Ela abriu os olhos, absolutamente contrariada. Bateu a mão no despertador o fazendo silenciar, e se esticou na cama. A noite havia sido terrível, interminável. Passara grande parte dela na emergência do hospital tentando em vão recobrar um lapso de consciência, de um homem que aparentemente havia sido torturado até a insanidade.
Levantou, prendendo o cabelo de qualquer maneira e colocando os óculos. Estava tudo tão silencioso, triste. Ela sabia o que era, e só pensar naquilo a fazia querer chorar, mas ela havia prometido para si mesma que iria agüentar, passar por cima. Seguiu o mesmo protocolo de todas as manhãs: tomou banho, vestiu roupas completamente brancas, tomou 3 comprimidos de vitaminas e antes que pudesse ir para a cozinha fazer uma xícara de café, a campainha tocou.
Ela sentiu o coração parar um segundo, e apertou a varinha na mão.
- Quem é?
- Vai abrir logo essa porta ou vou ter que ficar plantado aqui até o leite talhar???
Ela sorriu quando com alívio reconheceu de quem era a voz, e o tom brincalhão de sempre. Destrancou a porta, sentindo que enfim seu dia podia estar começando melhor...
- Pensei que você trabalhava!
- Trabalho, mas tirei o dia de folga e pensei que talvez seria uma boa idéia trazer o café da manhã... Não cheguei atrasado, não é?
- Bem a tempo! – ela sorriu realmente feliz de que ele estivesse ali com ela.
Passaram algumas horas conversando bobagens, mas não importava o assunto, era sempre muito divertido. Ela sentiu um pouco da dor dos últimos dias indo embora, e sabia que havia sido essa a intenção dele ao aparecer naquela manhã: dividir o peso que ela estava carregando. Quando pela primeira vez o assunto que eles conversavam cessou, novamente seus pensamentos deram espaço para a solidão, e ele percebeu aquilo.
- Como você está?
- Como você acha? Estou levando, mas não sei até quando...
- Foram muitos erros, você sabe. Alguns, sem volta, sem perdão. De ambas as partes.
- Eu sei, mas machucou. Não dá pra esquecer anos em alguns dias, eu preciso de um tempo...
Eles caíram em um profundo silêncio novamente, e ele a encarou firme, convicto. Ela penetrou aqueles olhos, sentindo os seus próprios, cheios de lágrimas. Sabia que naquele momento ele podia ver tudo o que ela estava pensando ou sentindo, e isso a deixava confusa... Não sabia se era desconfortável, ou se era um alívio! Carregou o olhar dele mais alguns minutos, até uma lágrima pesada escorrer, abaixando imediatamente a cabeça. Ele se levantou e foi até ela, se agachando ao seu lado e segurando seu rosto, puxando-a para um abraço forte.
- Vai passar... Você não está sozinha, pode contar comigo sempre, sempre...
Sem mais conseguir controlar todas as outras lágrimas presas, deixou-se envolver por aquele abraço e chorou tudo que havia para chorar, não se importando mais com o orgulho ou princípios femininos...