Monday, April 07, 2008

Uma figura solitária esperou o jardim ficar deserto e o atravessou até as Estufas. Parou na porta da maior, que mais parecia uma grande catedral de vidro, dourada. Encostou-se na porta, olhando mais uma vez para os dois lados, e então puxou uma chave de dentro do bolso, abrindo-a. Entrou sorrateiramente.

‘Lumus’ ordenou para a varinha que segurava diante de si e foi caminhando entre os diversos balcões de plantas raras.

Ao final, parou diante de mais uma porta minúscula, e novamente destrancou-a com a chave. Desceu as escadas e se viu em uma espécie de porão mal cheiroso e escuro. Passou lentamente por entre o único corredor analisando. Encontrou o que procurava quase no final e não pode deixar de sorrir. Vestiu grossas luvas de couro de dragão e com um canivete, cortou um grande ramo da planta, desfolhando-a cuidadosamente e alojando as folhas em um saco plástico.

Repetiu o processo com mais dois ou três ramos, e quando conseguiu toda a quantidade que queria, fez o caminho de volta, sem deixar rastros.
Sentiu o gosto da vitória na boca enquanto caminhava para o vilarejo ao lado do castelo. Só faltava um detalhe para que seu plano fosse perfeito...


- Ah, acordou. Estávamos preocupadas. Nina e eu, já planejávamos colocar um espelho embaixo do seu nariz para ver se ainda estava respirando. – a voz de Annia falou irônica da porta do quarto. Continuei revirando meu malão.
- Como está Micah?
- Relativamente bem. Alguns arranhões e cortes, roxos e inchaços, mas ele sobreviveu, o que é mais importante.
- É... – respondi ainda jogando objetos para fora.
- O que você está fazendo Vina? – Nina perguntou, se deitando em sua cama e observando a bagunça ao meu redor. Encarei-as desesperada.
- Estou procurando a chave da estufa Imperial!
- Que chave? Ah... – Nina arregalou os olhos. – A cópia da chave que o professor Mikhail te deu?!

Quando concordei com a cabeça, ela soltou uma exclamação e Annia apertou os olhos com as mãos.

- Quando eu penso que os problemas finalmente se acabaram! – ela disse mais como um pensamento alto do que como qualquer outra coisa. – Você não usava isso ao redor do seu pescoço? Aquela corrente não tem fecho. Ou você tirou, ou ela caiu. Só essas duas alternativas.
- Obrigada. Me sinto muito melhor agora. – respondi azeda e ela cerrou os olhos para mim. – Eu não tirei essa corrente. E ela pode ter caído em qualquer lugar. Só se...

Um flash veio à minha cabeça e me fez voltar ao momento em que estávamos no camarim das dançarinas, trocando de roupa, completamente bêbadas.

- Ela pode ter caído na boate, quando trocamos de roupa para dançar! – quase gritei. Annia concordou com a cabeça enfaticamente e Nina fez uma careta horrível.
- Ficaria muito grata se vocês apagassem esse momento das nossas vidas. – disse. Eu e Annia nos entreolhamos e rimos.
- Não sei do que você está reclamando, Nina. Você nem dançou! Saiu correndo.
- Certo, mas a humilhação de ter subido no palco vestida de bombeiro já é o suficiente para minha honra se sentir muito lesada.

Rindo, me levantei e vesti uma capa. As duas me observaram com curiosidade.

- Aonde você vai hora dessas?
- Até a boate, claro. Tenho que recuperar essa chave o mais rápido possível.
- Você está maluca?! É domingo, bem de noite! A boate não está aberta hora dessas!
- Certo, mas ainda é final de semana. Se eu não for hoje, só sexta-feira! – eu completei e elas se olharam já sem argumentos. – Volto logo.

Bati a porta e desci correndo as escadas. Evie estava entrando na República com a expressão carregada e abatida, mas antes que ela pudesse dizer qualquer coisa, passei correndo por ela, que parou para me observar.

- Annia e Nina te explicam.

Ela sacudiu os ombros e eu dei as costas saindo para os jardins, desertos àquela hora. Parei derrapando na porta da Osíris e entrei na República fazendo um pouco mais de barulho do que o necessário.

Ricard estava sentado na mesa da cozinha, lendo um livro. Se assustou a me ver.

- O que foi que aconteceu dessa vez?
- Preciso que vá comigo até a boate do vilarejo. Tenho certeza que a chave caiu lá.
- Você perdeu o juízo? Temos só mais 30 minutos para ficarmos fora do castelo. E não é hora de irmos até a boate... Ela não está aberta hoje.
- Se você parasse de falar e agisse, já estaríamos voltando. – Eu disse com raiva e ele nem se mexeu.
- Acho que a bebida alterou seus neurônios.
- Não vem comigo? Ótimo. Vou sozinha. – Estava quase alcançando a porta quando...
- Lavínia. Espera. Eu vou com você. Não adianta eu falar que provavelmente vamos levar uma detenção?
- Já disse que vou sozinha.
- Pois agora eu estou dizendo que vou com você e ponto final.

Um minuto depois estávamos atravessando o portão. Victor estava chegando, abraçado à mesma menina. Pareceu não ter nos notado uns segundos, mas quando eu me esbarrei propositalmente em seu braço, ele olhou.

- Desculpa, não te vi. – Pedi controlando minhas palavras e sentindo um calor subir e descer sem parar no meu corpo.
- Tudo bem. Também não tinha visto vocês... Ricard, os portões já vão se fechar. – ele avisou e a menina concordou com a cabeça apertando o abraço. Tremi. Ricard agarrou meu braço para continuarmos caminhando.
- Eu sei. Até mais.

Andamos depressa e em silêncio mais alguns segundos até eu explodir em indignações. Ricard escutou calado.

- “Também não tinha visto vocês...” – imitei a voz de Victor, debochando. – Não tinha visto uma @#$%!!! Desde quando ele tem problemas de visão?! E aquelas risadinhas da menina... “hihihi”... BLERGH! Um belo casal. Dois idiotas. Se merecem mesmo.
- Nossa. Hoje a sua espicondilite lateral está em alta. – Ricard comentou rindo abertamente.
- A minha o que? Ite é inflamação. É grave? Como você descobriu que eu tenho isso?
- Respira. Não é nada grave. Espicondilite lateral é popularmente conhecida como “dor de cotovelo”. – ele gargalhou e eu fechei a cara. Não disse mais nada até chegarmos em frente à boate.

Como havíamos previsto, estava fechada. Mas tinha luzes acesas e batemos na porta. Barulhos de passos se aproximando, e alguns segundos depois, uma fresta se abriu. Nicolau nos olhava surpreso.

- Desculpem, meninos. Não está funcionando hoje, e...
- Não viemos aqui para festa. Estou procurando uma coisa que me pertence e que tenho quase certeza de ter deixado cair aqui.

Nicolau nos observou mais uns segundos e então abriu a porta para nos deixar entrar. Estava muito diferente do que estava na festa. As mesas estavam empilhadas, assim como as cadeiras. O bar vazio. E nem as gaiolas estavam ali.

- O que é que você está procurando?
- Uma chave. Pequena, dourada. Estava em um cordão fino e dourado também. Grande o suficiente para passar pela minha cabeça, e...

Parei de falar pois uns segundos depois Nicolau puxou um cordão de dentro do bolso, analisando.

- Seria esta?
- É esta mesmo!!! Ah, não acredito! Pelas barbas de Merlin, se tivesse perdido essa chave... – disse aliviada enquanto colocava-a de volta ao redor do meu pescoço. – Obrigada.
- Não agradeça a mim. Você não a perdeu aqui dentro. Deveria estar no chão aqui na porta, ou na rua. Há apenas um par de horas atrás, alguém a colocou dentro de um envelope e jogou-o por debaixo da porta. Deixou um bilhete. – Ele puxou um papel rabiscado com pressa: “encontrei essa chave no chão aqui perto. Alguém deve ter perdido aí.”

Ele me entregou o bilhete, mas não reconheci a caligrafia. Agradecendo mentalmente a essa pessoa, eu e Ricard voltamos correndo para Durmstrang, eu me sentindo alguns quilos mais leve. Passamos um segundo antes dos portões serem fechados e paramos para respirar. Rimos.


- Então... conseguiu? – Milla que também havia chegado, perguntou assim que entrei no quarto, ainda suada. Todas elas me olhavam preocupadas.

Puxei o cordão e mostrei a elas, sorrindo e me sentando na cama.

- Essa foi por pouco, Vina. – Nina comentou e eu concordei.
- Será que alguém pode me contar o que exatamente aconteceu com Micah? Desde a hora que acordei (e não faz tanto tempo assim), só fiquei por conta dessa chave.

Evie engoliu em seco, exausta, e começou a contar. O dia havia sido difícil para todos nós...