Sunday, April 20, 2008

- Não sei se vocês estão se lembrando, mas caso não, faço questão de refrescar: neste castelo ainda não permitem namoros. Pelo menos não assim... tão... à vista. Disfarcem um pouco. – Ricard disse com uma careta de insatisfação quando Victor me abraçou no meio do corredor, mas logo sorrimos.
- Você diz isso por que nunca namorou. Quando namorar, vai entender. – Victor falou sorrindo e eu concordei com a cabeça. Ele levantou a sobrancelha.
- Muito obrigado por me lembrar do meu próprio ‘status’ de encalhado, Victor. Grande amigo que você é.
- Disponha.
- Desfaça essa sua cara feia, Ricard. Eu e Victor só estávamos nos abraçando, nada demais. Mas eu acho que é melhor irmos andando, ou vamos chegar atrasados para o Clube de Poções Avançadas. – consultei o relógio. Faltavam apenas dez minutos.
- Não sei como vocês se divertem tanto nesses clubes todos...
- Não nos divertimos. Nos garantimos, é diferente. Não jogamos trancabola como você, então temos que conseguir pontos extras em clubes. – Ricard respondeu avaliativo e eu concordei. Victor sacudiu os ombros. – Vamos andando. Nos vemos no Clube de Duelos. – Ricard saiu me puxando e acenamos para Victor.
- Vocês dois... – ele exclamou baixo, mais como um pensamento alto. Sorri.

°°°

- Então... Você e a Lavínia voltaram o namoro? – Naveen Odebrecht falou em tom de sarcasmo nas costas de Victor, que virou-se para encará-lo.
- Voltamos sim. Nos gostamos muito. Felizmente para nós dois e infelizmente para você, imagino. – Victor disse sorrindo e Naveen também riu, ironicamente.
- Imaginou errado. Fico muito feliz por vocês. Se combinam. A hipocondríaca e o problemático. Lindo casal. Além do mais, Lavínia e eu já aproveitamos muito o nosso curto tempo juntos. Devo dizer que ela sabe o que faz... Quem sabe daqui uns dias, quando vocês brigarem de novo e você quiser ‘causar’ demais, ela não venha correndo para desabafar comigo, não é? Já que somos bons amigos... Muito bons amigos. – ele sorriu ainda mais aberto.

Victor, que já estava tremendo, não percebeu quando puxou a varinha das vestes e lançou em Naveen a primeira maldição que lhe veio à cabeça. O garoto rodopiou no ar e caiu alguns metros adiante, mas se recuperou rapidamente e revidou, lançando um jato azul em Victor. Imediatamente, todos os outros alunos do Clube de Duelos abriram um círculo ao redor dos dois, se distanciando, e nenhum deles parecia disposto a escutar os gritos do líder, que os mandava parar.

°°°

Quando entrei no Clube de Duelos com Ricard, minhas amigas me encararam assustadas. Um círculo no meio da sala havia se formado e eu logo percebi que alguma coisa de errado estava acontecendo.

- O que é? – perguntei para elas, mas nenhuma me respondeu. Um segundo depois vi Victor levitando a uns dois metros do chão. O nariz saindo sangue. – VICTOR!

Atravessei a barreira de pessoas a tempo de ver Naveen apontando a varinha para o peito de Victor, enquanto o segurava no ar. Sua expressão era de puro ódio e ele parecia avaliar qual seria o melhor momento para jogar Victor dali de cima, completamente paralisado pelo feitiço. Ainda assustada, corri até ele. Quando viu me aproximando, ele cortou o feitiço e ouvi um baque surdo no chão, seguido de uma exclamação de dor. Micah, Ty, Ricard e Iago correram para onde Victor estava esticado no chão.

- O que vocês estavam fazendo? Quase se mataram! – eu gritei nervosa olhando de Naveen para Victor, que fazia esforço para se levantar sozinho e recusava a ajuda dos meninos. Naveen também tinha uns arranhões no rosto, e uns cortes mais profundos nos braços, mas parecia bem disposto.
- Estávamos duelando, é claro. Isso aqui é um Clube de Duelos, afinal. – Naveen falou cínico guardando a varinha na bainha da calça e olhando Victor, vitorioso.
- É um clube de duelos e não um ringue de luta livre! Vou ter que falar com o professor Skoblar sobre o comportamento de vocês. Com certeza vão levar uma suspensão do Clube. – Lev Nikolaievich disse se intrometendo, sério. Naveen deu uma risadinha.
- Me faça esse favor. Acho que já vou decretar suspensão para mim mesmo, desde já. Tenham uma ótima noite.

Ele foi saindo e dei um olhar significativo para Victor, antes de correr atrás dele. Alcancei-o quase na escada.

- Por que fez isso, Naveen? – perguntei de supetão e ele parou de andar para me encarar. Veio andando na minha direção e parou muito próximo.
- Você não sabe?
- Não.
- Ficamos juntos uma noite, você termina comigo sem mais nem por que, e volta correndo para ele? Que estava fazendo de tudo para que você sofresse. Devo ser mesmo muito chato, ou ter feito algo muito errado.
- Você não fez nada de errado, Naveen. Eu gosto de você. Como amigo. Mas eu amo o Victor, e eu sempre deixei isso muito claro, nunca te enganei. E você também gosta da Deborah!
- Tudo bem. Eu já tinha entendido e aceitado tudo isso, não precisava repetir para mim. Diga isso para o seu namorado, por que acho que ele não se garante... Foi ele quem começou. Se eu revidei, foi só para me defender.

Ficamos nos encarando uns segundos e ele falava tão convincente que não consegui responder. Ele sorriu.

- Está tudo bem. – ele disse ainda me olhando. – Somos amigos, ele goste ou não.
- Não preciso da permissão dele pra ser sua amiga. Só não queria que ficassem lutando por aí.
- Não vai mais acontecer, não se preocupe.
- Lavínia... – Victor apareceu nos encarando sério e Naveen fechou a cara.
- A gente se vê, então... – eu disse e ele concordou. Encarou Victor mais uma vez e sumiu na escada.
- O que ele queria com você? – perguntou limpando o nariz, que ainda estava sangrando um pouco. O rosto estava muito machucado. Acompanhou Naveen com o olhar até ele desaparecer completamente e depois se virou para mim.
- Nada demais. – respondi azeda.
- Não quero te ver perto dele, Vina. Ele não presta.
- WOW, começamos a impor limites, é isso? Estamos namorando, Victor. Naveen é meu amigo. Aceite isso. Você também não é amigo daquela... menina?
- É muito diferente.
- Não vejo por que. Pare de agir feito criança. Estou namorando você agora, não precisa travar duelos com todos os meus amigos e ex-namorados. E se eu fosse você, aproveitaria o fato de que foi suspenso do Clube para ir até a enfermaria. Está ficando pálido.

Voltei para a sala e Victor ficou parado no mesmo lugar, mas ainda escutei ele dizer:

- Você ainda vai se impressionar com esse seu amigo. Vai descobrir como ele é, na verdade.

°°°

- Visgo do diabo? – Mikhail analisou os ramos atentamente, parecendo muito interessado. - É uma muda muito jovem ainda, mas com certeza temos espaço para ela na Imperial. Vocês estudaram bastante as mudas maiores no mês passado, sobraram poucas. Vamos lá agora, para plantarmos.

Segui com ele até a Estufa Imperial, segurando o vaso com a muda de visgo do diabo que o pai de Victor havia mandado. Quando chegamos ao patamar subterrâneo, precisei forçar os olhos para enxergar. Era tudo muito escuro e fechado ali embaixo.

- Tome cuidado aqui. Não encoste em nenhuma planta. Todas que estão aqui são perigosas.

Andamos devagar e com cautela pela fileira de plantas e paramos quase no final, onde uma grande acomodação de ramos do visgo do diabo se espalhava pelo chão. Mikhail acendeu a varinha e elas se retraíram, o que possibilitou que ele acomodasse a nova muda ali do lado. Teríamos ido embora logo em seguida, mas quando voltávamos pelo mesmo corredor, agora com a varinha acesa, ele parou de caminhar e se aproximou de uma planta com folhas escuras e viscosas, observando curioso. Olhei atentamente e identifiquei.

- Isso é... Belladona? – perguntei assombrada e ele concordou. Pegou um par de luvas de couro de dragão que estava ali do lado e agarrou um dos ramos. Nitidamente dava para ver que um corte havia sido feito ali, há poucos dias. A seiva ainda escorria fresca.
- Você veio aqui em baixo, Lavínia? – ele perguntou em um tom de voz rouco e sério que me deu medo. Foi agarrando outros ramos diversos, todos mutilados.
- Não, professor. Eu somente uso a parte de cima da Estufa. O senhor mesmo separa as plantas que quer que eu estude com os outros alunos do Clube...
- Só nós dois temos a chave da Estufa, e alguém certamente esteve aqui recentemente podando a Belladona. Você sabe as conseqüências disso, não sabe? – ele perguntou se virando para mim mais sério do que nunca e eu tremi. Concordei.
- Professor, eu posso garantir que nunca estive aqui, e não toquei esta planta.

Ele me encarou alguns segundos, sem desviar os olhos. Sustentei. Estava sendo sincera. Nunca havia estado ali embaixo, e nunca teria coragem de mutilar uma Belladona, sabendo o que ela pode causar. Como nenhum dos dois fraquejou, ele pareceu se convencer, pelo menos momentaneamente de que estava sendo sincera. Virou-se novamente para a planta e analisou os ramos mais uns minutos, depois, tirou as luvas.

- Vou descobrir quem esteve aqui, e é melhor que eu descubra rápido. Quem quer que tenha feito isso, tem um plano com essas folhas, e eu tenho a impressão de que não é boa coisa. Não quero ser envolvido em nada disso. – ele disse alto e sério, uma ruga de preocupação marcando a testa. – Vamos embora.

Segui-o para fora da Estufa. A cabeça girando. Quem poderia ter entrado na Estufa? E por quê?