Tuesday, September 25, 2007

Todos os dias depois das aulas, nas poucas horas livres que tinha, ocupava meu tempo com os treinos para as olimpíadas. A arena montada pelo diretor para que pudéssemos praticar estava sempre cheia, todos os alunos pareciam aderir à idéia de usá-la depois das aulas. A única diferença hoje ficou por conta de Micah, que resolveu tirar o fim do dia para me atormentar e impedir que treinasse qualquer coisa.

‘Sem chance, você não vai acertar dessa distancia toda’

‘Fica quieto, está tirando minha concentração’ Falei sem tirar o olho do alvo

‘Mas está muito longe’ Micah insistiu, prendendo o riso.

Respirei fundo ignorando as análises dele e atirei. A flecha passou longe do alvo. Micah riu.

‘Eu avisei’

‘Você não tem mais nada pra fazer?’ Respondi irritada. Era a 3ª flecha que ele me fazia errar ‘Não deveria estar treinando para a corrida?’

‘Já corri’ Falou com um sorriso que se assimilava ao do Grinch ‘E também já treinei todas as categorias do declato, natação, canoagem e remo. Só não cheguei perto dos cavalos. Estou à toa’

‘Acho que eles estão sentindo sua falta, por que não vai lá fazer uma visita?’

‘Não estou com animo para cavalos hoje’ Ele deitou na grama e apoiou a cabeça nas mãos ‘E não adianta treinar sozinho, é esporte em equipe, esqueceu? E você faz parte da equipe’

‘Também não estou com vontade de andar a cavalo hoje’ Respondi guardando os instrumentos no armário e deixando as chaves com ele ‘Já estou atrasada, tenho hora marcada com a professora Mira, me inscrevi para o jornal’

‘Você não acha que já tem matérias extras suficientes para, tipo, a vida inteira?’

‘Créditos nunca são demais. Estou indo, procure outra pessoa para desconcentrar’

‘Ah, mas só tem graça quando é você que eu irrito!’ falou em tom de deboche ainda deitado na grama

Deixei-o rindo na arena e voltei para o castelo. Havia marcado de conversar com a professora de Literatura para fazer parte do jornal da escola, mas não sabia ao certo o que faria nele. E também tinha prometido ao meu avô que passaria em seu escritório para conversarmos um pouco. Tinha o costume de fazer isso, mas desde que as aulas haviam recomeçado ainda não tinha encontrado tempo para os velhos hábitos.

Já passava das 21h quando cheguei à sala dela, no 6º andar. Meu avô estava sentado conversando animado com a professora e interromperam o assunto quando entrei. Ele levantou fechando uma pasta que consegui identificar estar cheia de fotos e caminhou na minha direção.

‘Bom, vou deixá-las conversar, já tomei muito o seu tempo, Mira’ vovô passou por mim sorrindo ‘Não se esqueça de passar em meu escritório quando sair, Evangeline’

‘Ai vovô, por favor, não me chama de Evangeline!’ Falei um pouco alto demais e ele se assustou ‘Parece que está falando com a vovó! Me chame de Evie, como todo mundo!’

‘Ok então, passe no meu escritório depois, Evie. Tenho algo a lhe mostrar. Está melhor assim?’ Disse revirando os olhos, impaciente

‘Sim, muito. Até mais’ Sorri satisfeita e ele fechou a porta

A professora me indicou a cadeira vazia rindo e sentei. Em cima da mesa tinha vários artigos que os alunos que já faziam parte do jornal tinham escrito, muitas fotos e algumas fichas de inscrições para as vagas abertas esse ano. A minha estava por cima de todas.

‘Então decidiu se juntar à nossa redação esse ano, Srtª. Parvanov?’

‘Sim, gostaria de participar, mas não sei bem o que posso fazer. Não sei se consigo escrever os artigos que saem no jornal’

‘Temos vagas para todos os alunos, independente do que eles sabem fazer’ Ela fechou minha ficha e sorriu ‘Mas você sempre apresenta excelentes trabalhos em minhas aulas, escreve muito bem. Tenho certeza que se encaixará perfeitamente bem na posição de redatora. E você pode escrever sobre o que quiser. Dificilmente a editora-chefe determina o tema para cada redator’

‘Não é você a editora-chefe?’

‘Não, eu apenas ajudo os alunos, estou sempre presente nas reuniões, mas elejo um editor-chefe todo ano para comandar o Durmstrang Weekly News. Esse ano nossa editora é Georgia Yelchin’

‘Ah maravilha’ Falei com um sorriso amarelo, para ela não perceber meu desanimo repentino

‘Georgia é uma excelente editora, está empenhada no cargo, você vai gostar de trabalhar com a nossa equipe. Pode começar amanhã, as matérias já foram divididas, mas pode ficar observando e ver como funciona nossa redação’

‘Obrigada professora, amanhã estarei aqui’

Sai da sala ainda sorrindo, mas quando fechei a porta, desfiz a cara de felicidade. Georgia Yelchin era a editora do Durmstrang Weekly News? Eu seria sua subordinada? Aquilo só podia ser um pesadelo! Mas não poderia desistir agora, que explicação daria à professora? O jeito seria encarar, seria meu mais novo desafio na escola, sobreviver às ordens da Georgia sem assassiná-la.

Não tinha nem mais ânimo de passar no escritório do meu avô, mas tinha prometido e não seria louca de deixá-lo esperando a noite inteira e não aparecer. Então não tinha alternativa senão ir até lá. Ao menos poderia reclamar um pouco sobre a novidade.

‘Entre, entre’ Ouvi sua voz animada quando abri a porta devagar ‘Pensei que demoraria mais com a Mira’

‘Não, foi rápido, ela só queria dizer que tinha conseguido a vaga de redatora’
‘Ah, mas que maravilha! Tenho certeza que vai se sair muito bem! Serão os artigos mais bem escritos do jornal!’

‘Obrigada vovô, mas não tão boa assim, será minha primeira experiência com isso, vamos ver como me saio’ Sentei em frente a ele fazendo uma careta ‘E Georgia Yelchin é a editora do jornal, ela vai fazer da minha vida um inferno’

‘Vocês ainda estão brigando?’ Disse com um tom de voz meio reprovador, mas não tanto assim

‘Sempre brigamos, desde que nos conhecemos’ Cruzei os braços irritada e ele riu ‘Ela me persegue, não me deixa em paz!’

‘Essas competições entre alunos pela melhor nota são saudáveis, contanto que episódios como as eleições não se repitam. Vá para a redação do jornal e faça sua parte sem dar importância ao que Georgia diz’

‘É, vou fazer isso. O que queria me mostrar, vovô?’

‘Já que você mencionou’ Ele abriu uma de suas gavetas e puxou um envelope com muitos selos espalhados. Reconheci como sendo uma das cartas que Mario costuma mandar, ele se recusava a usar o correio bruxo alegando que o trouxa é mais divertido. Sempre coloca milhares de selos para ver a reação dos carteiros ‘Seu primo tem novidades’

Vovô estendeu a mão para que eu pegasse o envelope e abri curiosa. Novidades do Mario eram sempre divertidas. Tinha algumas fotos dele com um uniforme azul e vermelho todo sujo de lama. Olhei para o vovô sem entender nada e ele riu.

‘Mario entrou para a seleção espanhola juvenil de trancabola? É isso?’

‘Sim, não é incrível?’ Vovô estava realmente empolgado ‘Meu neto vai competir nos torneios pelo mundo todo!’

‘É bem a cara dele, jogar essa coisa bruta’ Revirei os olhos rindo ‘Mas e o Diego? Não estou vendo nenhum gêmeo nas fotos’

‘Diego não se inscreveu, sabe como eles são diferentes em alguns aspectos’ Vovô guardou as fotos e a carta na gaveta ‘Mas eles todos vêm para as olimpíadas, e poderá perguntar a ele pessoalmente’

‘Todos mesmo? Até a Helena?’

‘Sim, Helena se inscreveu para xadrez de bruxo, tambem vem’

‘Durmstrang vai ficar pequena para tantos Stanislav... Não sabia que tinha time de trancabola na escola da Espanha, normalmente não é só quadribol?’

‘O novo programa de esportes mágicos começou a funcionar lá ano passado, e como está correndo tudo tão bem nas escolas da Espanha e dos Estados Unidos, Durmstrang também começara a trabalhar com ele’

‘Como assim? Não teremos mais só quadribol?’ Comecei a me animar

‘Não. Depois das olimpíadas um professor novo que ainda não foi contratado passará a dar aulas de outros esportes, e Durmstrang terá o primeiro time de trancabola para disputar as competições bruxas juvenis!’

‘Estou gostando do pai da Annia na direção da escola... Tem tanta coisa acontecendo, nunca tivemos nada disso!’

‘Igor está fazendo um excelente trabalho. E ainda há muito mais por vir, vocês verão’

‘O que mais vai acontecer?’ Perguntei curiosa ‘Não são só as olimpíadas?’

‘Já falei demais, nossa conversa termina aqui!’ Disse rindo

‘Mas vovô, não é justo! Começou a falar, agora tem que terminar!’

‘Não senhora, pode ir, já está tarde’ Ele levantou da mesa e praticamente me empurrou para a porta ‘Amanhã tem aula cedo, não pode se atrasar’

Ainda tentei argumentar, mas ele não disse mais nada e fechou a porta antes que eu tentasse impedir. Fiquei parada no mesmo lugar pensando se entrava outra vez ou não, mas acabei desistindo e voltando para a república. Vovô não ia mesmo contar mais nada, e precisava dormir bem para acordar disposta. Amanhã seria o primeiro dia do meu inferno astral...