Não que eu realmente quisesse me aproximar dela. Não fazia a menor questão, não tínhamos absolutamente nada para falar um com o outro, ainda mais depois de levar um soco sem razão alguma do namorado dela. Ele, por sinal, ainda ia me pagar. Já tinha pensado em mil maneiras de me vingar dele, mas nenhuma terminava realmente bem pra mim. Não podia fazer nada que me custasse uma expulsão. Suspensão tudo bem, mas expulsão nem pensar.
- Ozzy – Alec chamou minha atenção com uma bolinha de papel e perdi o equilíbrio da cadeira – Está me ouvindo?
- O que foi? – não estava. Estava tentando bolar um plano contra Lukas.
- Perguntei se você sabe quanto tempo levou desde que você descobriu a armação do Jack até o soco da Peggy Fleming.
- Peggy Fleming, boa – dei risada – Vou começar a chamar ele assim agora, será que pega?
- É bem provável – Alec riu também – Mas me responde, quanto tempo demorou?
- Sei lá, meia hora? – dei de ombros – Que diferença faz o tempo?
- Não falei? – ele olhou para Lucian e os dois riram – Ele se perdeu no tempo.
- Do que vocês estão falando?
- Oscar, irmão, o tempo total foi de aproximadamente três horas – Alec falou tentando parecer sério, mas eles não paravam de rir.
- Só na pista de dança, de fato dançando – Lucian concluiu.
- Impossível – agora era eu quem estava rindo.
- Admita, você estava se divertindo tanto que nem viu o tempo passar – Alec ria cada vez mais.
- Você está começando a falar como seu namorado, e se não parar agora mesmo, vou te encher de porrada. Já que não posso bater nele, desconto em você.
- Ih, ficou brabo – Lucian debochou e desviou rápido da almofada que atirei – Qual é, Ozzy? Acertamos alguma ferida?
- Calem a boca – levantei da cadeira irritado – Vejo vocês no campo, não se atrasem.
Sai do quarto ao som das risadas cada vez mais altas, mas achei melhor só ignorar. Não havia perdido noção de tempo coisa nenhuma e eles só queriam me tirar do sério, mas não iam conseguir mais nada. Oleg, Julie, Jack, Orion e Finn estavam se preparando para sair quando passei pela sala e fomos juntos até o lago congelado. Era a última partida do campeonato antes das férias de natal e seria justamente contra os Wild Rangers, time cujo capitão era Lukas Hölzenben. Bom demais para ser verdade.
As arquibancadas já estavam começando a encher e fomos direto para o vestiário trocar de roupa, e de lá direto pro rinque para se aquecer. Os Rangers já estavam completos patinando no gelo e não demorou para Alec e Lucian darem as caras e completar o nosso time. Finn foi direto para o gol e nos revezávamos com tiros diretos para ele aquecer também.
- Ok, todos aqui! – o treinador Maddox apitou depois de 15 minutos de aquecimento e os dois times se reuniram em volta dele – Esse é o último jogo do ano, retomamos com o campeonato em Janeiro. Quero um jogo limpo, entenderam? – todos assentiram – Ótimo. Agora assumam suas posições e vamos começar.
Cada time deu seu grito de guerra e nos espalhamos no gelo, cada um assumindo sua posição. O treinador patinou até o centro do rinque e atirou o disco para o alto. E eu havia acabado de decidir o que fazer para me vingar.
ºººººº
- Meninas, estão prontas? – Robbie apareceu na porta do quarto e levei um susto. Seu rosto estava pintado de verde e roxo.
- Mas que diabo é isso, Robert? – não me contive.
- Espírito de equipe, ora – ele soou ofendido pelo meu tom de voz – Tenho que torcer pelos Ducks.
- Robbie está certo – Leo o defendeu e pegou um cachecol nas mesmas cores que ele tinha no pescoço – GO Ducks!
- Desculpe, não estou acostumada a ver você de cara pintada por causa de um esporte, ainda mais um tão violento – dei um beijo de longe nele, para não tirar a tinta.
- E quem disse que estou pintado pelo esporte? – ele jogou o cabelo pro lado e rimos.
- Vamos embora, não quero perder o jogo.
Descemos os três de braços dados até o lago congelado. As arquibancadas já estavam cheias, mas conseguimos um lugar quase perto do gelo. Os Mighty Ducks e os Wild Rangers eram os times com as maiores torcidas na escola, e torcidas bastante expressivas. Sempre tinha alguma confusão depois dos jogos, era quase inevitável. Eu nunca sabia por quem torcer. Do lado dos Ducks tinham meus primos, mas do lado dos Rangers meu namorado. Tudo bem que estávamos em uma fase conturbada, mas não tínhamos terminado e eu ainda gostava muito dele. Então nunca me vestia com as cores de nenhum dos dois times e tentava ser o mais parcial possível, mas era difícil não vibrar com os gols dos dois lados.
- Parv, estamos do lado da torcida dos Ducks, então, por favor, não comemore nenhum gol do Lukas! – Leo me advertiu quando a partida começou e as torcidas começaram a gritar.
- É, eu sou homem e tal, mas não vou defender ninguém e levar porrada de graça – Robbie avisou logo, mostrando as cores no rosto – Sou da torcida dos Ducks.
- Eu sei, eu sei – espantei os dois com as mãos, sem tirar a atenção do jogo – Vou me comportar.
- GO DUCKS! – Robbie berrou do meu lado e levei um susto, mas a torcida foi no embalo e começou a gritar a mesma coisa.
Prometi me comportar, mas era difícil. Nunca tive vontade de jogar Hóquei, mas eu sem duvida gostava de assistir às partidas. Tudo acontecia muito rápido no rinque, os tacos acertavam o disco com tanta violência e agilidade que se você piscasse, se perdia na partida. Só quem gostava de verdade e prestava atenção ao que acontecia conseguia acompanhar a trajetória do disco pelo gelo.
O 1º tempo terminou 3 x 0 para os Ducks. A torcida atrás de nós estava enlouquecida, gritando provocações para a torcida adversária o tempo inteiro. Vez ou outra me peguei acompanhando as músicas, mas tentava não me empolgar demais, e estava muito divertido ver Robbie tão empolgado com alguma coisa que não fosse teatro. Sabia que sua motivação era Alec Karpov, não o jogo em si, mas não deixava de ser ótimo. Ele rapidamente virou o animador oficial da torcida dos Ducks e puxava todos os gritos e musicas durante o jogo.
- Vamos lá, Lukas, reação! – falei baixo, mas Leo ouviu.
- Ele está meio apagado hoje, deve estar pensando na briga de vocês.
- Não faça com que eu me sinta culpada pela derrota deles, por favor.
- Estava falando só do Lukas – Leo me olhou com uma cara debochada – Ou você anda envolvida com o time todo e não estou sabendo?
Olhei para ela com cara de quem não tinha achado graça e ela riu, indo se juntar a Robbie na bagunça com a torcida. O 2º tempo começou e a situação melhorou um pouco para os Rangers. Em dez minutos eles conseguiram marcar três gols, mas os Ducks marcaram mais três vezes e aumentaram a vantagem para quatro gols, tendo o último sido marcado por Alec e Robbie foi à loucura do meu lado. Logo depois Ozzy marcou o 7º gol dos Ducks e fez questão de vir comemorar bem na nossa frente.
- Que exibido! – reclamei vendo ele agitar a torcida e meus amigos irem na onda.
- Desamarra o bico, Parv. Ele é um babaca, mas você também não é uma santa – Robbie falou perto do meu ouvido.
- Ele está me provocando!
- Olhe, o Lukas está com o disco! – Leo apontou na direção do rinque e olhei depressa.
- Ai está Lukas Hölzenben, ele vem pelo gelo, se move pela lateral esquerda, agora vai parar o meio – o locutor ia narrando a jogada com a empolgação na voz crescendo - Um giro, um grande movimento pela linha azul. Ele vai marcar! UUUH!
Lukas marcou o gol e a torcida dos Rangers explodiu em comemoração, mas quando ele esticou o braço apontando para Ozzy, ele acelerou na direção dele e acertou o taco em seu pulso. A pancada foi tão violenta que pude sentir a dor do Lukas. Ele caiu no chão segurando a mão coberta pela luva e uma confusão imediatamente se instalou no gelo. Os jogadores dos dois times começaram a brigar entre si e o treinador Maddox precisou invadir o campo e disparar feitiços para apartar as brigas. Ele estava tão furioso que podíamos ouvir o que dizia, aos berros.
- Oscar, você está fora! Goldberg, entre! – ele apontou para o banco de suspensão e Ozzy deslizou até lá com um sorriso no rosto – Está suspenso por dois jogos!
- Valeu à pena – ouvi Ozzy dizer quando sentou no banco, mas para sua sorte, o treinador não ouviu.
- Ei, seu bacaca! – não me contive e fui até lá, batendo no vidro que separava ele da torcida com violência – Isso não foi nada esportivo!
- Ah, olá, Parvati! – ele ainda sorria debochado – Cuidado, os Super Gêmeos podem não gostar de nos ver tão perto um do outro.
- Você pode ter quebrado a mão dele, seu imbecil! – eu ainda gritava enlouquecida.
- Tomara, era essa a intenção – ele disse calmo, o que só me enfureceu mais – Quero ver ele socar alguma coisa agora.
- Ora, seu... – ameacei escalar o vidro para avançar nele, mas quando estava colocando o pé no apoio senti as mãos de Robbie envolverem minha cintura e me arrastarem pra longe. Ozzy acenou se despedindo, ainda rindo – Me solta!! Merlin, você é forte!
- Pare de se debater, vai acabar acertando um tapa no meu rosto e não quero ficar com olho roxo! – Robbie gritou para abafar meus berros e parei de gritar – Está melhor assim.
- Pode me soltar? – pedi educadamente, mas ele não me largou.
- Não acredito na sua calma repentina.
- Está louca? – Leo nos alcançou no alto das escadas – Ia mesmo escalar aquele vidro? Você tem idéia do quão patética foi essa cena?
- Vamos embora, por favor – pedi ainda calma, respirando fundo – Não quero mais ver o jogo.
- É, vamos embora – Robbie concordou, ainda me segurando pela cintura – Os Ducks vão mesmo massacrar os Rangers, amanhã descobrimos de quanto foi a surra.
Leo riu da provocação dele, mas achei melhor não responder e só caminhar ao lado deles até a enfermaria, para onde Lukas havia sido levado. Ele podia não gostar das minhas brigas com Ozzy e essa ser uma briga dele, mas aquilo havia sido golpe baixo e eu não ia deixar barato. Se era uma guerra que ele queria, então a pior de todas havia acabado de começar.