Thursday, June 12, 2008

- O que você está fazendo?
- Estudando. – minha voz saiu abafada. Ricard riu e se sentou ao meu lado.
- Assim? – ele perguntou em tom de sarcasmo. Respirei fundo e levantei a cabeça que estivera enfiada no livro de ‘Defesa contra as artes das trevas’ nos últimos 30 minutos.
- Se eu apresentar atestados médicos... Será que eles me liberam desses simulados?
- Liberariam, se você não se utilizasse de atestados todas as vezes que quer fugir de alguma coisa. – ele sorriu novamente e fiz uma careta. – Além do mais, qual doença você inventaria agora? Queda de cabelo?
- Calvície é um problema sério, sabia? Não brinque com isso.
- Desculpa ‘mamãe’. Pare de se estressar com esses simulados. Você vai se sair bem. Em todo caso, há coisas mais importantes para se preocupar.
- Como?
- Saíram os laudos sobre os assassinatos. – Ricard falou puxando um jornal da mochila. Pigarreou antes de começar a ler. – “Nessa quarta-feira, Ivan Klasnic (especialista em Poções e professor desta disciplina do Instituto Durmstrang), declarou seu laudo final sobre as mortes de Johnny Alenxinsky e Tohry Gheorghieff. Os dois aurores foram misteriosamente envenenados dentro do Ministério da Magia dia 29 de abril. Ivan Klasnic atestou nesta manhã que a substância que causou as duas mortes foi um extrato de Belladona, uma planta mágica de nível V, altamente tóxica. Os dois aurores teriam tido contato com o veneno pela jarra de café que estava disposta na sala que dividiam no departamento. O ministro da magia prometeu, mais uma vez, solucionar o caso o mais breve possível.”

Quando ele terminou de ler, meus olhos já estavam arregalados. Senti o coração faltar alguns compassos.

- Belladona!
- É. Quem fez isso tem um ótimo conhecimento em Herbologia, Poções e Magia Negra. Acho que foi a primeira morte com extrato de Belladona desde muitos séculos!
- Estavam faltando mudas de Belladona da Estufa Imperial, da última vez que eu e professor Mikhail estivemos lá embaixo. Ele até estranhou e me fez perguntas em tom de acusação! – falei depressa e a expressão de Ricard foi se tornando pálida.
- Você está me dizendo que as mudas que usaram para fazer o extrato que matou dois aurores dentro do Ministério da Magia saíram daqui? Da nossa estufa? De Durmstrang?
- Não estou dizendo nada. Mas é muita coincidência, não acha?
- Como? Se só você e o professor carregam a chave?! Não tem como abrir aquelas portas com feitiços!
- Eu sei. Por isso mesmo. Ricard, e se colocarem a culpa em mim? É o tio do Victor!!!
- Ok, você andou estudando demais e está biruta. Que motivos você teria para dar veneno a esses dois aurores? Pelas barbas de Merlin, Lavínia. – ele respondeu nervoso e me calei. Ficamos vários minutos em silêncio até ele dar um sobressalto na cadeira que me fez assustar. – Sua chave!
- O que tem minha chave?
- Você perdeu sua chave durante um dia inteiro! Lembra? E ela não ficou o tempo todo naquela boate! Alguém a colocou debaixo da porta. Podia ter simplesmente estar caída na rua, por acaso... Mas podia estar com alguém!
- Quem? Como? Ela fica o tempo inteiro no meu pescoço.
- Mas pode sair dele muito facilmente com um simples feitiço convocatório. E dada a sua condição àquela noite, você nem notaria...
- Certo. Mas se alguém conseguiu mesmo pegar a chave de mim, como entraria em Durmstrang? Nenhum estranho entra em Durmstrang. Têm os guarda-caças, aurores, professores... Impossível.
- E se não foi nenhum “estranho”? – Ricard perguntou com a voz sombria.
- Você está querendo dizer que foi alguém daqui de dentro? Está brincando, não é?
- Você tem uma teoria melhor?
- Ainda não criei nenhuma teoria. Mas...

A sombra de uma pessoa atrás de nós me fez calar. Nos viramos. Era Mikhail.

- Me espere na Estufa Imperial após a reunião da Organização de Botânica e Herbologia. Precisamos conversar. – ele disse sério. Uma veia pulsava em sua testa, o que me deu medo. Sem mais uma única palavra, deixou a biblioteca. Encarei Ricard, que parecia tão tenso quanto eu estava.
- O que vou fazer?
- Conte a verdade sobre a chave. É só o que você pode fazer.

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Mal a Estufa Imperial ficou vazia e Professor Mikhail entrou. Porém, ao contrário do que tinha imaginado, ele não estava sozinho. Outras quatro pessoas o acompanhavam, e eu conhecia três delas. Igor Ivanovich, Ivan Klasnic, Igor Neitchez e outro homem de mais idade e com aparência cansada. Alguns minutos depois, descobri ser Hilbert Molotov (secretário do Ministro da Magia). Com poucas palavras, Mikhail pediu que todos os seguíssemos até o subsolo da Estufa Imperial, e nos conduziu em silêncio até onde a muda de Belladona (que já não aparentava sinais de mutilação) estava.

- Então foi aqui? – o diretor perguntou espantado olhando para todos nós. Molotov confirmou com a cabeça.
- Sinto afirmar que sim, Igor. A Estufa Imperial de Durmstrang é a única que conseguiu cultivar uma pequena muda dessa planta em vários raios de quilômetros. E a única com registro e permissão. Poderíamos considerar que haja Estufas clandestinas, mas Mikhail me assegurou da dificuldade que é plantar e manter essa espécie até este tamanho. Tamanho que se torna suficiente para fazer o extrato. O que ainda não está explicado é como alguém teve acesso a esta parte desta estufa, em especial, se Mikhail garantiu que somente ele e essa senhorita possuem a chave. – Hilbert terminou acenando com a cabeça em minha direção. Todos se voltaram para mim. O primo de Victor estreitou os olhos, desconfiando.
- Lavínia Durigan é uma das minhas melhores alunas. Escolhi-a no começo do ano letivo para ser a monitora da Organização de Botânica e Herbologia. Todos os anos troco a fechadura desta estufa e faço duas cópias, somente. Uma fica comigo, outra com o monitor. – Mikhail respondeu antes que eu pensasse em dizer qualquer coisa.
- E como sabemos se a sua monitora não fez outras cópias da chave? – Igor Neitchez perguntou seco enquanto me encarava. Via ódio em seus olhos.
- Lavínia é de minha inteira confiança. Além do mais, que motivos ela teria de matar seu pai e esse outro auror? – Mikhail respondeu tão seco quanto, e o clima ficou pesado.
- Não se precipite, meu jovem rapaz. Ainda não temos provas. Talvez as mudas nem tenham saído daqui. – Molotov deu tapinhas nas costas de Igor, que desviou o olhar de Mikhail para ele.
- É sobre o assassinato do meu pai que estamos falando! Eu tenho pressa!
- Todos nós temos pressa, Igor. Mas tecer acusações sem quaisquer provas não vai solucionar nenhum dos seus problemas. – Professor Klasnic disse calmo. O diretor concordou com a cabeça.
- Em todo caso, Mikhail e Lavínia, acho que em breve vocês serão chamados para interrogatório. Não se preocupem, não é nada demais. Só precisamos saber exatamente a rotina dessa estufa e quem a freqüenta. Tudo bem? – Molotov perguntou e professor Mikhail sacudiu os ombros.
- Está, tudo bem. Nós também queremos que este caso seja solucionado o mais rápido possível.
- Ótimo. Acho que não há mais nada a se fazer por aqui. Vamos, Igor. – Molotov segurou o braço dele, que acabou se dando por vencido, mas puxou o braço e saiu sozinho da Estufa. – Desculpem. Ele tomou partido sobre as investigações e está um tanto afobado para chegar ao fim disso. Compreensível. Bom, boa noite e mais uma vez, obrigado pelo tempo Mikhail. Nos falaremos em breve.

Mikhail sacudiu a cabeça e o homem também desapareceu da Estufa. Me preparava para sair, junto com o diretor e professor Klasnic, mas Mikhail me segurou.

- Se você tiver algo a me contar, é melhor que seja agora. – disse me encarando sério e senti meu rosto queimar.

Ia começar a contar sobre o sumiço da chave, mas antes que pudesse, senti uma pontada imensa no ventre. Seguida de outra e outra. A Estufa começou a ficar embaçada e alguns segundos depois... Breu.

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‘O que será que aconteceu dessa vez?’
‘Não vi Vina comendo nada hoje. Deve ter sido isso.’
‘Não sei. Ela parece bem pálida...’
‘O que aconteceu? Lavínia? Ela está bem?’

Acordei mas não abri os olhos. Ouvi vozes de várias pessoas ao meu redor, e a última e mais afobada, de Victor.

- Não sei. O que aconteceu comigo? – perguntei lentamente, ainda sem abrir os olhos. Todos ficaram em silêncio e se aproximaram mais.
- Mikhail te trouxe pra cá desmaiada. – Nina respondeu aflita. Fiz uma careta de dor. Tentei me levantar, mas um par pesado de mãos me empurrou de volta contra o travesseiro. Abri os olhos. Uma das enfermeiras me encarava séria e aflita.
- Permaneça deitada. Você não pode se cansar. O horário de visitas acabou. – disse se virando para todos meus amigos. – Por favor, ela precisa descansar. Está tudo bem com ela, ok? Voltem amanhã.

Victor foi o que mais resmungou e pediu para que pudesse dormir ali, mas a enfermeira cortou-o com autoridade, e contrariado ele se despediu de mim com um sorriso e foi embora. Quando a porta finalmente se fechou, a mulher se sentou ao meu lado, parecia aflita.

- Como está se sentindo? Dores no corpo? Cabeça?
- Um pouco. Um pouco tonta. O que aconteceu? – perguntei e ela ficou de repente muito branca. Me encarou vários segundos e aquilo me deixou apavorada. – O que é?
- Sinto muito. Não pudemos fazer nada. Você teve um aborto espontâneo.

A última frase dela fez com que o chão se abrisse sob mim. Me senti vagar para longe dali e estava esperando um indício de pegadinha a qualquer momento. Em vão.

- Eu tive um... O quê?
- Assim que você chegou desmaiada aqui, as contrações aumentaram e teve um imenso sangramento. Não havia nada a se fazer. Demos poções para estabilizar sua pressão e fazer você recuperar o sangue que perdeu, mas aconteceu um aborto.
- Impossível.
- O que é impossível?
- Eu não estava grávida! – eu disse com a voz tremendo e então a expressão dela mudou completamente. Ela ficou assustada.
- Estava. De quase 7 semanas. Você não sabia?
- NÃO! Eu tomo poções anticoncepcionais e meus ciclos sempre são desordenados...
- Nenhuma chance de ter desregulado as doses de poções? – ela insistiu e instantaneamente, vários flashes passaram detrás dos meus olhos. O aniversário de Micah, Naveen. E as pazes com Victor. Tudo em menos de uma semana. Não respondi, mas meus olhos de assombro responderam à pergunta.
- O aborto espontâneo foi causado pela incompatibilidade que você e o pai dessa criança possuem.
- Você está querendo dizer que... – comecei assombrada mas não consegui terminar. Ela concordou com a cabeça.
- Isso mesmo. Estou querendo dizer que você nunca poderá ter filhos com esse homem.

Meus olhos se fecharam sozinhos e não consegui segurar uma lágrima, que escorreu imediatamente. Só queria que aquele dia não passasse de um pesadelo.