
- Você está testando a minha paciência...
- Você já acabou com a minha! – devolveu Nina. – Quer saber? Vai. Eu não acredito que você vá ser egoísta e insensível o suficiente para nem ao menos conversar com seu irmão em um momento como esse!

Chris não respondeu. Continuou olhando para Nina por alguns segundos, sacudiu a cabeça e bateu a porta. Agora sim. Era o Parker que Nina conhecia.