Wednesday, October 10, 2007

A aula do clube de duelos havia chegado ao fim e saí exausto da sala, mas não pensava em voltar para a república e dormir. Amanhã era dia de entregar matéria escrita para fazermos a edição de sábado do jornal e ainda precisava coletar alguns dados para finalizar a minha. Separei-me do pessoal no corredor e entrei na redação do jornal. Ela estaria vazia, se não fosse por uma única pessoa de costas revirando alguns papéis espalhados em cima de sua mesa. Caminhei o mais silenciosamente que pude e parei atrás de Evi, quase encostando a boca no ouvido dela.

‘O que está fazendo?’ Falei de repente e ela saltou e gritou, me batendo com uma pasta que tinha nas mãos

‘Merlin, não faça mais isso, quer me matar??’ Disse colocando a mão no peito e respirando devagar ‘Meu coração quase saiu pela boca!’

‘Nossa, não sabia que minha voz era tão sexy assim’ Disse debochado e ela revirou os olhos. Ri e me sentei na mesa ‘Então, o que está fazendo aqui sozinha? Não vi você na aula de duelos’

‘Ah não deu tempo de ir clube hoje, preciso terminar minha matéria’ Disse com a voz um pouco alterada de quem estava sobrecarregada ‘E preciso colher informações sobre a droga do musical que vamos fazer testes em dezembro!’

‘Você precisa desistir de algumas matérias ou clubes, não está conseguindo dar conta de tudo’

‘Eu nunca desisto das coisas que começo’ Disse voltando a revirar os papéis ‘E estou dando conta de tudo sim, só preciso de um tempo para me organizar!’

‘OK, calma, respira’ Ela me olhou atravessado e me esforcei para não rir ‘Pra que musical você vai fazer teste?

‘Ai o professor inventou essa agora, ninguém merece!’ Ela atirou alguns papéis na pasta sem paciência e sentou parecendo cansada ‘É um tal de Footloose, um filme trouxa’

‘Footloose?’ Perguntei já às gargalhadas ‘Jura?’ Ela confirmou com a cabeça espantada com a minha reação, mas continuei rindo ‘Esse filme é muito legal, eu adoro e já assisti várias vezes, mas ver vocês encenando ele vai ser particularmente engraçado!’

‘E posso saber qual é a graça toda?’ Disse zangada e tentei diminuir as risadas, mas estava difícil

‘Você até acho que não, mas o garoto que for escalado pro papel de Ren MacCormick vai ter que ser um pé de valsa!’

‘Bom, aí é azar o dele. Só preciso assistir esse filme, quero saber como é essa Ariel’

‘Relaxa, você ta muito nervosa. Brigue com a Georgia amanhã, vai ficar mais calma’

‘Até que não seria ruim’ Disse levantando outra vez ‘Mas agora vou voltar ao que estava fazendo ou não termino isso hoje’

‘E eu vou começar o que vim fazer’ Falei descendo da mesa ‘Sabe onde ficam guardados os exemplares antigos do jornal?’

Evi apontou para um armário gigantesco cheio de pastas no fundo da sala e respirei fundo antes de começar a encarar o que estava na minha frente. Precisava entender como era o padrão do jornal da escola, que nem sempre se chamou Expresso Polar, para concluir minha matéria da semana. Comecei por uma pasta no fundo dele e era um exemplar de 1973. A matéria da capa era de um tal de Kegan O’Shea, que também era o editor do jornal. Devia ser parente do Larry.

Olhei mais algumas edições daquela época e notei que em todas elas tinha uma palavra-cruzada. Nas edições atuais também tinham esse jogo, mas não vinha o nome de quem a editou. Revirei o armário atrás de edições mais antigas e encontrei a 1ª, de 1950. Essa não tinha o joguinho, assim como as edições que se seguiam até 1955. Desse ano em diante, todas as edições continham o jogo de palavras-cruzadas. O jornal sequer tinha uma área destinada a jogos, então por que tinha só esse, solto no meio de uma das páginas? Vinha sempre na última página, seguido da frase “Aos aptos, bom divertimento”.

‘Ei Evi’ Virei para trás e notei que ela ainda estava no mesmo lugar depois de mais de meia hora ‘Quem coloca esse jogo de palavras-cruzadas que vem em todas as edições do jornal?’

‘Não sei, por quê?’ Ela ergueu a cabeça dos papéis com um ar cansado

‘Curiosidade. Elas se repetem em todas as edições desde 1955, sempre com essa mesma frase besta, e desde 1986 não vem dizendo quem as fez’

‘Deve ser uma das várias tradições idiotas de Durmstrang’ Disse bocejando ‘É só um jogo’

‘Já tentou decifrar alguma vez?’

‘Não. Mas sempre vejo meu irmão e Luka concentrados nelas e agora Dimitri também passou a ler isso. Na verdade, muitos garotos parecem gostar de decifrar as palavras dele’

‘Só os garotos? Garotas não tentam?’

‘Já vi algumas, mas desistem logo. Garotos devem ser mais obcecados, eles não desistem enquanto não fecham o jornal com sorrisos triunfantes’

‘Tem alguma coisa errada nisso’ Disse pensativo

‘Não tem nada de errado, é só um jogo’ Ela levantou da mesa guardando vários papéis em uma pasta ‘Você diz que estou sobrecarregada, mas também deve estar, pois está começando a ficar paranóico. Se servir de consolo, Annia sempre lê isso e parece encontrar respostas, pois sempre perde horas nele’

‘Falando em Annia’ Mudei de assunto ‘Por que vocês estavam rindo dela ontem quando eu e Ty passamos perto da Avalon?’

‘Ah isso’ Evi começou a rir descontroladamente ‘É que descobrimos que a Annia nunca beijou um menino!’

‘Não brinca!’ Falei caindo na gargalhada ‘Logo ela, que é toda descolada?’

‘Pois é, as aparências enganam!’ Evi ria mais ainda ‘E descobrimos também que ela está querendo perder essa “virgindade” com o Ty’

‘Evi, você sem querer fez meu dia mais feliz’ Eu rolava no chão rindo de chorar

‘Ai por favor, vê se não vai contar pra ele! Annia me mata se Ty descobre que ela é afim dele!’ Ela ficou séria de repente, e assumiu um ar derrotado quando olhei para ela ainda rindo ‘Você vai contar, não vai? Claro que vai, mas que pergunta idiota’

‘Ty não vai falar pra Annia que foi você que me contou, pode deixar’

‘Se ela me matar, eu volto pra puxar o seu pé!’

‘Vai ser um prazer ter uma assombração tão linda assim visitando meu quarto todas as noites’

‘Ai ai, você me cansa minha beleza, sabia?’

‘Mas é tanta beleza que não desgasta nunca, fica despreocupada’ Pisquei tentando não rir e ela revirou os olhos

‘Bom, já terminei minha matéria e vou embora porque preciso dormir. Vai agora?’

‘Não, não estou nem perto de terminar. Boa noite’

Evie me desejou boa noite também e saiu da redação se arrastando. Olhei para as pastas que ainda me aguardavam e tinha plena consciência de que não sairia dali antes da meia noite, mas ao menos agora tinha uma motivação maior: precisava acabar logo com isso e acordar o Ty para contar a novidade huahuahua